20/06/2013
Ausência de extratos - Justiça absolve mais um cliente do Oliveira Neves

20 junho 2013

Ausência de extratos - Justiça absolve mais um cliente do Oliveira Neves

Por Livia Scocuglia


O Tribunal Regional Federal da 3ª Região absolveu mais um cliente do escritório Oliveira Neves acusado de manter depósito no exterior acima de R$ 100 mil sem informar ao Banco Central. Para o juiz Marcelo Costenaro Cavali, da 6ª Vara Criminal Federal, não foi provado que o cliente mantinha conta bancária no exterior em 31 de dezembro de 2005  data em que teriam ocorrido movimentações denunciadas. A ausência desses extratos, por si só, impede a condenação, escreveu o juiz.

Essa é a segunda decisão relativa à operação monte éden, de junho de 2005. Durante a operação, a Polícia Federal e o Ministério Público Federal fizeram, em escritórios de advocacia, buscas de provas de evasão de divisas via off shores  empresas sem sócios identificáveis, sediadas em paraísos fiscais. As buscas, consideradas abusivas pela Ordem dos Advogados do Brasil, culminaram com a edição da Lei 11.767, em 2008, que alterou o Estatuto da Advocacia e garantiu a inviolabilidade dos escritórios de advocacia. O magistrado apontou na decisão que a documentação recolhida no escritório foi considerada inválida pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Habeas Corpus 149.008.

O juiz Marcelo Costenaro Cavali traz na decisão um histórico da lei dos crimes financeiros (Lei 7.492/1986). Ele diz que quando a lei foi editada, era necessário autorização prévia das autoridades para deixar o país com dinheiro ou fazer a remessa de valores. Porém, atualmente, só é necessário que a transferência eletrônica seja feita por via bancária, com ou sem contrato de câmbio, a depender do valor da transação, ou comunicada, se o porte for superior a R$ 10 mil em caso de saída física do país.

O Ministério Público apontou que o esquema ficou comprovado a partir de trocas de e-mails entre o cliente e os advogados do escritório Oliveira Neves. A denúncia afirmou que o cliente constituiu uma sociedade anônima financeira de investimento (SAFI) no Uruguai e abriu uma conta corrente em nome da off shore no Banco República Oriental do Uruguai. A Promotoria também apontou que o acusado foi auxiliado pelo escritório Oliveira Neves e que a sociedade anônima e a conta corrente teriam sido utilizadas para movimentar valores e manter divisas no exterior, ocultando o real proprietário dos bens. A defesa argumentou que se houve movimentação financeira no exterior em nome do cliente, isso teria sido feito pelos funcionários do escritório Oliveira Neves.

O juiz afirma que manter depósito no exterior não é crime. Cavali ainda aponta que o tipo penal exige complementação normativa e levanta uma série de questionamentos a esse respeito: Para que se possa compreender a conduta criminosa é preciso que sejam esclarecidas algumas questões: a) quem é obrigado a declarar a manutenção de depósitos no exterior?; b) quanto deve ser o valor do depósito para que exista a obrigação de declarar?; c) como deve ser cumprida essa obrigação?; d) quando deve ser cumprida essa obrigação?; e) para quem (qual repartição federal competente) devem ser declarados os depósitos?"

Cavali também diz que, ainda que se considerasse a atipicidade dos fatos imputados ao cliente  uma vez que as provas que embasam a denúncia foram consideradas ineficazes pelo STJ  sua absolvição ainda deve se dar de forma subsidiária, por conta da falta de justa causa para o processo. Diante disso, o cliente foi declarado inocente.

Operação monte éden
A operação foi iniciada quando a 5ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, por meio de mandado genérico, determinou que inquéritos policiais autônomos investigassem a atuação de cerca de 200 empresas que usufruíam dos serviços do escritório Oliveira Neves.

Mandados de prisão e de busca e apreensão foram cumpridos em São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, Alagoas e Distrito Federal. Mas o MPF reconheceu não ter provas das operações ilegais. Por isso, a Justiça decidiu arquivar o inquérito contra uma das investigadas.

A teoria da Polícia e da Receita foi a de que o escritório fazia parte de um grupo especializado em criar empresas de fachada no Uruguai, com o intuito de tirar dinheiro da mira do Fisco. A acusação é a de que clientes brasileiros abriam empresas no Uruguai  onde é possível ser sócio de um negócio apenas tendo títulos ao portador, sem vinculação pessoal  que, depois, tinham a entrada oficializada no Brasil. Laranjas funcionariam como representantes dessas companhias, segundo a PF, e mandavam dinheiro às matrizes no Uruguai. Quem recebia o dinheiro, diz a PF, eram os sócios ocultos brasileiros, sem qualquer tributação, o que também abria caminho para lavagem de dinheiro.

Provas ilegais
O advogado Newton José de Oliveira Neves já havia sido incriminado com elementos encontrados no escritório durante a operação. Ele chegou a ficar preso por oito meses  de junho de 2005 até fevereiro de 2006 , acusado de sonegação fiscal e evasão de divisas. Em 2007, foi absolvido pelo Supremo Tribunal Federal da acusação de sonegação fiscal. A 2ª Turma entendeu que a acusação de sonegação deveria ter sido precedida de procedimento administrativo fiscal, o que não aconteceu.

Em setembro de 2012, o Superior Tribunal de Justiça considerou ilegais as provas colhidas pela Polícia Federal nas buscas feitas no escritório. Isso porque o pedido de busca foi feito de forma genérica, e os elementos encontrados foram usados para incriminar o advogado, que nem era alvo da investigação originária. A decisão usou como base o artigo 133 da Constituição Federal, que garante que o advogado é inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão.

Livia Scocuglia é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 20 de junho de 2013
« VOLTAR