Tributaristas pedem cautela em acordo com EUA
Ainda dependente de aprovação parlamentar, o acordo de troca de informações sigilosas entre os fiscos brasileiro e americano só será conveniente para o desenvolvimento econômico do Brasil se for incluído num tratado maior, destinado, em primeiro lugar, a eliminar a dupla tributação sobre empresas que atuam ao mesmo tempo nos dois países. Essa foi, em síntese, a tese defendida ontem por especialistas ouvidos pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, sobre o projeto de decreto legislativo que trata do tema.
Foram ouvidos Heleno Taveira Torres, professor de Direito Tributário da Universidade de São Paulo (USP) e Antônio Carlos Rodrigues do Amaral, representante da Ordem dos Advogados do Brasil. Com tom menos crítico, mas também pedindo cautela aos deputados, participou do debate Agostinho Toffoli Tavolaro, dirigente da Câmara Americana de Comércio.
O projeto em discussão, de autoria do governo, prevê a aprovação do acordo firmado em março de 2007 pelos dois países, por intermédio da Secretaria da Receita do Brasil (SRB), de um lado, e da Embaixada dos Estados Unidos, do outro. Isso por si só, na opinião do representante da OAB, exigiria rejeição da proposta por inconstitucionalidade, uma vez que, pelo seu conteúdo, o acordo na verdade é um tratado e, portanto, deveria ter sido assinado diretamente pelo presidente da República.
As críticas dos especialistas, no entanto, se concentraram mais no conteúdo do que na forma. Na visão de Heleno Torres e de Antônio Amaral, o governo dos Estados Unidos estaria mais interessado mesmo é no acesso a informações fiscais que possam ajudar no combate ao financiamento do terrorismo e do tráfico de drogas, preocupação que é legítima. Porém, se o objetivo do intercâmbio for limitado a facilitar a fiscalização tributária, o Brasil perderá poder de barganha na negociação de um futuro acordo sobre dupla tributação, alertaram. Ou seja, atenderá a um interesse mais imediato dos americanos, sem garantir o bônus de desonerar investimentos estrangeiros diretos, modalidade de capital que interessa ao Brasil receber.
A assinatura de um novo documento, que livre as empresas de serem tributadas por ambos os fiscos em relação a um mesmo fato gerador, pode até sair no futuro. Afinal, concordaram os dois especialistas, além de terem acenado com tal possibilidade, os Estados Unidos já têm acordos nesse sentido com diversos outros países. O problema é que, separando as duas coisas, o governo brasileiro dificilmente conseguirá um acordo que respeite sua legislação interna, que garanta ao contribuinte brasileiro com investimentos naquele país salvaguardas contra eventuais abusos. A tendência dos americanos, na visão dos dois tributaristas, seria aceitar apenas o modelo assinado com outros países e que exige tratar as informações obtidas de acordo com a legislação dos Estados Unidos e não da do país que as forneceu. Ambos lembraram que, justamente por isso, com exceção de México e Colômbia, só paraísos fiscais e países menores do Caribe mantêm acordos com os Estados Unidos sobre dupla tributação.
Telmo de Freitas, um dos representantes da Receita no debate, reconheceu que o modelo de acordo sobre tributação aceito pelos Estados Unidos é ruim para o Brasil. Mas usou isso justamente para defender um acordo isolado sobre fiscalização, já que isso ajuda a combater a sonegação.
Fonte:
Valor Econômico
Associação Paulista de Estudos Tributários, 14/8/2008 15:16:04
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