15/04/2008
OAB vai ao STF para frear segunda fase da Lei da Super Receita

OAB vai ao STF para frear segunda fase da Lei da Super Receita
Fonte: OAB | Data: 14/4/2008


Brasília, 14/04/2008  O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ajuizou hoje (14) no Supremo Tribunal Federal (STF) Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin 4068) para requerer a inconstitucionalidade da fase II da Lei nº 11.457/07, a Super Receita, que compreende a transferência integral do acervo da dívida ativa do INSS (bem como seu sistema informatizado de controle dos créditos tributários, processos administrativos e judiciais) para a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). A data prevista para a transferência era o dia 1º de abril deste ano, sem que esse último órgão da União disponha da mínima estrutura capaz de suportar o acréscimo de trabalho. A Adin é assinada pelo presidente nacional da OAB, Cezar Britto, e pelo advogado Francisco Rezek.



Na Adin, a OAB ataca especificamente a segunda fase da implantação da Super Receita, prevista no parágrafo 1º do artigo 16 da Lei 11.457/07, que trata efetivamente da transferência de atuações. A OAB cita os amplos problemas enfrentados atualmente pela PGFN, tais como infra-estrutura precária, carência de recursos humanos e materiais e sobrecarga de atividades, o que, por si só, inviabilizam a recepção de tantas demandas. Consciente de que está em andamento concurso público para provimento de 250 cargos de procurador da Fazenda Nacional, a OAB lembra que o número de vagas previstas nesse certame nem de longe perfaz o quantitativo que seria necessário para atender, satisfatoriamente, à demanda que se criará.

ÍNTEGRA DA PETIÇÃO

EXCELENTÍSSIMA SENHORA MINISTRA PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, serviço público dotado de personalidade jurídica, regulamentado pela Lei 8.906, com sede no Edifício da Ordem dos Advogados, Setor de Autarquias Sul, Quadra 05, desta Capital, por meio de seu Presidente e do patrono signatário (doc. 01), vem, com fulcro no art. 102, inciso I, alínea a, e 103, inciso VII, ambos da CRFB, e nos termos da Lei nº 9.868/99, propor
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
com pedido de medida cautelar
tendo por objeto o art. 16, § 1º, da Lei nº 11.457/07, pelas razões que passa a aduzir.
I  LEGITIMIDADE ATIVA
A legitimidade ativa do Conselho Federal da OAB para propor a presente ação direta decorre do art. 103, inciso VII, da CRFB, bem como do art. 2º, inciso VII, da Lei nº 9.868/99 (LADIN).
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Além disso, é incontroverso o entendimento tanto jurisprudencial1 quanto doutrinário2 de que a legitimidade que ostenta é universal, isto é, que goza de ampla prerrogativa de questionar a validade jurídico-constitucional de leis emanadas do Poder Público, independentemente do conteúdo material desses atos estatais e sem as restrições decorrentes do vínculo objetivo da pertinência temática.
II  DISPOSITIVO DE LEI IMPUGNADO
O dispositivo de lei impugnado na presente ADIn é o § 1º do art. 16 da Lei nº 11.457/07 (doc. 02), in verbis:
Capítulo II
Da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
Art. 16. A partir do 1o (primeiro) dia do 2o (segundo) mês subseqüente ao da publicação desta Lei, o débito original e seus acréscimos legais, além de outras multas previstas em lei, relativos às contribuições de que tratam os arts. 2o e 3o desta Lei, constituem dívida ativa da União.
§ 1o. A partir do 1o (primeiro) dia do 13o (décimo terceiro) mês subseqüente ao da publicação desta Lei, o disposto no caput deste artigo se estende à dívida ativa do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE decorrente das contribuições a que se referem os arts. 2o e 3o desta Lei.
