Regra clara - Só quem usa transporte coletivo pode receber vale-transporte
21 de abril de 2015, 12h25
O recebimento do auxílio-transporte é destinado apenas a quem utiliza transporte coletivo. Com esse entendimento, a 5ª Vara Federal de Porto Alegre indeferiu pedido para concessão do benefício, independentemente da comprovação do meio de locomoção utilizado para ir trabalhar. A sentença foi proferida no dia 14 de abril.
O Sindicato dos Professores das Instituições Federais de Ensino Superior da capital gaúcha (Ifes) foi quem ingressou com a Ação Civil Pública contra a Fundação Universidade Federal de Ciências da Saúde do município (UFCSPA). Alegou que a instituição de ensino vem se negando a conceder o auxílio a professores de utilizam seu próprio veículo, condicionando o pagamento à apresentação dos bilhetes de passagens.
A Universidade contestou. Argumentou que o direito à percepção da indenização só é devido ao servidor que utilizar o transporte coletivo no deslocamento entre sua residência e seu local de trabalho. Garantiu que a legislação é clara quanto a este requisito. A exceção, arrematou, abarcaria somente as conduções realizadas por veículos seletivos ou especiais.
Ao analisar o mérito do pedido, o juiz federal Gabriel Menna Barreto Von Gehlen pontuou que a letra da lei não dá margem a interpretações. Segundo pontuou, o benefício se destinado apenas a quem utiliza meios coletivos de transporte. Cabe recurso ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região. (Com informações da Assessoria de Imprensa da Justiça Federal do RS)
Revista Consultor Jurídico, 21 de abril de 2015,
SENTENÇA
Poder Judiciário
JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Rio Grande do Sul
5ª Vara Federal de Porto Alegre
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AÇÃO CIVIL PÚBLICA Nº 5091208-80.2014.4.04.7100/RS
AUTOR: SINDICATO DOS PROFESSORES DAS INSTITUIÇÕES FEDERAIS DE ENSINO SUPERIOR DE PORTO ALEGRE - IFES
RÉU: FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE CIÊNCIAS DA SAÚDE DE PORTO ALEGRE - UFCSPA
SENTENÇA
Trata-se de demanda em que postula declaração do direito dos substituídos ao recebimento do auxílio-transporte, independentemente da comprovação da utilização de transporte público para o deslocamento entre o trabalho e a sua residência, com a garantia de não-incidência tributária.
Sobreveio contestação e manifestação do MPF.
RELATEI. DECIDO.
A matéria não é nova neste juízo, pelo que repiso decisão já outrora prolatada:
A concessão do auxílio-transporte no serviço público é disciplinada pela Medida Provisória nº 2.165-36, de 23 de agosto de 2001, nos seguintes termos:
Art. 1º Fica instituído o Auxílio-Transporte em pecúnia, pago pela União, de natureza jurídica indenizatória, destinado ao custeio parcial das despesas realizadas com transporte coletivomunicipal, intermunicipal ou interestadual pelos militares, servidores e empregados públicos da Administração Federal direta, autárquica e fundacional da União, nos deslocamentos de suas residências para os locais de trabalho e vice-versa, excetuadas aquelas realizadas nos deslocamentos em intervalos para repouso ou alimentação, durante a jornada de trabalho, e aquelas efetuadas com transportes seletivos ou especiais.
[...]
Art. 2º O valor mensal do Auxílio-Transporte será apurado a partir da diferença entre as despesas realizadas com transporte coletivo, nos termos do art. 1o, e o desconto de seis por cento do:
[...]
§ 3º Não fará jus ao Auxílio-Transporte o militar, o servidor ou empregado que realizar despesas com transporte coletivo igual ou inferior ao percentual previsto neste artigo.
A questão é singela, porque a letra da lei não dá margem a interpretações: o benefício é destinado apenas a quem utiliza transporte coletivo. A concessão para outro universo de beneficiários (quem utiliza transporte individual) choca-se com a S. 339 do STF, e exige ademais reconhecimento de inconstitucionalidade por omissão parcial(quando o legislador confere um direito a um grupo com olvido, contra constitutionem, de outro que também o mereceria).
Assim aresto que conforta entendimento pela S. 339/STF:
MILITAR. AUXÍLIO-TRANSPORTE. MP 2.165/01. CANCELAMENTO DO PAGAMENTO. DESLOCAMENTO EM VEÍCULO PRÓPRIO. A Lei 7.418/85 (alterada pela Lei 7.619/87) criou o vale-transporte e a MP 2.165-36/01 instituiu o auxílio-transporte pago em pecúnia pela União. O auxílio-transporte destina-se a custear despesas de deslocamento residência-trabalho e vice-versa através de transporte coletivo público. Inexiste ilegalidade na normatização realizada pela Marinha (SGM-302), que vedou a concessão do auxílio-transporte em caso de deslocamento em veículo próprio. Não cabe ao Poder Judiciário, sob pena de atuação como legislador positivo, afastar expressa determinação legal. Apelo desprovido.
