30/06/2009
Julgamento em até 30 dias

JORNAL DO COMMERCIO - DIREITO & JUSTIÇA
Julgamento em até 30 dias

O prazo de um ano para o Fisco analisar e julgar os processos administrativos, estabelecidos pela Lei 11.457/ 2007, vem sendo contestado pelas empresas com pendências no órgão. Inconformadas com a espera até a resolução dos pleitos de ressarcimento de créditos acumulados ou pagos a maior, elas passaram a requerer na Justiça a aplicação do prazo anteriormente em vigor, de 30 dias, conforme previsto na Lei 9.784/1999. A advogada Jacquelyne Fleck, do Martinelli Advocacia Empresarial, conta que seu escritório é responsável por nove ações com esse objetivo em trâmite no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que atende aos estados do Sul. No ano passado, a empresa obteve decisão favorável, sendo esta uma das primeiras sobre o assunto.

A advogada explicou que o prazo de um ano está previsto no artigo 24 da Lei nº 11.457/07, que instituiu a Super Receita. O dispositivo está inserido no capítulo que trata da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), que passou a ser responsável pela defesa da Receita e da Previdência Social, unificadas com a norma, e assim a representar o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) em processos com vistas a cobrar contribuições previdenciárias, inclusive nos que objetivam a contestação do crédito tributário. Portanto, segundo a advogada, esse prazo se destina ao órgão de defesa do Fisco, em seus procedimentos internos, e não à apreciação das demandas administrativas pelo Fisco.

Segundo Jacquelyne, para ser aplicado ao processo administrativo, o novo prazo deveria ter sido previsto na parte que trata do rito dessa demanda. "A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional acabou tendo a competência ampliada. Então, sofreu aumento significativo na demanda, por essa razão se estabeleceu um prazo razoável para sua atuação. No entanto, na parte que trata do processo administrativo, a Lei 11.457/2007 não trouxe nenhuma alteração. Se o legislador quisesse essa alteração, teria feito de forma expressa", afirmou a advogada, ressaltando que não há especificação na norma quanto à revogação do artigo 49 da Lei nº 9.784/1999, que estabelece o tempo máximo de 30 dias para que a Receita proceda a análise dos pedidos.

A advogada lembrou que o prazo de 360 dias se destina à Procuradoria Geral Fazenda Nacional (PGFN) no cumprimento de suas atribuições. Entre as quais, apurar a liquidez e certeza da dívida ativa da União, tributária ou de qualquer outra natureza, inscrevendo-a para fins de cobrança, amigável ou judicial; análise de pedido de cancelamento de Certidão de Dívida Ativa; análise de pedido de expedição de Certidão Negativa de Débitos; e examinar previamente a legalidade dos contratos, concessões, acordos, ajustes ou convênios que interessem à Fazenda Nacional, inclusive os referentes à dívida pública externa, e, quando for o caso, promover a respectiva rescisão ou declaração de caducidade, por via administrativa ou judicial.

Também esta listada entre as competências da PGFN representar a União nas causas de natureza fiscal, assim entendidas as relativas a tributos de competência da União, inclusive infrações à legislação tributária, empréstimos compulsórios, apreensão de mercadorias nacionais ou estrangeiras, decisões de órgãos do contencioso administrativo fiscal, benefícios e isenções fiscais, créditos e estímulos fiscais à exportação, responsabilidade tributária de transportadores e agentes marítimos, e incidentes processuais suscitados em ações de natureza fiscal.

O problema é que, apesar dessas especificações, o Fisco adotou o prazo de um ano para apreciação das ações administrativas. Não são incomuns, no entanto, os casos em que o próprio órgão não cumpre o prazo. A advogada lembrou que muitos escritórios têm recorrido ao Judiciário para garantir o julgamento das demandas em até 365 dias. e que a maior parte das decisões tem sido proferida no sentido de obrigar o órgão tributário a julgar no período determinado pela Lei 11.457/07.

Para a advogada, a determinação não é de todo benéfica aos contribuintes, uma vez que a Receita não aceita corrigir o crédito questionado. De acordo com Jacquelyne, a longa espera tem prejudicado muito as empresas, que acabam tendo que buscar recursos financeiros de terceiros para cumprir suas obrigações, enquanto possuem créditos a receber. "(Com essas decisões) O Fisco leva um ano para pagar e, ainda sim, sem fazer a correção monetária. Isso chega a representar até enriquecimento ilícito", disse a especialista, destacando que as empresas só conseguem ter seu crédito atualizado se reivindicarem no Judiciário.

"O Judiciário vem aplicando (o prazo de um ano) como se esse fosse o entendimento a ser adotado. No entanto, não estão analisando a questão sob o aspecto constitucional. Existem casos concretos em que há perigo de mora envolvido, que precisam ser analisados individualmente", acrescentou a advogada.

Na avaliação de Jacquelyne, mesmo que esse prazo pudesse ser aplicado ao processo administrativo, ainda assim continuaria a ser inconstitucional. "O contribuinte tem direito a um crédito perante a Receita que, pelo entendimento do próprio órgão, não é corrigido e pago só em um ano. Isso vai contra os princípios da moralidade e eficiência administrativa, bem como da razoável duração do processo", afirmou.

PRECEDENTE
Uma das primeiras decisões obrigando o Fisco a julgar a demanda administrativa em até 30 dias, apesar da confusão gerada pelo prazo de um ano estabelecido pela Lei 11.457/07, foi proferida pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em pedido liminar concedida em sede de agravo de instrumento. A ação foi ajuizada pelo Martinelli Advocacia Empresarial, em nome de uma empresa exportadora de calçados.

A decisão é de agosto do ano passado. Nela, a desembargadora Maria do Carmo Cardoso, reconhece: "A Lei n° 11.457, publicada em 19/03/2007, estabelece, no artigo 24, ser obrigatório que seja proferida decisão administrativa no prazo máximo de 360 dias a contar do protocolo de petições, defesas ou recursos administrativos do contribuinte. No entanto, sua inaplicabilidade ao caso em tela decorre do fato de que tal dispositivo está inserido no capítulo referente à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, enquanto a controvérsia instaurada neste feito dirige-se à Delegacia da Receita Federal em Feira de Santana/BA."

Segundo a magistrada, "a Lei n° 9.784/1999 impõe à administração o dever de decidir os processos administrativos de sua competência, estabelecendo, para tanto, o prazo de 30 dias para decisão, podendo ser prorrogado por igual período se manifestamente motivado, nos termos do artigo 49".

Pesquisa realizada por Jacquelyne indicou a existência de outro precedente, desta vez do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. O juiz federal convocado Marcelo de Nardi entendeu pela inaplicabilidade do prazo de um ano. Em seu voto, ele afirmou que "o argumento da localização topográfica do dispositivo já é suficiente para se concluir que a ele se aplica somente aos processos administrativos que tramitam no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, abstraída qualquer consideração acerca da sua constitucionalidade".

Por essa razão, ele entendeu que "há mais um motivo para que não se deixe de aplicar o artigo 49 da Lei 9.784/1999 aos pedidos de ressarcimento dos créditos do contribuinte. Se fosse intenção do legislador revogar esse dispositivo com o artigo 24 da Lei 11.457/2007, estaria contrariando o disposto no artigo 37 da Constituição Federal de 1988".

GISELLE SOUZA

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