(omissis)
1 Exempli gratia: ADIn 3-DF, Relator Ministro Moreira Alves (RTJ 142/363); ADIn 571, Relator Ministro Marco Aurélio (DJ 26.02.93, pág. 2.355); ADIn 949-DF, Relator Ministro Sydnei Sanches (DJ 12.11.93, pág. 24.023), ADIn 982, Relator Ministro Ilmar Galvão (DJ 06.05.94, pág. 10.485); ADIn-ED 363-SC, Relator Ministro Sydnei Sanches (DJ 18.10.96, pág. 39.857).
2 Do qual colham-se, por todos, CLÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro. 2ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, pág. 165; e BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. 2ª edição. São Paulo: Saraiva, 2006, pág. 141.
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Como se vê, a norma impugnada fixa o dia 1º de abril de 2008 como termo para a transferência integral do acervo da dívida ativa do INSS e do FNDE para a União e, por conseguinte, para a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional3.
A criação da Super-Receita, objeto da Lei em escopo, foi dividida em duas etapas. A fase I, prevista no caput do art. 16, implicou a transferência dos créditos tributários constituídos porém não inscritos em dívida ativa do INSS e do FNDE. A fase II, prevista no § 1º do mesmo art. 16, compreende a transferência de todo o acervo da dívida ativa, incluindo o sistema informatizado de controle dos créditos tributários nela inscritos, os processos administrativos a estes referentes, os dossiês ou processos administrativos de acompanhamento de processos judiciais deles decorrentes, e os processos judiciais em que se discutam esses créditos.
O objeto de impugnação da presente ADIn, como já se disse, é o § 1º do art. 16 da Lei nº 11.457/07  e, portanto, a fase II da implantação da Super-Receita.
III  O QUADRO FÁTICO SUBJACENTE
III.A  DOS PROBLEMAS ESTRUTURAIS DA PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL  PGFN
Fosse o relato que está por vir executado em um palco, o cenário que iria ser descortinado surpreenderia o espectador, testemunha ocular do
3 Conforme previsto no art. 131, § 3º, CRFB, e no art. 12 da Lei Complementar nº 73/93.
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desmoronamento da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional  PGFN, instituição com matriz constitucional, responsável pela captação de recursos materiais para o provento do Estado a que serve e pelo qual é aviltada ano a ano, década a década.
A PGFN opera já há algum tempo com absoluta sobrecarga de atividades, além de infra-estrutura precária e carência de recursos humanos e materiais.
Dentre as principais deficiências vivenciadas pelo órgão, citam-se a ausência de carreira de apoio e também de Procuradores em número suficiente para o desenvolvimento de um núcleo mínimo de atividades essenciais, a inexistência de sistemas de informática que permitam realizar operações fundamentais de controle da Dívida Ativa, a precariedade das instalações físicas, inclusive no que tange ao arquivamento de processos sujeitos a sigilo fiscal e mesmo à acomodação de servidores administrativos e Procuradores.
São afirmações que se constroem com esteio na realidade e não em meros juízos de especulação. Esse quadro caótico é tão visível que já foi identificado pelo Tribunal de Contas da União  TCU, que, em 2003, já acusava a carência de recursos humanos e o absurdo volume de trabalho que ocupava os Procuradores da Fazenda Nacional4 (doc. 03)
4 Parecer TCU nº 122/03. 28.02.2003
Ementa:
Auditoria Operacional. AGU. PGFN. Justiça Federal. Avaliação do sistema de recuperação de créditos da União. Falta de integração entre os sistemas de informatização. Problemas enfrentados pelo Programa de Recuperação Fiscal - REFIS. Dupla vinculação da PGFN. Órgãos executores dos créditos em duplicidade. Dificuldade de citação e penhora de bens de devedores. Ausência de medidas eficazes para priorização da execução de grandes devedores. Carência de recursos humanos. Determinação. Recomendação. Ciência ao Congresso Nacional. Ajuizamento dos créditos da União e aplicação da Lei de Execuções Fiscais. Análise da matéria.
(....)