AC 200651010218828 AC - APELAÇÃO CIVEL - 422744 Relator(a) Desembargador Federal GUILHERME COUTO Sigla do órgão TRF2 Órgão julgador SEXTA TURMA ESPECIALIZADA Fonte DJU - Data::07/05/2009 - Página::139
Não se desconhece que é pacífico no STJ o reconhecimento do pleito ora deduzido.
Sem embargo, e datissima venia, enquanto não houver manifestação final do STF sobre a matéria (que diz respeito a inconstitucionalidade, e não a mera interpretação), afasta-se este juízo do acatamento que costumeiramente o inspira perante a jurisprudência daquela corte infraconstitucional. Aliás, constata-se inclusive, novamentevenia concessa, violação à súmula vinculante 10 do STF nessa jurisprudência que lá se constituiu, porque subjaz, repise-se, juízo de inconstitucionalidade (por omissão parcial) da norma.
Confirma-o as razões de decidir de recente julgado do STJ, que expressamente afastou a incidência da S. 10 STF (AgRg no REsp 980692 / RS Relator(a) Ministro HAROLDO RODRIGUES DJe 06/12/2010):
"[...] 3. Não há falar em violação ao princípio constitucional da reserva de plenário, nos termos do artigo 97 da Constituição Federal, quando não há, ao menos implicitamente, declaração de inconstitucionalidade de qualquer lei, como se observa na presente hipótese").
"Se o servidor utilizar seu veículo, ou fizer de outro modo, ainda fará jus ao benefício. Não é razoável excluir a incidência do auxílio só porque o servidor não se utiliza de transporte coletivo e ainda persistam as condições que legitimem a percepção.
O estado não tem o direito de ditar como seus servidores deverão se deslocar de suas residências para o local de trabalho. A exclusão de um benefício apenas por essa razão seria desproporcional e necessita ser afastada.
Também não é razoável a exigência, por parte da administração, de apresentação dos recibos dos gastos com transporte coletivo como condição para o recebimento do auxílio-transporte."
Redobradas vênias, mas apontar-se "irrazoabilidade" no discrímen ou ofensa à liberdade individual são à toda evidência juízos de inconstitucionalidade da norma, que por certo pedem não só exame final da matéria na corte constitucional, como julgamento pelo plenário dos tribunais. E repise-se: não se alegue que aí há mera interpretação da expressão "transporte público", porque "todo vocábulo é possuidor de um significado linguístico próprio e específico (caso contrário não estaria apto a alcançar um mínimo necessário para a comunicação, que é sua própria razão de ser)" (TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 104. São Paulo: Saraiva, 2010).
Por fim, confira-se o RE 598.093, relator o Ministro Eros Grau, que confirma a sobrevivência da S. 339:
"Servidor público. Isonomia. Artigo 39, § 1º, da Constituição Federal. Súmula 339 do STF.
Esta Corte, como demonstram os precedentes invocados no parecer da Procuradoria-Geral da República, tem entendido que continua em vigor, em face da atual Constituição, a súmula 339 ('Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos, sob fundamento de isonomia', porquanto o § 1º do artigo 39 da Carta Magna é preceito dirigido ao legislador, a quem compete concretizar o princípio da isonomia, considerando especificamente os casos de atribuições iguais ou assemelhadas, não cabendo ao Poder Judiciário substituir-se ao legislador. Contra lei que viola o princípio da isonomia é cabível, no âmbito do
controle concentrado, ação direta de inconstitucionalidade por omissão, que, se procedente, dará margem a que dessa declaração seja dada ciência ao Poder Legislativo para que aplique, por lei, o referido princípio constitucional; já na esfera do controle difuso, vício dessa natureza só pode conduzir à declaração de inconstitucionalidade da norma que infringiu esse princípio, o que, eliminando o benefício dado a um cargo quando deveria abranger também outros com atribuições iguais ou assemelhadas, impede a sua extensão a estes.
Brevitatis causa remeto ao parecer do MPF na parte em que examinou as preliminares, afastando-as todas.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, afasto as preliminares e julgo improcedente o pedido.
Sem custas ou honorários.
Vinda(s) a(s) apelação(ões) e satisfeitos os pressupostos recursais, recebo-a(s) no duplo efeito, oportunizando-se contra razões e, após, devendo-se remeter o feito ao eg. TRF4.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se
Documento eletrônico assinado por GABRIEL MENNA BARRETO VON GEHLEN, Juiz Federal Substituto, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 710000626407v3 e do código CRC 00f45517. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): GABRIEL MENNA BARRETO VON GEHLEN Data e Hora: 14/04/2015 17:15:01
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