15/01/2013
Causa tributária - Advogado terá de devolver dinheiro a cliente derrotado

14 janeiro 2013

Causa tributária - Advogado terá de devolver dinheiro a cliente derrotado

Por Jomar Martins


A 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul negou Apelação a um advogado da Comarca de Passo Fundo, condenado a devolver R$ 190 mil ao seu ex-cliente. Como, para a Justiça, ficou claro que houve "locupletamento indevido", o juízo de primeiro grau entendeu cabível a repetição do indébito, o que foi confirmado pelo colegiado.

O dinheiro deveria ser empregado em uma triangulação. Serviria, de início, para comprar precatórios com deságio. Em seguida, esses precatórios deveriam ser utilizados para compensar, por seu valor de face, débitos tributários junto à Fazenda do estado Paraná. Os débitos se referiam ao ICMS incidente sobre a importação de equipamentos para diagnósticos médicos. Como o trâmite não ocorreu, o advogado, que seria o responsável por operacionalizar o negócio, foi acusado de omissão, já que o não pagamento causou a elevação do valor da dívida.

A sentença, proferida pelo juiz de Direito em substituição Clóvis Guimarães de Souza, condenou o profissional a pagar, a título de perdas e danos, todos os valores relativos aos encargos de mora incidentes sobre a obrigação principal tributária  multa, juros, correção monetária e honorários do executivo fiscal.

"Esses encargos moratórios poderiam ter sido evitados pelos réus (advogado e escritório), via do singelo depósito judicial da soma pretendida pelo fisco, enquanto discutiam a legalidade e legitimidade do crédito tributário", considerou o juiz.

O relator do recurso no Tribunal de Justiça, desembargador Érgio Roque Menine, concordou com a sentença e reconheceu a desídia do advogado que, segundo ele, além de não comprar os precatórios, abandonou a causa, deixando de esgotar a via recursal e de prestar contas ao seu constituinte. A atitude, disse o relator, violou os artigos 34, incisos XI, XX e XXI; e 37, parágrafo 2º, do Estatuto da Advocacia  a Lei federal 8.906/1994.

O desembargador só reformou a parte da sentença que admitiu a compensação de R$ 22,6 mil, a título de honorários advocatícios, sobre a obrigação de devolver os R$ 190 mil. O acórdão foi lavrado na sessão de julgamento do dia 25 de outubro. Ainda cabe recurso.

Abandono de causa
Segundo os autos, o caso teve início em 2004, quando a empresa Ultra-Ray Centro Diagnóstico, com sede em Toledo (PR), importou dos Estados Unidos dois aparelhos para exames de diagnósticos. Na ocasião, ela foi notificada pela Secretaria da Fazenda do Paraná para proceder ao recolhimento do ICMS dos equipamentos.

Ato contínuo, a empresa diz que procurou o advogado gaúcho Neibal Bier da Silva, sócio do escritório Neibal Bier da Silva Advocacia (NBS Advocacia), que a orientou a não recolher o tributo, sob a alegação de que sua exigência pelo fisco estadual seria inconstitucional. Resultado: a empresa foi multada no montante de R$ 136,5 mil. A defesa em âmbito administrativo, perante a Secretaria da Fazenda, não surtiu efeito. Então, a empresa e o advogado firmaram um contrato de honorários advocatícios para propor Ação Anulatória de Auto-de-Infração.

Como a demanda foi julgada improcedente, o advogado teria sugerido a compra de precatórios para o pagamento da dívida fiscal. O cliente repassou-lhe o montante de R$ 190 mil exclusivamente para esta finalidade. Após receber a última parcela do dinheiro, no valor de R$ 25 mil, segundo registra o acórdão, o advogado deixou de manter contato, fechando a filial na cidade paranaense.

