Lei de Pernambuco que exigia depósito recursal é inconstitucional
24 de junho de 2015, 18h24
Por Giselle Souza
As unidades da federação não têm competência para legislar sobre direito processual. Foi o que declarou o Supremo Tribunal Federal ao julgar inconstitucional uma lei em vigor em Pernambuco que exigia o depósito de 100% do valor da condenação para as partes recorrerem das sentenças proferidas pelos juizados especiais pernambucanos. A decisão, publicada no último dia 10, se deu em resposta a uma ação movida pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.
A determinação do STF derrubou os artigos 4º e 12 da Lei 11.404, editada pela Assembleia Legislativo em 1996. A norma estabeleceu a obrigatoriedade do depósito para a interposição de qualquer recurso nos juizados especiais de Pernambuco.
Para Bichara, lei de PE ainda violou pgarantias do contraditório e ampla defesa
Luiz Gustavo Bichara (foto), procurador tributário do Conselho Federal da OAB, explicou que os dispositivos violam a competência privativa da União para legislar sobre direito processual, além dos princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa, previstos na Constituição.
Ao se pronunciar sobre a demanda da OAB, a Procuradoria-Geral da República opinou pela inexistência de violação à competência privativa da União. Contudo, confirmou concordou quanto à inconstitucionalidade do artigo 12 da lei pernambucana, que exige o depósito recursal no valor da condenação.
Só que o ministro Celso de Mello, relator, discordou do argumento da PGR e disse que os estados e o Distrito Federal não têm essa competência. "Somente a União Federal, considerado o sistema de poderes enumerados e de repartição constitucional de competências legislativas, possui atribuição para legitimamente estabelecer, em caráter de absoluta privatividade, a regulação normativa a propósito de referida matéria, inclusive no que concerne à definição dos pressupostos de admissibilidade pertinentes aos recursos interponíveis no âmbito dos juizados especiais”. A decisão foi unânime.
ADI 2.699
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Giselle Souza é correspondente da ConJur no Rio de Janeiro.
Revista Consultor Jurídico, 24 de junho de 2015, 18h24
DECISÃO - EMENTA
20/05/2015 PLENÁRIO
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 2.699 PERNAMBUCO
RELATOR :MIN. CELSO DE MELLO
REQTE.(S) :CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS
ADVOGADOS DO BRASIL
ADV.(A/S) :MAURÍCIO GENTIL MONTEIRO
ADV.(A/S) :RAFAEL BARBOSA DE CASTILHO
INTDO.(A/S) :GOVERNADOR DO ESTADO DE PERNAMBUCO
INTDO.(A/S) :ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE
PERNAMBUCO
E M E N T A: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE –
LEGISLAÇÃO ESTADUAL QUE INSTITUI EXIGÊNCIA DE DEPÓSITO
RECURSAL NO VALOR DE 100% DA CONDENAÇÃO COMO
PRESSUPOSTO DE INTERPOSIÇÃO DE QUALQUER RECURSO NO
ÂMBITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS DO ESTADO DE
PERNAMBUCO – REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL:
TÍPICA MATÉRIA DE DIREITO PROCESSUAL – TEMA SUBMETIDO
AO REGIME DE COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO (CF, ART. 22,
INCISO I) – USURPAÇÃO, PELO ESTADO-MEMBRO, DA
COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO FEDERAL PARA LEGISLAR
SOBRE DIREITO PROCESSUAL – OFENSA AO ART. 22, I, DA
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA – INCONSTITUCIONALIDADE
FORMAL DECLARADA – AÇÃO DIRETA JULGADA PROCEDENTE.
– Os Estados-membros e o Distrito Federal não dispõem de
competência para legislar sobre direito processual, eis que, nesse tema,
que compreende a disciplina dos recursos em geral, somente a União
Federal – considerado o sistema de poderes enumerados e de repartição
constitucional de competências legislativas – possui atribuição para
legitimamente estabelecer, em caráter de absoluta privatividade (CF, art. 22,
n. I), a regulação normativa a propósito de referida matéria, inclusive no
que concerne à definição dos pressupostos de admissibilidade pertinentes aos
recursos interponíveis no âmbito dos Juizados Especiais. Precedentes.
Consequente inconstitucionalidade formal (ou orgânica) de
legislação estadual que haja instituído depósito prévio como requisito
de admissibilidade de recurso voluntário no âmbito dos Juizados Especiais
Cíveis. Precedente: ADI 4.161/AL, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do
Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, sob a Presidência do
Ministro Ricardo Lewandowski, na conformidade da ata de julgamentos
e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em julgar
procedente a ação direta, para declarar a inconstitucionalidade dos
artigos 4º e 12 da Lei nº 11.404, de 19 de dezembro de 1996, do Estado de
Pernambuco, nos termos do voto do Relator, firmada a seguinte tese: “A
previsão em lei estadual de depósito prévio para interposição de recursos nos
Juizados Especiais Cíveis viola a competência legislativa privativa da União para
tratar de direito processual (art. 22, I, da Constituição)”. Ausente, neste
julgamento, o Ministro Marco Aurélio.
Brasília, 20 de maio de 2015.
CELSO DE MELLO – RELATOR
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