2.Recursos humanos e materiais alocados à recuperação dos créditos da União
2.1.Pequeno contingente de servidores na Procuradoria Geral da Fazenda Nacional
A Procuradoria Geral da Fazenda Nacional passava, à época da auditoria, por dificuldades na execução de sua atividade-fim, a recuperação dos créditos inscritos na Dívida Ativa da União, em razão da falta de recursos humanos. Esse problema atingia tanto o quadro de servidores que atuavam diretamente na execução judicial, os Procuradores da Fazenda Nacional, quanto os
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Ao contrário do que se poderia supor, os apontamentos reportados pelo TCU não constituíram razão bastante para que a União acorresse a PGFN, suprindo-lhe as necessidades com o indispensável suporte estrutural.
Esse quadro de desmanche da estrutura jurídica da Administração Tributária federal foi objeto de representação ao Ministério Público Federal, protocolada na PGR/DF em 01.09.06 (doc. 04)  a qual se encontra em apreciação perante o Parquet federal.
E  ainda na contra-mão da mais cartesiana das lógicas , mesmo com uma estrutura estática, a PGFN foi lembrada mais de uma vez pelo legislador, que atribuiu a ela novas competências. Apenas com o fito de figurar o fenômeno, para além da Lei nº 11.457/07 (Super-Receita), que compõe o objeto desta ADIn, a Lei Complementar nº 123/06 conferiu à PGFN a até então inédita atribuição de recuperação de créditos estaduais e municipais,
servidores da área de apoio, que exercem as tarefas atinentes à cobrança administrativa desses créditos.
No caso dos procuradores, verificou-se que, de um quadro de 369 (trezentos e sessenta e nove), havia nessa época apenas 235 (duzentos e trinta e cinco) atuando na área judicial em todo o país, o que leva à existência de 11.468 ações judiciais sob os cuidados de cada um desses servidores. Nos Estados de São Paulo e Rondônia, essa média era superior a 25.000 processos.
Diante disso, o desempenho das atividades inerentes a essa competência institucional estava seriamente comprometido. Estava prejudicada, também, a qualidade das petições relativas à propositura de execuções fiscais e à impugnação de embargos, bem como o ajuizamento de outras medidas judiciais, pois os procuradores atuavam quase que exclusivamente no atendimento tempestivo de ordens e sentenças judiciais.
A posse de novos procuradores atenuaria o problema, uma vez que permitiria, além da drástica redução do quantitativo de processos por procurador, o aumento da sua presença nas Varas de Execução Fiscal, acompanhando e agilizando as ações. Seria necessário, também, aumentar o quantitativo de juízes de Primeira Instância, já que só o equilíbrio em todo o sistema possibilitaria a obtenção de resultados efetivos.
A deficiência de pessoal na área de apoio prejudica as atividades afetas à cobrança administrativa dos créditos inscritos na Dívida Ativa da União, desde o atendimento ao contribuinte, passando pela inscrição manual de créditos de outras origens e chegando ao parcelamento dos créditos. Compromete também a execução judicial, pois a maior parte das Procuradorias Estaduais e Seccionais não conta com um setor administrativo que efetue a conferência dos cálculos relativos às sentenças judiciais, bem como aos respectivos Documentos de Arrecadação de Receitas Federais (DARF) de recolhimento dos débitos. (grifou-se)
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consubstanciados no Simples Nacional5. Repita-se: atribuições dinâmicas, que respeitam progressões geométricas, para estruturas estáticas e precárias.
De mais a mais, o acúmulo de trabalho que acomete os Procuradores da Fazenda Nacional chegou a servir de fundamento para que o direito ao pleno gozo de férias não fosse a eles deferido por essa ínclita Corte Constitucional, em voto da lavra de sua eminente Presidente, quando do julgamento da Suspensão de Segurança nº 3.423, em trecho que deve ser lembrado:
Verifico, ainda, a ocorrência da grave lesão à ordem pública, considerada em termos de ordem administrativa, dado que a fruição de 60 (sessenta) dias de férias anuais trará sérios prejuízos ao regular exercício das atribuições institucionais da Procuradoria da Fazenda Nacional, cujas unidades normalmente atuam com escasso número de procuradores e sobrecarga de trabalho. (Grifou-se)
Ainda que essas incursões sejam altamente persuasivas, nada mais eloqüente do que números para demonstrar a importância republicana da PGFN, como também a dimensão do seu colapso institucional.