Diante desta situação, a empresa disse em juízo que foi obrigada a desembolsar R$ 21,3 mil a título de honorários advocatícios da Defensoria Pública estadual, além dos R$ 202,9 mil para pagamento do ICMS  valor parcelado em 60 vezes. Como o escritório se negou a devolver os R$ 190 mil, a empresa ajuizou Ação de Restituição por Descumprimento de Obrigação para pedir, também, todos os valores gastos na Ação Anulatória de Auto-de-Infração, estimados em R$ 112,5 mil, já que seu ajuizamento se mostrou indevido.
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COMARCA DE PASSO FUNDO
5ª VARA CÍVEL
Rua General Neto, 486
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Nº de Ordem:
Processo nº:
021/1.08.0017868-2 (CNJ:.0178681-89.2008.8.21.0021)
Natureza:
Ordinária - Outros
Autora:
Ultra-Ray Centro Diagnóstico Ltda.
Réus:
Neibal Bier da Silva e Neibal Bier da Silva Advocacia
Juiz Prolator:
Juiz de Direito - Dr. Clóvis Guimarães de Souza
Data:
04/06/2010
Vistos etc.
I - Ultra-Ray Centro Diagnóstico Ltda. ajuizou ação de restituição, cumulada com perdas e danos, em face de Neibal Bier da Silva e Neibal Bier da Silva Advocacia (NBS Advocacia), alegando, em síntese, que: contratou os serviços do primeiro réu, visando orientação jurídica sobre o pagamento de tributo estadual, incidente sobre equipamentos de origem estrangeira; o réu orientou-a a não efetuar o pagamento, elaborou defesa na esfera administrativa e ingressou com ação anulatória de auto de infração; a ação judicial tramitou na Comarca de Toledo/PR, onde o réu possuía filial.
Ante a improcedência da ação, o demandado orientou-a a pagar o débito tributário com precatórios, oferecendo-se para intermediar a compra dos títulos; entregou R$ 190.000,00, mediante depósitos, para que o réu comprasse os indigitados precatórios; recebida a última parcela do montante, a empresa e o advogado demandados deixaram de manter contato com os representantes da empresa autora, fechando a filial na
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cidade paranaense.
O demandado reteve indevidamente o numerário que lhe havia sido entregue, para a compra de precatórios, os quais serviriam ao pagamento do débito tributário, e a demandante teve de arcar com os ônus da sucumbência, no montante de R$ 21.302,51, além do débito tributário, acrescido de juros, correção monetária e multa, na ordem de R$ 202.971,87; notificou extrajudicialmente o réu, para que devolvesse o numerário que lhe fora entregue, ou entregasse os precatórios adquiridos, mas ele silenciou; as orientações jurídicas recebidas foram todas imprudentes e as ações propostas, temerárias; invocando o art. 884 do CC, requereu a repetição de indébito, cujo montante atualizado em 31-10-2008 atinge R$ 265.753,74; além disto, com fulcro no art. 389 do CC, pugnou pela condenação em perdas e danos, decorrentes do inadimplemento de sua obrigação, correspondentes aos ônus de sucumbência do feito julgado improcedente (honorários e custas), além dos juros e multas, referentes ao auto de infração, o que totaliza a importância de R$ 112.580,75; ao final requereu a procedência dos pedidos, com os consectários de estilo; juntou documentos.
Os suplicados, em contestação, disseram que: os honorários foram ajustados em 5% iniciais, além de 15% sobre o montante projetado, independentemente da procedência ou não da ação; a obrigação do advogado é de meio e não de resultado; prestaram serviços advocatícios para a Ultra-Ray, para a CT Centro de Diagnóstico e ainda para a Clin-Ray Centro de Diagnóstico Ltda.; foram contratados para ajuizar demandas na esfera federal, a fim de obter o reconhecimento da isenção ao recolhimento da COFINS e
