Receita Federal: Quase sempre certa
5 de novembro de 2014
Os dados são da própria Receita Federal. De todo o montante envolvido em cobranças de tributos questionadas por contribuintes, 75% é mantido em julgamentos realizados pelas delegacias regionais da Receita – primeira instância administrativa para empresas e pessoas físicas impugnarem autuações fiscais. O percentual de vitória do Fisco na primeira instância não é baixo, especialmente se considerado o volume de questionamentos que recebe. Por ano, as delegacias da Receita proferem cerca de 93 mil decisões, que envolvem cerca de R$ 123 bilhões entre créditos tributários, pedidos de restituição, ressarcimento e compensação de tributos. Aguardam julgamento atualmente 205 mil processos, com volume total de R$ 114 bilhões, segundo o Fisco.
Sem acesso às sessões, pautas, locais e datas dos julgamentos, seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em cinco Estados estão em uma cruzada na Justiça contra o fim dos julgamentos fechados – ou secretos como passaram a ser chamados. Apresentada a defesa contra uma autuação, o contribuinte toma conhecimento da decisão administrativa pelo correio. A primeira sentença favorável a abertura dos julgamentos foi proferida ontem pela Justiça Federal no Rio de Janeiro.
“Nosso pedido está amparado nos princípios constitucionais da publicidade, do contraditório e da ampla defesa”, afirma o advogado Maurício Faro, presidente da Comissão de Estudos Tributários da OAB-RJ, entidade que inaugurou o movimento judicial pela abertura das sessões. O Ministério Público Federal no Rio de Janeiro se manifestou favorável a abertura das sessões.
Às cinco ações será anexado o parecer do jurista Eurico de Santi que defende a edição de norma prevendo a participação dos advogados e o acesso ao andamento processual. “Julgamentos secretos tão-só fomentam difusão de insegurança jurídica sistêmica, alimentam a indústria do contencioso tributário e promovem a não submissão da administração tributária ao controle social de seus atos e da aferição da eficiência de sua atividade”, afirma de Santi.
Em agosto, a JBS teve pedido para ser notificada da data e local de julgamento na primeira instância administrativa negado pela 6ª turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (Processo nº 0006972-73.2014.4.03.0000). “A ausência de notificação da sessão de julgamento para realização de sustentação oral não configura qualquer inconstitucionalidade”, entendeu a desembargadora Consuelo Yoshida. Em decisão de 2009, a 4ª turma do TRF-3 teve entendimento diverso. “Para o cumprimento integral da garantia constitucional que assegura o direito de defesa, a parte e/ou seus advogados tem que ser intimados da data em que serão apreciadas as defesas e os recursos que apresentaram, sob pena de serem inválidos tais atos”, afirmou o desembargador Roberto Haddad. (Processo nº º 2007.61.00.010205-9).
Para reduzir o tempo de julgamento, a Receita tem distribuído os recursos para qualquer uma das 15 delegacias de julgamento, independentemente do domicílio do contribuinte. “O contribuinte pode não concordar com o entendimento, mas se há uma posição rápida da administração tributária a sinalização passa a ser de que não vale a pena continuar litigando, de que é melhor pagar”, afirmou ao JOTA o subsecretário de Tributação e Contencioso da Receita Federal, Paulo Ricardo de Souza Cardoso.
A distribuição nacional e equânime de processos entre as delegacias – instituído pela Portaria nº 453, de 2013 – é um dos argumentos do Fisco para evitar a abertura das sessões, como afirma Cardoso em entrevista ao JOTA.
Por que não abrir as sessões de julgamento das delegacias da Receita?
Nossa percepção é de que a participação dos advogados está garantida em outras instâncias administrativas. Entendemos que não há prejuízo para o contribuinte porque ele terá uma segunda oportunidade [de apresentar defesa]. Aliás, mais duas oportunidades no Carf [Conselho Administrativo de Recursos Fiscais]. Então, de três oportunidades de defesa o advogado participa de duas. A abertura inviabilizaria a dinâmica, a agilidade e a qualidade dos julgamentos.
A agilidade e a especialidade [dos julgamentos] favorece o contribuinte com o melhor direito. Não há tendência pró administração. Os julgamentos são feitos em turmas, com cinco representes da Fazenda, mas há isenção. Os julgadores não estão contaminados pelos auditores que fizeram o lançamento. Além disso, o contribuinte teria um custo a mais se abríssemos os julgamentos porque o processo de um contribuinte de São Paulo pode ser julgado em Belém, por exemplo.
Todos os processos administrativos já são distribuídos para qualquer delegacia da Receita independentemente da sede fiscal do contribuinte?
Sim, não existe processo que não seja incluído na central única de processos e ocorra a distribuição virtual para qualquer das delegacias de julgamento. O objetivo foi equalizar a distribuição de processos. Para isso fizemos um trabalho prévio de digitalização, não temos mais papel em termos de processo. Não existe delegacia com muito e pouco processo. A distribuição tem sido feita de acordo com capacidade de trabalho de cada unidade. Com isso, conseguimos melhorar o tempo de julgamento.
Em quanto tempo, em média, os processos têm sido julgados?
Processos prioritários em 90 dias. Casos de pessoas idosas, de micro e pequenas empresas, isenções fiscais de pessoas físicas com moléstia grave, representações fiscais para fins penais e autuações superiores a R$ 10 milhões têm entrado no rol de prioridades. Fora dessa lista, há processos que ultrapassam um ano. Mas nossa meta é chegar a um tempo máximo de julgamento de 180 dias. Por mês, temos proferido de 5 a 8 mil decisões.
Qual o estoque de processos aguardando julgamento?
Atualmente, há 205 mil processos na primeira instância administrativa aguardando julgamento, que envolvem cerca de R$ 114 bilhões. Mas o estoque de processos tem sido reduzido sensivelmente. Em 2013, eram cerca de 235 mil processos.
Ao que a Receita atribui a queda?
O estoque de 205 mil processos é razoável. Quando encurtamos o tempo do processo a tendência é que a litigiosidade seja reduzida porque houve uma rápida manifestação da administração. Se há um processo há 10 anos sem julgamento há uma sinalização de que a matéria continua sendo objeto de questionamento. O contribuinte pode não concordar com o entendimento, mas se há uma posição rápida da administração tributária a sinalização passa a ser de que não vale a pena continuar litigando, de que é melhor pagar [o tributo exigido].
Quais questionamentos de contribuintes tem gerado julgamento em conjunto?
Fazemos eventualmente julgamento em bloco, juntando processos que tenham a mesma matéria, do mesmo tributo em função da especialidade. Por exemplo, isenção [de imposto] por moléstia grave são casos distribuídos a unidades ou turmas especializadas em pessoas físicas e nesse tópico específico. Questões sobre IPI [Imposto sobre Produtos Industrializados] são distribuídas a turmas especializadas nesse tributo. Isso traz qualidade ao julgamento.
Bárbara Pombo
jota.info
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