De acordo com o Relatório Anual de Gestão de 2006 (doc. 05), elaborado pela própria PGFN, hoje há 1.352 (mil trezentos e cinqüenta e dois) membros na Instituição. Ainda segundo esse mesmo relatório, naquele
5 Art. 41. À exceção do disposto no § 3o deste artigo, os processos relativos a tributos e contribuições abrangidos pelo Simples Nacional serão ajuizados em face da União, que será representada em juízo pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
§ 1o Os Estados, Distrito Federal e Municípios prestarão auxílio à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, em relação aos tributos de sua competência, na forma a ser disciplinada por ato do Comitê Gestor.
§ 2o Os créditos tributários oriundos da aplicação desta Lei Complementar serão apurados, inscritos em Dívida Ativa da União e cobrados judicialmente pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
§ 3o Mediante convênio, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional poderá delegar aos Estados e Municípios a inscrição em dívida ativa estadual e municipal e a cobrança judicial dos tributos estaduais e municipais a que se refere esta Lei Complementar.
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exercício havia 7.362.759 (sete milhões, trezentos e sessenta e dois mil, setecentos e cinqüenta e nove) débitos inscritos na Dívida Ativa da União (doc. 05, pág. 33), entre ajuizados e não ajuizados. A simples razão entre estes dados dá conta de que, nos dias que correm, a média de inscrições em Dívida Ativa da União por Procurador da Fazenda Nacional é da ordem de 5.450 (cinco mil, quatrocentos e cinqüenta).
Embora a penúria material seja de fácil suposição, ainda é possível manejar novas informações. Sem esforço, verifica-se que a conjectura logo ganha a dramaticidade dos fatos.
Sempre com arrimo na sobredita base de dados6, a mais idônea possível, conquanto aviada pela própria PGFN, constata-se que em 2006 havia R$ 401.678.658.155,33 (quatrocentos e um bilhões, seiscentos e setenta e oito milhões, seiscentos e cinqüenta e oito mil, cento e cinqüenta e cinco reais e trinta e três centavos) inscritos na Dívida Ativa da União. Se este número fosse divido pela quantidade atual de profissionais em exercício  com isso estabelecendo uma média linear  chegar-se-ia à incrível quantia de R$ 297.099.599,23 (duzentos e noventa e sete milhões, noventa e nove mil, quinhentos e noventa e nove reais e vinte e três centavos) por Procurador da Fazenda Nacional7.
Esses números deixam entrever pelo menos duas conclusões. Em primeiro lugar, é lancinante o estoque da Dívida Ativa da União. Logo em seguida, é de se observar que, se o Estado tem interesse e vocação para recuperar o crédito que pertence à sociedade brasileira  e nem mesmo a mais inconseqüente das digressões mentais poderia informar o contrário  seria
6 Relatório Anual de Gestão de 2006.
7 Note-se que ao referir uma média linear tem-se um resultado, em larga medida, conservador. Nem todos os Procuradores da Fazenda Nacional trabalham diretamente com a arrecadação. Há aqueles que desempenham funções jurídicas outras, como, exempli gratia, a imprescindível incumbência de prestar consultoria ao Ministério da Fazenda em todas as matérias que lhe são afetas. Portanto, abstraindo-se os profissionais que não militam com o propósito direto de arrecadar, a média prenunciada seria ainda mais contundente.
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necessário aparelhamento material. O modo verbal, posicionado no futuro do pretérito (aquilo que tinha tudo para ser, mas não foi), denuncia que a falta deste quesito é a principal carência da PGFN.