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buscar a alteração da base de cálculo de 32% para 8%, referente ao IRPJ e à CSLL; após, surgiram serviços na esfera estadual e na via administrativa; patrocinaram a autora em seis ações judiciais ingressadas perante a Justiça Federal; a reclamante importou equipamentos e, como não recolheu ICMS, foi autuada em 1994, sofrendo execução fiscal, onde atuou, em 1997, o antigo procurador, Dr. Roosevelt Maurício Pereira; os embargos opostos naquela época foram julgados improcedentes; interposto recurso de apelação pelo colega, a autora optou por parcelar o débito.
Efetuado o pagamento das parcelas, a autora procurou a parte ré, com o intuito ingressar com ação anulatória; a autora pretende maldosamente confundir o trabalho desenvolvido para a liquidação dos débitos com a compra de precatórios; pelas duas ações estaduais ajuizadas, cobraram honorários iniciais mais honorários gradativos, que variavam de acordo com a fase processual; todos os valores foram recebidos a título de honorários, e não para a compra de ativos; inexiste ilicitude na sua conduta; impugnou os valores pleiteados; ao final, pugnou pela improcedência da ação e, subsidiariamente, pelo direito de retenção de valores; juntou documentos (fls. 120/133).
Réplica às fls. 457/463.
Instadas as partes a declinar as provas que pretendiam produzir, os réus pugnaram pelo julgamento antecipado, enquanto a demandante requereu a realização de prova oral, deferida (fls. 466/470).
Na audiência de instrução, foi ouvida uma testemunha por precatória (fls. 494 e 498).
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A autora desistiu do depoimento pessoal do primeiro réu (fl. 501).
Declarada encerrada a instrução, as partes apresentaram memoriais, reafirmando os argumentos explanados (fls. 502 e 504/513).
II- Trata-se de ação de repetição de indébito, cumulada com indenização, consubstanciada no argumento de que os réus, seus mandatários, teriam se apropriado indevidamente de valores que lhe foram alcançados, para a compra de precatórios, prejudicando a sua intenção de liquidar o débito tributário.
O recebimento dos R$ 190.000,00, pelos demandados, além de estar comprovado documentalmente, é tema confesso (art. 302, caput, e art. 334, II, do CPC).
Oportuno frisar que, embora existissem vários contratos de prestação de serviços advocatícios entre os contendores, inclusive com outras empresas do grupo econômico a que pertence a autora, aqui se discute apenas dita ação anulatória de ICMS e compra de precatórios, para pagamento, ou compensação com esses créditos de ICMS (fls. 42/44 e 138/155).
Conforme guia para liberação de mercadoria estrangeira e auto de infração acostados aos autos, a autora adquiriu, no ano de 2004, dois equipamentos para diagnóstico por imagem, ou seja, dois ecógrafos com análise espetral doppler (modelos voluson 730 expert e logiq 9), sem proceder o recolhimento do ICMS, no montante de R$ 136.545,46, acrescido de juros e multa até 21-12-2004 (fls. 26, 30/31 e 35), por orientação dos demandados.
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Assim, em 10-10-2005, foi firmado contrato, para o ajuizamento de ação anulatória do auto de infração nº 6418375-3, com pedido declaratório de inexigência de obrigação tributária, bem como de eventual procedimento mandamental (fls. 38/44 e 153/155).
Quanto ao referido contrato, ficou convencionado o pagamento de honorários da seguinte forma: a) inicialmente, uma importância equivalente a 5% sobre R$ 151.000,00; b) no caso de não haver recurso à segunda instância, mais o equivalente a 15%; c) no caso de interposição de recurso de apelação ou contrarrazões, mais 5%; d) no caso de atuação em terceira instância, mais 5%. Todos estes percentuais foram convencionados sobre o valor atualizado da ação, acrescido de juros de 12% a/a (fls. 42 e 153).
A ação anulatória foi proposta (autos nº 684/05) e restou improcedente, sem interposição de recurso (fls. 156/169 e 342/370 433/439). Nesse passo, o argumento dos demandados, de que não recorreram, porque notificados pelo documento de fl. 97, missiva essa recebida em 22-10-2007, não prospera, haja vista que dito ato extrajudicial era apenas para prestação de contas, do numerário destinado aos precatórios, não revogação de mandato, ou renúncia ao prazo recursal. Evidente, pois, a malícia dessa ponderação dos demandados e sua negligência, no exercício desse mandato.
