Eficiência do Programa de Redução de Litígios Tributários
5 de agosto de 2015
Em texto publicado neste espaço na Festa de Reis do corrente ano (6 de janeiro), analisando o que poderíamos esperar da Receita Federal sob a batuta de Jorge Rachid, então anunciado como seu comandante, apontei algumas questões. Dentre elas destaco, agora, duas: o aumento do contencioso tributário e a baixa probabilidade de um novo programa de recuperação fiscal (Refis) – embora, considerando a conjuntura econômica e o mencionado aumento dos conflitos entre Fisco e contribuinte, um programa semelhante viria a ser inevitável.
A Medida Provisória nº 685 veio confirmar, em termos, essas duas “previsões”. Com a criação do Programa de Redução de Litígios Tributários (Prorelit), o secretário da Receita Federal aceitou uma espécie de “Refis light” exatamente para tentar conter o estoque do contencioso tributário, tanto administrativo quanto judicial.
De acordo com o Prorelit, os contribuintes envolvidos em conflitos tributários, como autor ou réu, na esfera administrativa ou judicial, poderão liquidar até 57% do valor envolvido na disputa com saldo de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa da CSLL. Cabe aqui um esclarecimento tangencial: prejuízo fiscal e base negativa da CSLL são créditos fiscais na medida em que servem para compensar a base de cálculo dos tributos sobre o lucro (IRPJ/CSLL) de períodos posteriores, reduzindo dessa forma, o montante devido a título desses tributos – trata-se, efetivamente, de uma não cumulatividade tributária no método de base contra base.
Na essência, esse crédito fiscal somente pode ser utilizado para reduzir a base dos mencionados tributos.
Porém, houve algumas vezes, como no caso da MP 685 agora, que a legislação tributária permitiu a sua utilização como caixa, o que implica em aproveitá-lo para compensar o efetivo pagamento de tributos (e não tão somente a sua base).
Acontece que alguns fatores podem comprometer a eficiência desse programa.
De um lado, temos vivido a cultura dos programas de recuperação fiscal, que têm sido instituídos ou reabertos, em média, a cada três anos. A última janela de parcelamento com anistia parcial que tivemos foi em 2014, quando muitas empresas reduziram o seu contencioso tributário ao optar pela adesão ao carinhosamente chamado Refis da Copa (ou também conhecido como Refis da Crise). Considerando a proximidade dessa oportunidade, podemos concluir que se alguma discussão tributária, no âmbito administrativo ou judicial, ainda restou nas empresas, ela tende a ser de provável êxito para o contribuinte, ao menos na sua própria avaliação, o que diminui a chance da adesão ao Prorelit.
Por outro lado, o agravamento da crise econômica, especialmente nos últimos oito ou nove meses, fez com que as empresas deixassem de recolher seus tributos, utilizando essa inadimplência fiscal como forma de financiamento e de geração de caixa.
Tendo em vista o pouco tempo decorrido, essa falta de recolhimento dificilmente está em cobrança litigiosa, administrativa ou judicial, o que impede os contribuintes em atraso aderirem ao Prorelit.
Portanto, esse programa não é aplicável nos casos de mera inadimplência, o que implica que as empresas não poderão utilizar os saldos de prejuízo fiscal e de base negativa da CSLL para quitar dívidas tributárias em aberto.
Além disso, a necessidade de caixa tem aumentado o apetite das empresas pelo contencioso tributário, por meio do que são questionados todos os tributos que tenham algum ponto obscuro e que tenham qualquer argumento contra a sua cobrança (por exemplo: elevação da alíquota de PIS e Cofins nas importações; incidência de PIS e Cofins sobre receita financeira; possibilidade de creditamento do adicional de 1% da alíquota da Cofins; incidência previdenciária sobre verbas indenizatórias etc.). Sendo medidas judiciais mais recentes e com perspectiva de êxito, as empresas não abriram mão dessas disputas para incluí-las no Prorelit. Desistir dessas discussões seria, de certo modo, um contrassenso.
Ao que parece, a adesão ao Prorelit não tem um retrospecto e um contexto favoráveis. Posso morder a língua – ou melhor, os dedos que escrevem essas linhas –, no entanto, se essa análise se confirmar, o governo federal deverá rever seus cálculos no que diz respeito ao volume de arrecadação esperado em razão desse programa. Quem viver verá.
Edison Fernandes
Valor Econômico
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