VALOR ECONÔMICO - LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS - 9/3/09
Proposta do governo libera uso de seguro para garantir ações fiscais
O governo quer liberar o uso do seguro-garantia em execuções de dívidas tributárias, com a introdução de uma previsão em lei autorizando o instrumento. A novidade foi incluída no pacote de reforma da execução fiscal, um conjunto de quatro anteprojetos de lei elaborados pelo Ministério da Fazenda e atualmente aguardando liberação da Casa Civil da Presidência da República para ir ao Congresso Nacional - o que está previsto para ocorrer ainda neste mês. O seguro-garantia é usado para substituir os depósitos em dinheiro exigidos das empresas que enfrentam cobranças do fisco - e só assim podem obter certidões negativas de débito enquanto a discussão segue na Justiça.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional também está preparando uma regulamentação do assunto para determinar em quais condições o seguro será aceito - em especial o prazo de vigência da apólice (ver matéria ao lado). Com a autorização em lei, contudo, não só a União, mas os fiscos municipais e estaduais ficam compelidos a aceitar o seguro.
O seguro-garantia judicial foi previsto em lei pela primeira vez em 2006, com a reforma da execução civil, que introduziu a ferramenta no Código de Processo Civil (CPC), mas as procuradorias fiscais e boa parte dos juízes resistem ao uso em execuções fiscais. Ainda assim, segundo dados da Superintendência de Seguros Privados (Susep), o mercado de seguro garantia judicial multiplicou-se por dez depois da previsão no CPC - passou de R$ 5 milhões para R$ 50 milhões em prêmios entre 2006 e 2007.
A previsão do seguro na legislação de execução fiscal é bem avaliada por advogados tributaristas, que reconhecem resistências ao seu uso, algo problemático em um cenário de racionamento do crédito. Segundo o advogado Luís Gustavo Bichara, do Bichara, Barata, Costa e Rocha Advogados, o único produto financeiro equivalente ao seguro, a carta-fiança, encareceu sensivelmente desde o início da crise financeira, e agora muitos bancos exigem que as empresas depositem na instituição o valor equivalente à garantia - o que significa que o valor ficará imobilizado durante a execução fiscal, assim como ocorre no depósito judicial.
Segundo Adriano Almeida, superintendente da área do seguro garantia judicial na J. Malucelli, que domina cerca de metade do mercado, a previsão do instrumento na legislação de execução fiscal deverá significar um novo salto na demanda pelo produto. Mesmo sem previsão específica, o uso tributário é o principal destino das apólices de seguro judicial na empresa, bem à frente de seu uso em execuções trabalhistas, onde o valor dos contratos é bem menor, e da área cível, em que o uso é incipiente. Na J. Malucelli, a maior parte da carteira trata de garantias em execuções de ICMS, seguidos por PIS/Cofins e IPI.
Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), há no total cerca de R$ 70 bilhões em dinheiro depositados na Justiça Federal, estadual e trabalhista. Mas o valor serve apenas como referência para o tamanho do mercado, pois há poucas chances de esses depósitos serem substituídos por apólices de seguros - não há precedentes conhecidos em que a Justiça tenha aceitado a troca. Segundo Adriano Almeida, da J. Malucelli, é difícil estimar a demanda potencial do produto, mas novas ondas de disputas judiciais podem expandir o mercado - um exemplo seria uma eventual derrota dos contribuintes no caso crédito-prêmio IPI, disputa que, nas estimativas mais modestas, pode abrir um passivo de R$ 20 bilhões entre empresas e União.
Prazo é motivo de resistência na Justiça
Em fevereiro deste ano, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) proferiu a primeira decisão da corte em que aceitou uma apólice de seguro garantia, suspendendo uma execução fiscal de R$ 15 milhões em curso, referente a débitos de ISS. Na decisão, os desembargadores entenderam que, mesmo com um prazo de cinco anos, a apólice poderia ser usada como garantia em uma execução fiscal. O caso mostra que, além da previsão em lei, o uso do seguro garantia judicial deverá esbarrar no prazo de duração dos contratos, normalmente fixado entre três a cinco anos - bem inferior à duração média de uma execução fiscal, estimada em 14 anos pela Fazenda Nacional.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional mostra também pouca disposição em aceitar apólices de seguro com prazo determinado. Segundo o procurador-geral da Fazenda Nacional, Luís Inácio Adams, uma das hipóteses estudadas para a regulamentação do tema é aceitar contratos com duração de um ano ou mais, mas que tenham uma previsão de renovação automática, sem o que ocorreria necessariamente o sinistro - e o depósito, pela seguradora, da quantia estipulada na Justiça.
Para o superintendente de seguro-garantia judicial da J. Malucelli, Adriano Almeida, uma apólice do tipo seria inviável, pois significaria uma espécie "disfarce" do seguro com prazo indeterminado. O seguro com prazo indeterminado não é oferecido no país por exigência das resseguradoras internacionais, que aceitam contratos com duração máxima de um ano. A J. Malucelli, diz Almeida, consegue oferecer prazos de três anos - e excepcionalmente cinco anos - porque passou por uma longa negociação com as resseguradoras.
Segundo o superintendente da seguradora, hoje os contratos não preveem renovação automática, mas estabelecem que após o fim da apólice, caso não haja renovação, a empresa é obrigada a oferecer outra garantia à Justiça, pois a seguradora corre o risco de ser executada independentemente do fim da apólice. Isso já está sendo levado em conta por alguns juízes para aceitarem a garantia, diz Almeida, pois significa que a empresa é obrigada a manter permanente algum tipo de ativo depositado.
Fernando Teixeira, de Brasília
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