A tese dos réus, de que os R$ 90.000,00, pagos via de três cheques de R$ 30.000,00 cada, destinavam-se aos seus honorários, igualmente não vinga, pelo próprio teor claro e preciso do recibo da fl. 45
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compra de créditos cujo devedor seja o Estado do Paraná, cuja finalidade será de efetuar a compensação/pagamento do débito....
Desse outro pacto, de compra de precatórios, ainda que não objeto de avença escrita, os réus pretendiam receber 10% sobre o débito, para efetuar a compensação, ou 2,5%, para apenas intermediar o negócio da aquisição do precatório, segundo o e.mail de fl. 88, datado de 18-12-2006.
Houve, pois, o pagamento de mais quatro cheques, de R$ 25.000,00 cada, totalizando mais R$ 100.000,00, para adoção de medida administrativa ou judicial que visem a por fim ao débito oriundo da penalidade 11580/1996, comprovados pelos recibos datados de 25-11-2006, 25-12-2006, 25-01-2007 e 25-02-2007 (fls. 51, 56, 61 e 66). Portanto, nem esses valores destinaram-se a pagamento de honorárias, como pretendido pelos réus.
Como esses pagamentos aconteceram antes e depois do e.mail retro, em que os réus declinavam sua estimativa de honorários, presumiram-se aceitos pela autora, ante a continuidade desses depósitos, sem qualquer contraproposta, ou divergência expressa.
Desta forma, pelo primeiro pacto, de ajuizamento da ação anulatória, nos termos avençados e segundo confesso pelos réus (fls. 131 e 133), estes teriam recebido 5% sobre o valor do contrato, ou seja, R$ 7.550,00 (5% de R$ 151.000,00  fl. 42, cláusula 2ª; art. 302, caput, e art. 334, II, do CPC), restando-lhes receber os R$ 22.650,00 (15% dos R$ 151.000,00).
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A autora não se desincumbiu da prova do pagamento desse saldo, de encargo seu (arts. 319 e 320 do CC; art. 333, I, do CPC). Reputo, pois, devida essa diferença retro.
No que respeita à outra avença, de compra de precatórios, pela versão dos contendores e contexto probatório, não chegou a se efetivar, em nenhuma das modalidades declinadas pelos réus, de compra e compensação de créditos, ou de intermediação dessa compra. Logo, são indevidos honorários advocatícios por essa segunda avença.
A testemunha Honorino Cappellesso, em consonância com a prova documental, afirmou que a empresa autora é cliente do seu escritório de contabilidade e se recorda de que quando fez a contabilidade da empresa haviam alguns cheques expedidos pela empresa de valores altos e que não constava o beneficiário. E seguiu afirmando que em contato com a empresa autora, foi informado pela funcionária Solange que tais cheques eram nominais a empresa NBS Advocacia e que tais valores seriam para compra de precatórios para fins de liquidação de dívidas de ICMS. Confirmou o destino que deveria o réu ter dado ao numerário recebido, afirmando que tais cheques foram contabilizados como adiantamento para compra de precatórios da empresa NBS Advocacia (fl. 498).
Aliás, o próprio réu inculpou-se, juntando a estes autos a decisão proferida pelo relator do processo disciplinar, contra ele movido, em razão deste mesmo fato. Da análise do documento, verifica-se a aplicação de pena de suspensão por seis meses, vigorando esta enquanto não efetuada a prestação de contas, nos termos do art. 37, § 2º, do Estatuto da Advocacia (fls.
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514/517).
Ora, convergindo os elementos dos autos à prática de locupletamento indevido, mesmo que parcial, cabível a repetição dos valores pagos ao réu e não utilizados ao fim a que se destinavam.
A repetição de indébito está vinculada ao locupletamento ilícito, tendo como pressuposto o efetivo pagamento de quantia indevidamente cobrada (decorrente do erro daquele que o efetuou), e não apenas a cobrança indevida.
