Relator considera projeto de lei para tributação Brasil - EUA inconstitucional
Está cada vez mais difícil para a Receita Federal aprovar, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, o projeto de decreto legislativo que ratifica um acordo bilateral firmado com os Estados Unidos sobre sigilo tributário. Na semana passada, o relator do tema no colegiado, deputado Regis de Oliveira (PSC-SP), concluiu seu parecer e afirma: o texto é inconstitucional.
Nas 16 páginas do parecer, o parlamentar segue duas linhas de entendimento para classificar o acordo assinado pelo secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, e pelo embaixador norte-americano no Brasil, Clifford Sobel, em março de 2007. Para vigorar plenamente, o acerto precisa ser ratificado pelo Congresso Nacional. O texto já foi aprovado nas comissões de Finanças e Tributação e de Relações Exteriores da Câmara.
A primeira inconstitucionalidade apontada por Regis de Oliveira está na origem do acordo. Segundo o deputado, trata-se de um acerto bilateral de extrema importância estratégia para o Estado brasileiro. Com tamanha importância, o acordo deveria estar no patamar hierárquico de um tratado. E a Constituição de 1988 é clara sobre o tema, em seu artigo 84: cabe privativamente ao presidente da República assinar tratados. O chefe do Executivo pode delegar esse poder a ministros ou embaixadores, mas não ao secretário da Receita Federal.
Segundo Regis de Oliveira, acordos servem apenas para tratar de "matérias de menos relevância". O tema do acerto com os Estados Unidos em matéria tributária, na opinião do relator, trata de "assunto essencial ao funcionamento do Estado".
"A assinatura de um servidor público, por mais qualificado no direito interno como é o secretário da Receita Federal, não tem o condão de validar Acordo Internacional de tal ordem. É verdade que o conteúdo do tratado diz respeito ao aspecto tributário. No entanto, falta-lhe competência para fazê-lo", escreveu Regis de Oliveira, no relatório.
O segundo ponto do projeto de decreto legislativo atacado por Oliveira tem a ver com as funções dos servidores da Receita Federal. Segundo ele, a Emenda Constitucional nº 42, de 2003, transformou as administrações tributárias em atividades essenciais ao funcionamento do Estado brasileiro.
"Quando a Constituição estabelece que a administração fazendária deve ser exercida por servidores de carreiras específicas, o constituinte pretendeu conferir tratamento especial ao servidor da administração tributária, fortalecendo as carreiras fazendárias titulares da competência indelegável de arrecadar e fiscalizar tributos", argumenta Regis de Oliveira. Por esse entendimento, as funções dos servidores da Receita Federal e dos demais órgãos tributários são exclusivas e não podem ser exercidas por nenhum outro funcionário público, sobretudo de outro país.
A Receita Federal já se movimenta para tentar derrubar o relatório do parlamentar. O deputado José Genoino (PT-SP) tem sido municiado de informações para contrapor todas as posições de Oliveira. O petista redigirá voto em separado que será defendido pelo governo quando da votação do texto na CCJ. Embora a proposta tenha de passar pelo plenário da Câmara antes de ir ao Senado, a votação no comissão é fundamental, já que ela tem poder terminativo. Isso significa que, se rejeitar o texto por inconstitucionalidade, o projeto não poderá mais tramitar.
Segundo a Receita, a argumentação de que o secretário Rachid não tem competência para assinar o acordo bilateral não encontra respaldo jurídico. A autarquia lembra que o texto do acordo foi aprovado pelo Itamaraty, passou pela procuradoria da Fazenda Nacional e pela Casa Civil antes de ser enviado ao Congresso Nacional.
Em nota divulgada sobre o assunto, a Receita aponta três acordos aduaneiros - nos mesmos moldes desse tributário - firmados com Holanda, Rússia e Estados Unidos como exemplos de que o secretário da autarquia tem poderes para assinar tratados internacionais. O órgão lembra também que todas as atividades executadas pelos fiscais norte-americanos no Brasil serão submetidos à Receita. Todas as suas ações terão supervisão dos fiscais brasileiros. Em diversos trechos do projeto, há ainda a prerrogativa de a empresa ou a pessoa investigada recusar a fiscalização do outro país.
O Código Tributário Nacional é citado por Oliveira e pela Receita Federal ora para derrubar o acordo ora para defendê-lo. O deputado diz que o artigo 199 da legislação já prevê a cooperação com país estrangeiros em questões tributária, não havendo necessidade de ser firmar um acordo bilateral. A Receita lembra que o artigo exige expressamente que a permuta de informações seja feita por meio de "tratados, acordos ou convênios".
Na semana passada, a comissão aprovou a realização de uma audiência pública para debater o tema. O debate deverá ocorrer na segunda semana de agosto. O PT era contra a realização da discussão por entender que a maioria de seus convidados defendem a derrubada do acordo com os EUA.
Fonte:
Valor Econômico
Associação Paulista de Estudos Tributários, 23/7/2008 13:41:51
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