06/07/2006
PARA 2ª CÂMARA CÍVEL, ICMS NÃO INCIDE SOBRE IMPORTAÇÃO DE BEM PARA USO PRÓPRIO

PARA 2ª CÂMARA CÍVEL, ICMS NÃO INCIDE SOBRE IMPORTAÇÃO DE BEM PARA USO PRÓPRIO

TJ/RS (Tributario.net - 4/7/2006)

Contribuinte do ICMS é quem adquire bens móveis com o intuito de revenda habitual, mediante lucro. Quem não pratica atos de comércio não é comerciante, não se sujeitando ao referido imposto. As considerações são da 2ª Câmara Cível do TJRS, que entende que a importação de bens por não-comerciante, para uso próprio, não se sujeita ao ICMS, inclusive a partir da Emenda Constitucional (EC) n° 33, de 11/12/2001.

Com esse entendimento, o Colegiado negou provimento à apelação do Estado do Rio Grande do Sul, em Mandado de Segurança impetrado pelo Serviço de Investigação SIDI S/A, empresa prestadora de serviços médicos, contra ato do Diretor do Departamento da Receita Pública Estadual.

"O art. 155, II, da Constituição Federal, ao definir a competência dos Estados para a sua instituição e cobrança, o autoriza somente sobre `mercadorias`, e não sobre bens que tais não são", argumenta o relator do recurso, Desembargador Roque Joaquim Volkweiss.

O magistrado atenta que a palavra "habitual", inserida no texto da EC n° 33/01, possui um significado decisivo: "A incidência ocorrerá ainda que o importador `não seja contribuinte habitual do imposto` (em relação ao bem importado), mas há de ser - necessariamente - um contribuinte". Para melhor esclarecer, cita o caso de uma siderúrgica que, necessitando importa um torno: "Essa empresa não é comerciante (`contribuinte`) de tornos, mas é comerciante (`contribuinte habitual`) de ferros."

Votaram com o relator os Desembargadores Arno Werlang e Adão Sergio do Nascimento Cassiano. Para conferir a íntegra da decisão, acesse aqui.

Recentemente, a 1ª Câmara Cível do TJRS, ao julgar situação semelhante, chegou à conclusão diversa: Empresa isenta de ICMS deve o tributo em caso de importação, entende 1ª Câmara Cível.

Proc. 70011092616

Adriana Arend

DIREITO TRIBUTÁRIO. IMPORTAÇÃO DE BENS, PARA USO PRÓPRIO, POR EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇOS MÉDICOS: NÃO-INCIDÊNCIA DO ICMS. Não se sujeita ao ICMS a importação de bens, para uso próprio, por empresa prestadora de serviços médicos, não comerciante, inclusive a partir da Emenda Constitucional nº 33, de 11/12//2001. Aplicação dos arts. 155, II, da Constituição Federal (que sujeita apenas a ¨mercadoria¨ ao ICMS, como tal entendido o bem móvel adquirido com o intuito de revenda habitual, mediante lucro), e do art. 110 do Código Tributário Nacional (que veda à lei instituidora do imposto alterar o sentido das palavras, institutos, conceitos, formas ou figuras do direito privado, utilizadas, pela lei constitucional, para definir ou limitar competências tributárias).
Apelo desprovido , por unanimidade.

Apelação Reexame Necessário

Segunda Câmara Cível
Nº 70011092616

Comarca de Porto Alegre
JUIZ DE DIREITO DA 6 VARA DE FAZ PUB DO FORO CENTRAL

APRESENTANTE
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

APELANTE
SERVICO DE INVESTIGACAO DIAGNOSTICA SIDI S A

APELADO
DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE DESPESA PUBLICA ESTADUAL

INTERESSADO

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, negar provimento ao apelo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Arno Werlang (Presidente) e Des. Adão Sergio do Nascimento Cassiano.
Porto Alegre, 13 de abril de 2005.


DES. ROQUE JOAQUIM VOLKWEISS,
Relator.