Se o grande contribuinte resolvesse dedicar atenção a determinada causa de natureza tributária que possa repercutir no exercício da sua vida civil ou empresarial, teria à sua disposição uma verdadeira constelação de bancas de advogados, muitos dos quais que há tempos formam o escol catedrático das letras jurídicas no País.
Nesse quadrante, impensável imaginar que qualquer causídico de elite, ao longo de sua militância, louve-se da mais aquilatada técnica prescindindo de estrutura material, sem o que o exercício de sua arte é simplesmente improvável.
Noutro giro, mas ao redor do mesmo epicentro  vale dizer, a causa de natureza tributária que mereceu a melhor cautela do contribuinte , estará a PGFN.
A sua atuação estará sempre animada pela tutela do interesse público. É dever seu defender o crédito tributário da União, inexistindo margens para que deixe de fazê-lo conforme o seu alvedrio. Sendo a PGFN a verdadeira curadora do crédito público federal, o mínimo que se poderia esperar de sua patrocinadora e maior interessada  a União  seria a adequada estruturação material, tal qual se dá invariavelmente com seus adversos.
Portanto, para além da qualificação jurídica, se é possível falar-se em arsenal de recursos em matéria de contencioso tributário, a melhor identificação desta característica estaria no aparelhamento organizacional existente para o exercício da advocacia, seja ela pública ou privada. Nada obstante, é notável que o arsenal de que dispõe a PGFN não passa de rudimentos inermes se tomado
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pela perspectiva dos recursos de que dispõem os contribuintes. Não há paridade de armas, apesar de o objeto em disputa ser o crédito público.
Sem embargo do fenecimento institucional, que corre à conta da União, a PGFN, com muitas dificuldades, vem sobressaindo nas lides judiciais, formulando e tornando vitoriosas teses de enorme impacto para a subsistência do Estado brasileiro.
Prova recente e expressiva do que se afirma verifica-se na qualidade da defesa da União desempenhada nos Recursos Extraordinários 353.657/PR e 370.682/SC, relatados, respectivamente, pelos preclaros ministros Marco Aurélio de Mello e Ilmar Galvão. Todos os debates nesses recursos orbitaram em torno da possibilidade ou não do aproveitamento jurídico do crédito originado do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) em operações antecedentes não tributadas ou submetidas à alíquota-zero. Concluído o julgamento, a PGFN logrou demonstrar não só que o posicionamento ao qual esta Excelsa Corte estava inclinada merecia revisão, como também que os efeitos da mudança de inteligência sobre a aplicação da lei deveriam ser prospectivos.
Caso ainda mais contundente se deu no âmbito do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do crédito-prêmio do IPI, no Recurso Especial nº 738.689-PR8.
Ainda nessa perspectiva da qualidade do trabalho jurídico prestado pelos Procuradores da Fazenda Nacional, a associação que lhes representa  o Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional  SINPROFAZ , em bem avalizado estudo, intitulado Os números da Procuradoria-
8 Ao deixar de restituir os exportadores, a União preservará em favor da sociedade brasileira valor estimado em R$ 200.000.000.000,00 (duzentos bilhões de reais) nos próximos dez anos.
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Geral da Fazenda Nacional (doc. 06), dedicou-se à profunda garimpagem dos resultados decorrentes da atuação de seus filiados.
Para que se possa figurar a persuasão dos números:
(i) com espeque nos relatórios de Gestão da União, apurou-se que nos últimos oito anos foi granjeada para os cofres da União a impressionante quantia de R$ 243.000.000.000,00 (duzentos e quarenta e três bilhões de reais) (doc. 06, pág. 5);
(ii) nos anos de 2005 e 2006 a PGFN custou módicos 0,57% (zero vírgula cinqüenta e sete por cento) dos valores que recuperou em favor do Erário. É o mesmo que dizer que o órgão devolveu à União R$ 175,32 (cento e setenta e cinco reais e trinta e dois centavos) para cada R$ 1,00 (um real) investido (doc. 06, pág. 6);
(iii) no ano de 2006, havia uma média de 9.610 (nove mil seiscentos e dez) processos por Procurador da Fazenda Nacional (doc. 06, pág. 8).
