16/07/2009
O QUE SIGNIFICA CONTROLAR A RECEITA?

> Globo | Administração | 15/07/2009
O QUE SIGNIFICA CONTROLAR A RECEITA?
O ministro Guido Mantega seguiu o tom de um governo que defende a blindagem das cavalariças do Senado em nome da governabilidade: decidiu fritar a secretária da Receita Federal, Lina Vieira. Logo ela, que reagiu ao festival de incentivos aos sonegadores votados pela bancada governista no Congresso, dizendo que o bom contribuinte se sente um otário.

Pelas contas do Ipea, os otários estão preferencialmente no andar de baixo. Quem ganha até dois salários mínimos é um otário de primeira e trabalha 197 dias por ano para pagar seus impostos. Quem ganha mais de 30 salários mínimos é otário de segunda e rala 106 dias. O grande sonegador ganha perdões e parcelamentos. Otário será quem acreditar que Lina Vieira não controlou a Receita.

Isso não é motivo de demissão, mas de homenagem. Controlada, a Receita vira balcão. Os auditores fazem seu serviço de acordo com a lei e as normas do serviço. Se ela foi frita porque não aceitou algumas propostas de controle, o caso está mais para a jurisdição do Código Penal do que para as leis tributárias. Otário será quem acreditar que a demissão de Lina Vieira deveu-se a uma queda na arrecadação. Se a atividade econômica do país contraiu e o governo conjura a crise com redução de tributos, o lógico seria uma queda na arrecadação de tributos.

Será otário também quem acreditar que Lina Vieira fez algo de errado ouvindo o sindicato dos auditores para a preenchimento de postos de chefia. O Unafisco, ao contrário do sindicato dos pipoqueiros, reúne servidores do Estado que chegaram à Receita por concurso público. Com oito mil associados na ativa, agrupa 95% da categoria. Ao contrário do que sucede com o sindicalismo palaciano, suas eleições têm mais de 70% de comparecimento e nos últimos dez anos alternaram vitórias da situação e da oposição.

Por 85% a 15% os auditores vetaram a associação do Unafisco a qualquer central sindical. Mais: abundam exemplos de diretores da guilda que deixaram suas funções sindicais e retornaram ao chão das repartições. Pode se reclamar do gosto que o Unafisco tem pelas greves (uma a cada dois anos), mas deve-se reconhecer que foi ele quem mordeu os calcanhares da quadrilha aninhada na cúpula da Receita. A primeira denúncia aconteceu em 1995 e em 2008 um magno foi demitido e outro, destituído.

Durante os últimos meses a secretária da Receita recebeu poderosas sugestões para nomear os superintendentes em Porto Alegre, Curitiba e Fortaleza. Não atendeu. Se tivesse atendido, o governo passaria pelo constrangimento de justificar a indicação de afilhados de empresários, ministros e governadores para funções técnicas.

Se a Receita de Lina Vieira foi aparelhada politicamente, como é que se explica a fiscalização da contabilidade da Petrobras dos doutores Sérgio Gabrielli e Almir Barbassa? Em matéria de aparelhamento, a Petrobras é uma universidade. Aparelho não incomoda aparelho. Se o ministro Guido Mantega contrariou-se com essa fiscalização, não deve contar para ninguém, pois o sentimento comprometerá sua biografia. No pior cenário, é possível que Lina Vieira tenha ido para a frigideira porque não controlou a Receita. Falta definir controle. >



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