Assim, o pedido de repetição de indébito merece parcial acolhimento, devendo a autora ser reembolsada pelos réus da importância de R$ 167.350,00 (R$ 190.000,00  R$ 22.650,00, estes, do saldo de honorários), soma essa a ser, corrigida monetariamente pelo IGP-M, que melhor reflete a inflação, desde os respectivos desembolsos, e acrescidas de juros de mora de 12% a/a, a contar da citação dos demandados (art. 406 do CC c/c art. 161, § 1º, do CTN; art. 219 do CPC; Súmula 163 do STF).
No que respeita ao saldo da honorária, como incidirá sobre o principal corrigido monetariamente, descabida nova atualização monetária. São indevidos, outrossim, os juros de 12% pactuados, porque os réus se apropriaram e dispuseram de soma bem superior ao seu crédito, da qual devem ter auferido ganhos sobre esse capital, quiçá em montante superior àqueles encargos.
Da mesma forma, no tocante às perdas e danos, entendo-as procedam em parte.
O papel da advocacia na sociedade é de
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extrema relevância, sendo indispensável à administração da Justiça.
A Constituição Federal, em seu art. 133, reserva espaço dentre as funções essenciais à Justiça, ao lado do Ministério Público e da Defensoria Pública.
O exercício da atividade profissional do advogado deve estar em consonância com as disposições legais e contratuais, possuindo ele responsabilidade pelos seus atos, quando houver violação dos deveres profissionais.
Ainda que a obrigação exigível do causídico seja de meio, e não de resultado, é seu dever profissional agir em defesa dos interesses de seu cliente, praticando todos os atos necessários e indispensáveis ao fiel cumprimento do mandato, que lhe fora outorgado, sob pena de, nos termos do art. 32 do Estatuto da OAB, ser responsabilizado pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa:
Art. 32. O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa.
Parágrafo único. Em caso de lide temerária, o advogado será solidariamente responsável com seu cliente, desde que coligado com este para lesar a parte contrária, o que será apurado em ação própria.
Outrossim, não se pode perder de vista o fato de que o advogado, frente ao cliente, na maioria das vezes, detém o monopólio do conhecimento jurídico. No caso em apreço, ao contratar os serviços do réu, a autora buscou total comprometimento do profissional com a causa.
O conjunto probatório demonstra, que o
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advogado réu e a pessoa jurídica, que leva o seu nome, além de não adquirir os precatórios, abandonaram as causas, deixando de esgotar a via recursal e de prestar contas à sua constituinte, embora instados a tal, via de e.mail e notificação extrajudicial.
Evidente, pois, o incumprimento dos deveres consignados no Estatuto da Advocacia (Lei n.º 8.906/94), cometendo as infrações previstas nos art. 34, incs. XI, XX e XXI, e 37, § 2º, consistentes no abandono da causa, recusa na prestação de contas e locupletamento. O próprio relator, no processo disciplinar referido alhures, concluiu nesse mesmo sentido, quando dispunha de informes apenas do pagamento de um dos cheques de R$ 30.000,00 (fls. 514/517).
O réu agiu de forma negligente ao deixar de interpor o recurso ao 2º grau de jurisdição, na ação anulatória nº 684/05, antecipando o trânsito em julgado e oportunizando a execução fiscal. Ainda que fosse diminuta a probabilidade de reversão do julgado, tinha o advogado o dever de utilizar-se de todos os meios jurídicos e legais na defesa da cliente (fls. 433/439), salvo expressa renúncia de sua constituinte, a algum desses direitos, do que sequer se tem notícia.
Ainda que fossem poucas as chances de obter vantagem futura por intermédio da interposição do recurso, não o fazendo, o advogado deixou de observar o seu dever profissional, usurpando da cliente as chances de ver reformada a sentença em seu favor.
