Conselho aprova operação "casa e separa"
Marta Watanabe e Fernando Teixeira, de São Paulo e Brasília
Em 1996 a Nutec Informática, que criou o provedor de acesso NutecNet, associou-se à empresa de comunicação RBS. Como resultado da parceria, o provedor foi rebatizado de ZAZ. Em 1999, a RBS era a controladora da Nutec e buscou parceiros para o negócio. Em junho associou-se à Telefônica, que assumiu o controle da Nutec. A idéia da companhia de origem espanhola era aproveitar o potencial do ZAZ , na época o segundo maior site do país.
Cinqüenta dias depois, a parceria teve fim e a RBS deixou a sociedade. O ZAZ ficou com a Telefônica, dando origem, mais tarde, ao portal Terra. Ruy Baron/Valor.
Paulo Riscado: decisão não significa que as empresas ganharam a discussão
Três anos depois, em 2001, a Receita Federal autuou a RBS. Segundo o órgão, a curta parceria foi parte de uma operação batizada pelos tributaristas de "casa e separa". A fiscalização entendeu que a sociedade entre RBS e Telefônica foi parte de um planejamento tributário para eliminar ou amenizar o pagamento de 34% de Imposto de Renda (IR) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) sobre o ganho de capital que a empresa gaúcha de comunicação teria tido na venda da participação acionária na Nutec. A autuação apontou R$ 286,04 milhões em valores que deixaram de ser tributados.
Na terça-feira a Câmara Superior de Recursos Fiscais analisou o caso da RBS e derrubou a cobrança. A Câmara Superior é a instância máxima do Conselho de Contribuintes, orgão responsável por julgar administrativamente os autos da Receita. Trata-se do primeiro caso de suposto "casa e separa" analisado pela Câmara Superior.
Nesse planejamento, a empresa que pretende vender uma determinada participação acionária faz uma sociedade relâmpago com a companhia que quer comprar. O vendedor entra na sociedade com os ativos e emite ações que são subscritas pelo comprador. Um aumento de capital na joint venture embute um ágio que permite uma atualização de valor das ações na empresa que vende. O mecanismo que permite essa atualização é a equivalência patrimonial.
Assim, quando a vendedora sai da sociedade que montou com a compradora, ela não tem ganho de capital ou tem ganho reduzido porque o valor contábil das ações é igual ou próximo ao valor pago pela participação. Caso houvesse uma operação direta de compra e venda, todo o ganho seria tributado por 34% de IR e CSLL. Por quatro votos contra seis, num placar favorável à RBS, os conselheiros entenderam que a fiscalização não conseguiu comprovar que a parceria com a Telefônica foi realmente uma operação de "casa e separa".
Paulo Riscado, procurador que coordena os trabalhos da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional no Conselho de Contribuintes, sustenta que a operação da RBS é um "casa e separa". "A defesa, porém, usou alguns elementos que geraram dúvida sobre a aplicação do planejamento no caso e, por isso, a decisão do conselho foi contrária à autuação", diz Riscado. Para ele, porém, a decisão não é um precedente favorável para todos os casos autuados como tal. "Há outros processos nos quais fica mais evidente o uso da sociedade com o fim de economizar impostos."
O advogado Igor Nascimento de Souza, do Souza, Schneider e Pugliese Advogados, explica que o "casa e separa" é um daqueles planejamentos integrados por várias operações societárias legais, mas que têm sido alvo da Receita sob o argumento de falta de "substância econômica". Isso quer dizer que a operação teria sido feita com o único fim de economizar impostos. Ele concorda que o julgamento não pode servir como precedente favorável para todos os casos. "A decisão mostra que o planejamento pode ser aceito, mas ainda não se sabe como o Conselho decidirá nos casos mais extremos, como as sociedades montadas e desfeitas num único dia."
Com sustentação oral do jurista Hamilton Dias de Souza, do Dias de Souza Advogados, a RBS convenceu o Conselho de que a economia tributária, no seu caso, foi apenas um resultado, mas não o objetivo final da sociedade com a Telefônica.
Jimir Doniak Júnior, advogado do Dias de Souza, defende que a parceria teve propósito negocial. "Não foi uma sociedade de apenas 24 horas" , argumenta.
Ele lembra ainda que ao alegar que a operação tratava-se de um "casa e separa", a Receita questionou o valor pago pela Telefônica para ter 16,67% das ações totais da Nutec. Segundo a fiscalização, o valor foi exagerado porque correspondia a 100% das ações da Nutec, na época. Isso teria sido feito apenas para gerar o ágio para a valorização contábil da participação pela vendedora. A RBS alegou que o valor era justificado porque apesar de ter apenas 16,67% das ações totais da Nutec, a Telefônica passou a ter 50,01% das ações ordinárias, o que lhe deu o controle da ZAZ. "O valor é explicado porque o período era de supervalorização das empresas de internet", diz Doniak Jr. "Isso foi provado porque no mesmo ano, quando a Telefônica abriu o capital do portal Terra, as ações foram muito valorizadas. Ou seja, a Telefônica fez um ótimo negócio ao adquirir a participação da Nutec."
Fonte:
Valor Econômico
Associação Paulista de Estudos Tributários, 17/10/2008 15:04:33
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