Se com aporte material tão tímido a PGFN produz frondosos resultados em benefício da sociedade, cumprindo, até aqui, com primazia seus desideratos constitucionais, é de se cogitar que, com o aperfeiçoamento de suas estruturas, possa aquele órgão arvorar ainda mais a arrecadação. A par disso, poderia fazer frente à miríade de destacados advogados particulares que, ancorados em suportes profissionalizados de trabalho, diligenciam na defesa dos interesses de contribuintes.
Para que não se diga que o cotejo é infundado, por contrapor a iniciativa privada à pública, o contraste persiste após a sobreposição de experiências de mesmo matiz. Os paradigmas agora passam a ser as outras carreiras jurídicas de Estado, mais especificamente a Procuradoria Geral da República e a Magistratura Federal.
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Ao contrário de membros do Ministério Público ou mesmo da Magistratura Federal, os Procuradores da Fazenda Nacional não contam com assessores ou auxiliares jurídicos para o desempenho do seu mister constitucional. Inexistem analistas ou oficiais incumbidos de coadjuvar no desempenho de atividades endereçadas à localização de bens e pessoas em executivos fiscais. Nesta tragédia todos os papéis estão resumidos em um único protagonista: o Procurador da Fazenda Nacional.
O máximo que a Instituição propicia aos seus membros são 532 (quinhentos e trinta e dois) estagiários, espalhados, de forma irregular, ao longo de todas as projeções da PGFN (doc. 06). Repetindo a mesma e trivial operação aritmética já ensaiada, é dado concluir que a média é de 0,4 (zero vírgula quatro) estagiários por Procurador. É tudo o que o Estado amparado pelo expertise deste profissional lhe reserva para a consecução de suas atividades cotidianas.
Além da uma marca que tangencia o zero absoluto em matéria de auxílio técnico juridicamente qualificado (menos que meio estagiário por Procurador), não pode faltar a informação de que os disputados acadêmicos servem à PGFN somente por meio período. À toda evidência, o que existe é a singela soma de boas-vontades, o que é muito diferente da profissionalização de uma estrutura de apoio qualificado, elementar à proteção do interesse público.
No particular, tendo novamente como alicerce o estudo anexo, Os números da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (doc. 06), é possível estabelecer uma relação entre o aumento da litigiosidade e a investidura de Juízes Federais e do Trabalho.
À elevação do número de processos, o Poder Judiciário responde com a criação de novas varas. Tendo ainda como paradigmas a Justiça
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Federal e a Justiça do Trabalho, observa-se que em 2003 havia 1.662 (mil seiscentas e sessenta e duas) varas. Em três anos esse número cresceu rapidamente, chegando a 2.107 (duas mil cento e sete) varas9 (doc. 06, pág. 8), circunstância que guarda proporção direta com o acúmulo de processos estocados, muitos deles  certamente a maioria  com a União, litigante contumaz que é, em um dos pólos.
Em 2003 um Juiz Federal ou um Juiz do Trabalho tinha sob seus auspícios uma média de 4.785 (quatro mil, setecentos e oitenta e cinco) processos. Um Procurador da Fazenda Nacional respondia por 5.530 (cinco mil quinhentos e trinta). Três anos mais tarde, em 2006, cada um dos sobreditos julgadores tinha sob a égide de sua toga 7.634 (sete mil, seiscentos e trinta e quatro) processos. Por outro lado, desatendido por auxiliares e não contando nem mesmo com a metade de um estagiário, na solidão de seu gabinete, estava o Procurador da Fazenda Nacional, oficiando em 9.610 (nove mil, seiscentos e dez) processos judiciais.
De parte a parte, a carga de trabalho é desumana, não há dúvidas. Trata-se de circunstância que pode ser amenizada ou agravada, conforme haja ou não estrutura mínima para o bom ofício das funções essenciais à Justiça, dentre as quais se insere a PGFN, ao lado do Poder Judiciário e do Ministério Público.