A responsabilidade do causídico, pela mora do débito da autora, começou, quando suprimiu desta a oportunidade de quitação do débito, antes mesmo do ingresso da ação executiva fiscal, pela Fazenda Pública do
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Estado do Paraná, que foi promovida em 18-05-2007 (fl. 67).
Além disto, com a intenção de locupletar-se indevidamente, o demandado agiu com dolo, quando recebeu o montante de R$ 90.000,00 e não adquiriu o ativo contratado. Tal conduta impediu a compensação do ativo com o débito tributário, causando, por consequência, a majoração do valor da dívida (fls. 156/169 e 342/370).
Por agirem contrariamente aos ditames legais e contratuais, deixando de tomar as diligências esperadas, deve o profissional ser responsabilizado pelos encargos moratórios, infligidos e pagos pela demandante, ou seja, indenizando à autora dos valores referentes à multa, juros de mora, correção monetária e honorária, decorrentes exclusivamente desse atraso.
Esses encargos moratórios poderiam ter sido evitados pelos réus, via do singelo depósito judicial da soma pretendida pelo fisco, enquanto discutiam a legalidade e legitimidade do crédito tributário:
TRIBUTÁRIO. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. DEPÓSITO INTEGRAL. DIVERGÊNCIA ACERCA DE QUAL ENTE FEDERATIVO DETÉM A COMPETÊNCIA PARA A COBRANÇA DE TRIBUTO RELATIVO AO MESMO FATO GERADOR. SUSPENSÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO.
1. O recorrente objetivou com a propositura da ação consignatória exercer o seu direito de pagar corretamente, sem que tenha que suportar uma dupla cobrança sobre o mesmo fato gerador pelo Estado e pelo Município. Não se trata, pois, de discussão acerca do valor devido, mas sim de verificar qual é o ente federativo competente para a cobrança do respectivo tributo, tendo o recorrente, inclusive, realizado o depósito integral do valor
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devido nos autos da ação consignatória.
2. O tribunal recorrido assentou que foi autorizado, nos autos do processo consignatório, o depósito judicial do valor do ICMS cobrado, e suspensão da exigibilidade dos créditos tributários em discussão.
3. Dada as peculiaridades do caso concreto, em que pese a propositura da ação de consignação não ensejar a suspensão do crédito tributário, houve o depósito integral do montante cobrado, razão pela qual não poderia o Estado de Minas Gerais promover a execução Fiscal. Assim, excepcionalmente, é possível aplicar ao caso em comento a sistemática do enunciado da Súmula 112 desta Corte (o depósito somente suspende a exigibilidade do crédito tributário se for integral e em dinheiro).
4. Considerando ter sido a ação consignatória interposta previamente à ação executiva, impõe-se reconhecer a sua extinção, pois, segundo a jurisprudência desta Corte, a exigibilidade do crédito tributário encontrava-se suspensa (grifei).
5. Recurso especial provido (Recurso Especial nº 1040603/MG (2008/0054826-0), 2ª Turma do STJ, Rel. Mauro Campbell Marques. j. 09.06.2009, unânime, DJe 23.06.2009).
Esses encargos moratórios estão comprovados às fls. 74/78, não foram infirmados modo sério e idôneo e serão precisados em liquidação de sentença, via de cálculo aritmético, corrigidos monetariamente, pelo IGPM, desde o ajuizamento da ação (13-11-2008), e acrescido de juros de mora, de 1% a/m, a contar da citação (27-11-2008; art. 1º, § 2º, da Lei n.º 6.899/81).
III - Do exposto, julgo procedentes em parte os pedidos de Ultra-Ray Centro Diagnóstico Ltda., contra Neibal Bier da Silva e Neibal Bier da Silva Advocacia (NBS Advocacia), para condenar estes a:
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1- repetir à postulante a soma total de R$ R$ 167.350,00, corrigida, pelo IGPM, desde os respectivos desembolsos pela autora, e com juros de mora de 1% a/m, da citação dos demandados (27-11-2008, fl. 116v), e
2- pagar todos os valores relativos aos encargos da mora, incidentes sobre a obrigação principal tributária (multa, juros, correção monetária e honorária do executivo fiscal, relativos ao crédito de ICMS mencionado retro), advindos desse atraso negligente, a título de perdas e danos, o que será objeto de liquidação por cálculo aritmético, corrigidos monetariamente pelo IGPM, desde o ajuizamento desta ação (13-11-2008), e acrescidos de juros de mora de 1% a/m, a contar da citação (27-11-2008; art. 1°, § 2º, da Lei n.º 6.899/81).
Tendo em vista a sucumbência parcial recíproca, as custas judiciais serão distribuídas na proporção de 95% e 5%, pelos réus e autora, respectivamente, e arbitro as honorárias em 15% e 10%, sobre o mesmo vingar de cada parte, aos patronos da autora e réus, respectivamente, atento à natureza da causa, presumível tempo gasto e demais diretrizes legais (art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC), somas essas a serem compensadas (art. 21, caput, do CPC e súmula nº 306 do STJ).
Diante da infração disciplinar dos réus, por fatos adicionais àquele já objeto de sanção disciplinar, e da prática do crime de apropriação indébita, oficie-se de imediato à OAB, Subseção Passo Fundo, e ao Dr. Promotor de Justiça, Coordenador das Promotorias
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Criminais, encaminhando cópia das principais peças destes autos, reservadamente, para os procedimentos pertinentes (art. 40 do CPP e art. 72 do Estatuto da OAB).
Publique-se, registre-se e intimem-se.
Passo Fundo, 4 de junho de 2010.
Clóvis Guimarães de Souza,
Juiz de Direito em substituição.
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ERM
Nº 70038854295
2010/CÍVEL
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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
APELAÇÃO CÍVEL. MANDATOS. AÇÃO DE
RESTITUIÇÃO DE VALORES CUMULADA COM
PERDAS E DANOS.
I. Através dos documentos juntados aos autos, ficou
demonstrado que a parte autora repassou ao seu
advogado o montante de R$ 190.000,00 (cento e
noventa mil reais) única e exclusivamente para a
compra de créditos para dar fim ao débito daquela
junto à Fazenda Pública Estadual do Estado do
Paraná, oriundo da infringência à Lei 11.580/1996.
II. Por sua vez, o causídico não logrou êxito em
demonstrar a compra dos precatórios consoante
pactuado com a demandante, ônus que lhe incumbia
(art. 333, II, do CPC).
III. Nestes termos, imperativa a devolução do aludido
valor em favor da autora, não havendo falar que o
montante serviu para quitar outros contratos de
honorários advocatícios havidos entre as partes.
IV. A advocacia trata-se de atividade de meio e não de
resultado, não podendo o profissional ser
responsabilizado pelo insucesso do feito. Entretanto,
no caso concreto, acabou comprovada a desídia do
profissional contratado no exercício do mandato
outorgado, ensejando a sua responsabilização pelos
prejuízos materiais suportados pela demandante.
V. Sucumbência redimensionada.
NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DOS
RÉUS E DERAM PROVIMENTO AO RECURSO DA
AUTORA. UNÂNIME.
APELAÇÃO CÍVEL
DÉCIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL
Nº 70038854295
COMARCA DE PASSO FUNDO
NEIBAL BIER DA SILVA
APELANTE/RECORRIDO ADESIVO
NEIBAL BIER DA SILVA ADVOCACIA
APELANTE/RECORRIDO ADESIVO
ULTRA-RAY CENTRO
DIAGNOSTICO LTDA
RECORRENTE ADESIVO/APELADO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
RS
ERM
Nº 70038854295
2010/CÍVEL
2
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Sexta
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar
provimento ao recurso dos réus e dar provimento ao recurso da autora.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os
eminentes Senhores DES. PAULO SERGIO SCARPARO E DESA.
CATARINA RITA KRIEGER MARTINS.
Porto Alegre, 25 de outubro de 2012.
DES. ERGIO ROQUE MENINE,
Relator.
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