Poder contar com uma Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional bem aparelhada, muito mais do que um aspecto de subsistência de um Estado Social-Democrata, é questão de justiça fiscal.
Onera-se a sociedade brasileira, cada dia mais, com a elevação da carga tributária, mediante o manejo de alíquotas e bases de cálculos,
9 A Lei nº 10.772, de 21 de novembro de 2003, criou 183 novas Varas Federais.
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bem como pela criação de novos tributos, muitos deles com feições teratológicas. Calharia à União reverter tão peculiar engenho criativo na arquitetura e modernização do modelo de administração fazendária que lhe serve.
Com mecanismos eficientes e com técnicas apuradas de arrecadação, a perversidade da carga tributária revelar-se-ia um falso problema. Bastaria ao Estado debruçar-se sobre especialização dos seus órgãos de arrecadação, com diferenciado destaque à PGFN, para que fomentasse o Erário com maior competência.
Após a apresentação e inter-relação de tantos dados, retoma-se a referência feita no intróito deste tópico, que dizia com um invulgar espetáculo, capaz de pasmar o espectador já no primeiro ato.
O estarrecido e indignado espectador acima mencionado não é outro senão o cidadão brasileiro. O mesmo que é exposto à urdidura da legislação tributária cuja inteligência lhe é pouco acessível; aquele que recolhe pontualmente suas exações fiscais, fiando-se na gestão responsável dos recursos que provê à União, dela esperando, ao menos, a devida contrapartida; por fim, o cidadão honesto que sofre a incidência do poder fiscalizador, sempre obediente ao direito posto.
Todavia, a platéia é variada. Ao lado do assombrado contribuinte que age com retidão fiscal projeta-se a figura efusiva do sonegador, a aplaudir com exaltação o estado de ruína da secular Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, vendo cada vez mais facilitadas suas manobras de evasão fiscal e o seu locupletamento sobre a sociedade que deveria custear e pela qual é custeado.
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Naturalmente, é com o assombro e indignação do primeiro que a Corte Constitucional da República haverá de compreender todas as vicissitudes que impedem a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional de assimilar, neste momento, todos os efeitos da Lei nº 11.457/07, que instituiu a chamada Super-Receita, que será objeto de minudentes observações nos próximos articulados.
III.B  DA LEI Nº 11.457/07
Registre-se, desde logo, que não se trata de um manifesto de repúdio à Lei nº 11.457/07, que pretendeu veicular o princípio da maior especialização administrativa. Também não se trata de colocar em discussão as escolhas da Administração Pública, de todo discricionárias, balizadas pela conveniência e oportunidade.
A bem da verdade, a Lei nº 11.457/07 representou um inegável avanço na organização da Administração Fazendária. Pretendeu, a um só tempo, desburocratizar a arrecadação, sem comprometer a eficiência, e promover facilidades ao contribuinte, mediante a concentração de atribuições administrativas em órgãos especializados.
Tais propósitos restam cristalinos na Mensagem nº 807/05 do Presidente da República ao Congresso Nacional10 (doc. 07).
10 5. As vantagens dessa mudança de paradigma se refletirão: no aumento do efetivo da força de trabalho, na eficiente prestação de serviços demandados pela sociedade, bem assim no eficaz combate à sonegação, ao descaminho e a toda sorte de evasão fiscal; na visão integral que a
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Especificamente no que respeita à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, a Lei nº 11.457/07 significou a transferência de toda a atribuição tributária em matéria previdenciária e também a relativa ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação que hoje compete à Procuradoria-Geral Federal.
Com bastante clareza, o que se tem é o genuíno propósito de rever o modelo da Administração Tributária, tornando mais robusta a sua presença na estrutura organizacional do Estado.
O recrudescimento da musculatura estrutural da PGFN redundou na criação de 1.200 (mil e duzentos) novos cargos. Imperioso notar, todavia, que os referidos cargos foram concebidos, precipuamente, para reerguer a já combalida PGFN, ficando secundada a recepção do estoque previdenciário originário da Procuradoria-Geral Federal.
A questão foi assim apresentada pelo Presidente da República na Mensagem encaminhada às Casas parlamentares11:
18. A criação de cargos e unidades seccionais no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional decorre da premente necessidade de se atender ao
Secretaria da Receita Federal do Brasil terá sobre todo o processo tributário, sobre o sujeito passivo e seus atos jurídicos, oferecendo-lhe, por via de conseqüência, solução imediata e conclusiva das questões tributárias; na economia de tempo e precisão nas informações que o contribuinte terá ao obter, numa única administração tributária, os esclarecimentos que necessita; na redução dos custos  tanto da administração tributária (custo público) quanto ao sujeito passivo (custo privado)  acarretada pela simplificação de processos, pela uniformidade da legislação e de procedimentos e, ainda, pela racionalização de estruturas administrativas, do fisco e do sujeito passivo; e, finalmente, no fato de que o MPS [Ministério da Previdência Social] cuidará da sua atividade fim que é a área de benefícios, podendo, assim, melhor estruturar-se e especializar-se, aumentando a qualidade do seu atendimento. (Grifou-se)
11 Mensagem nº 807/05.
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volume desproporcional de serviço a que está submetido o órgão, situação agora reforçada pelas já referidas novas atividades que lhe advirão com a reorganização da administração fazendária da União. (...) (Grifou-se)
Ademais, verifica-se que os cargos criados, antes de atrelarem-se às novas competências administrativas de representação judicial, resultaram do esforço do Poder Executivo de responder à maior penetração da Justiça Federal ao longo do território nacional12.
Mais uma vez a Mensagem nº 807/05 do Presidente da República ao Congresso Nacional diz muito:
20. Corresponde a proposta, ainda, ao equivalente necessário da recém editada Lei nº 10.772, de 21 de novembro de 2003, que criou 183 Varas Federais destinadas, precipuamente, à interiorização da Justiça Federal de Primeiro Grau e à implantação dos Juizados Especiais no País. Antes mesmo da edição da referida Lei, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional já contava com um déficit de trinta municípios com Varas Federais instaladas sem a equivalente presença de unidades seccionais. Com o novo quadro jurídico, a situação se tornou insustentável. (Grifou-se)
Dito de outra forma, a criação dos 1.200 (mil e duzentos) cargos e das novas seccionais pouco se relaciona com as novas atribuições incumbidas à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Nitidamente, procuraram imprimir algum impulso para que o órgão pudesse acompanhar, num esforço
12 No ponto, relembra-se a anotação apresentada no tópico anterior, estabelecendo-se uma proporção direta entre a criação de varas judiciais e o volume de trabalho suportado pelos membros da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional.
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hercúleo e inglório, a velocidade do crescimento do Poder Judiciário e o afã da União em litigar.
Além disso, na mesma Mensagem enviada pelo Presidente da República ao Congresso Nacional ficou evidente que o Poder Executivo deveria, no prazo de 120 (cento e vinte) dias, a partir da publicação da Lei, encaminhar ao Congresso Nacional projeto de lei tratando dos cargos, da lotação, da remuneração, do exercício e da situação funcional dos servidores oriundos do Ministério da Previdência Social13. Nada obstante, o assunto continuou sendo negligenciado, sendo certo que a PGFN segue sem poder contar com quadro de apoio.
Diante desse quadro, além da franca necessidade de o Poder Executivo cuidar da criação de cargos administrativos, o que se tem é a premência de serem providos os 1.200 cargos de Procurador da Fazenda Nacional criados pelo art. 18 da Lei nº 11.457/07, bem assim a instalação das 120 seccionais da PGFN, conforme o art. 19 da mesma lei.
Não se fala, no caso em apreço, da estrutura ideal, mas sim da estrutura mínima, que é aquela prevista nos arts. 18 e 19 da Lei nº 11.457/07. Não se fala, também, no exercício de atividade legiferante ou de inov
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