RELATÓRIO
Des. Roque Joaquim Volkweiss (RELATOR)
Trata-se de apelação cível e de reexame necessário, aquela interposta pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, à sentença de fls. 792/795, datada de 08/11/2004, que concedeu a ordem em Mandado de Segurança impetrado pelo SERVIÇO DE INVESTIGAÇÃO DIAGNÓSTICA SIDI SA, que presta serviços médicos, contra o DIRETOR DO DEPARTAMENTO DA RECEITA PÚBLICA ESTADUAL no sentido de anular o Auto de Lançamento nº 0010719911 lavrado com vistas à cobrança de ICMS na importação de bem, para uso próprio, no início de 2002. Não houve condenação do Estado em honorários; somente em custas.
Ao mandado, impetrado em 19/08/2004, foi atribuído o valor de alçada.
A sentença recorrida considerou induvidoso que, antes da EC nº 33/2001, não ocorria a incidência do ICMS nas importações de bens, para uso próprio, por quem não é comerciante, caso dos autos.
Insurgindo-se contra o entendimento esposado pela sentença, entende o Estado via apelo, não fazer a Constituição Federal a distinção adotada para excluir da incidência do ICMS a importação de bens para uso próprio.
Contra-arrazoando, sustenta a embargada a necessidade de manutenção da sentença, invocando, inclusive, precedentes do STF a respeito.
O MP de primeiro grau é pela admissibilidade do apelo e, neste grau de jurisdição, manifestou-se a PJ, em sessão, no sentido da não-incidência do ICMS na importação havida.
É o relatório, que submeto à douta revisão.
VOTOS
Des. Roque Joaquim Volkweiss (RELATOR)
Contribuinte do ICMS é, tão-somente, quem adquire bens móveis com o intuito de revenda habitual, mediante lucro. Quem não pratica atos de comércio não é comerciante, não se sujeitando ao referido imposto, como reiteradamente vem entendendo o STF (RE Nº 203075/DF, Rel. Min. ILMAR GALVÃO, Redator MAURÍCIO CORRÊA, 1ª Turma, STF, julg. em 05/08/1998, DJ de 29-10-99, p. 18).
Isso porque, a teor do disposto no art. 155, II, da CF/88, o imposto incide sobre ¨mercadorias¨, no conceito acima, não podendo este ser ampliado, sob pena de contrariedade ao art. 110 do Código Tributário Nacional, ¨verbis¨:
"Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, ..., para definir ... competências tributárias".
Conseqüentemente, bens adquiridos do exterior (ou mesmo vendidos no mercado nacional) por quem não é ¨comerciante¨ - caso da apelante -, não se encontram sujeitos ao referido imposto, porque o art. 155, II, da Constituição Federal, ao definir a competência dos Estados para a sua instituição e cobrança, o autoriza somente sobre ¨mercadorias¨ e não sobre bens que tais não são.
Nesse sentido os seguintes acórdãos:
"IMPORTAÇÃO DE BEM POR SOCIEDADE CIVIL PARA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS. EXIGÊNCIA DE PAGAMENTO DO ICMS POR OCASIÃO DO DESEMBARAÇO ADUANEIRO. IMPOSSIBILIDADE.
1.A incidência do ICMS na importação de mercadoria tem como fato gerador a operação de natureza mercantil ou assemelhada, sendo inexigível o imposto quando se tratar de bem importado por pessoa física.
2.... Importação de aparelho de mamografia por sociedade civil, não contribuinte do tributo. ... Inexistência de circulação de mercadoria. Não ocorrência da hipótese de incidência do ICMS".
(RE Nº 185.789/SP, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, Sessão Plenária, 03/03/2000, DJ de 19/05/2000, Ement. Vol. 1991-01, p. 129. Veja : RE-203075).
"CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ICMS. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. INSTITUIÇÃO DE EDUCAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS. C.F., ART. 150, VI, "C". 1. Não há invocar, para o fim de ser restringida a aplicação da imunidade, critérios de classificação dos impostos adotados por normas infraconstitucionais, mesmo porque não é adequado distinguir entre bens e patrimônio, dado que este se constitui do conjunto daqueles. O que cumpre perquirir, portanto, é se o bem adquirido, no mercado interno ou externo, integra o patrimônio da entidade abrangida pela imunidade. 2. Precedentes do STF. 3. RE não conhecido, unânime". (RE nº 203755/ES, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, 2ª Turma, STF, 17/09/1996, DJ de 08/11/96, p. 43221).
Então, essa é a interpretação mais consentânea com o entendimento do Supremo Tribunal Federal que se deve dar ao disposto na alínea ¨a¨ do inciso IX do § 2º do art. 155 da Constituição Federal, em sua redação anterior à Emenda Constitucional nº 33, de 11/12//2001, segundo o qual o ICMS incidirá também ¨sobre a entrada de mercadoria importada do exterior, ainda quando se tratar de bem destinado a consumo do ativo fixo ou estabelecimento¨, interpretação essa que resultou na seguinte súmula nº 660 do STF, assim consubstanciada:
Súmula nº 660:
"Até a vigência da EC 33/2001, não incide ICMS na importação de bens por pessoa física ou jurídica que não seja contribuinte do imposto".
A ressalva aposta nessa súmula, no sentido de que a não-incidência ocorria até a vigência da EC 33/2001, que alterou a redação da referida alínea ¨a¨ do inciso IX do § 2º do art. 155 da lei constitucional, não significou que a incidência ocorreria a partir dessa emenda. Não, e longe disso! O que ficou dito foi, tão-somente, que a análise, pelo Supremo, ainda não fora feita à vista da nova emenda.
Para mim, mesmo a partir da Emenda Constitucional nº 33, de 11/12//2001, a não-incidência persiste, bastando simples análise da nova redação da referida alínea ¨a¨ do inciso IX do § 2º do art. 155 da lei constitucional, recebida por aquela emenda, no sentido de que o ICMS
"incidirá também: a) sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, ...".
A palavra ¨habitual¨, inserida no texto do dispositivo, possui um significado decisivo para o entendimento da questão: a incidência ocorrerá ainda que o importador ¨não seja contribuinte habitual do imposto¨ (em relação ao bem importado), mas há de ser - necessariamente - um ¨contribuinte¨. É o caso, por exemplo, de uma siderúrgica que, necessitando de um torno para o corte de seus metais, o importa do exterior: essa empresa não é comerciante (¨contribuinte¨) de tornos, mas é comerciante (¨contribuinte habitual¨) de ferros.
A respeito já me manifestei em meu ¨Direito Tributário Nacional¨ (Livraria do Advogado, Porto Alegre, RS, 3ª edição, 2002, p. 150/151.
"Essa alínea ¨a¨, na redação que lhe deu a recente EC nº 33, de 11/12/01, como a anterior, continua não alcançando, a nosso ver, a pessoa natural ou física, nem, tampouco, a sociedade ou associação civil de fins não-econômicos, naturalmente não contribuintes do imposto, que importe bens do exterior para seu próprio uso ou consumo, porque a exigência do dispositivo é que o importador seja contribuinte, e essa qualidade a pessoa física e a sociedade ou associação civil de fins não-econômicos, decididamente, não detêm, porque comerciantes (que operem com mercadorias) não são.
O que o dispositivo pretende, ao que tudo indica, é alcançar finalidade dupla:
1º) estender ao contribuinte, como tal já inscrito, a incidência do imposto também quando venha a importar, do exterior, bens para seu próprio uso ou consumo (o que, aliás, já constava da redação anterior, quando dispunha que o imposto ¨incidirá também sobre a entrada de mercadoria importada do exterior, ainda quando se tratar de bem destinado a consumo ou ativo fixo do estabelecimento¨, e que, segundo o STF, não atingia a pessoas físicas e sociedades ou associações civis de fins não-econômicos); e,
2º) estender - e aí é que está a novidade - a qualquer pessoa, física ou jurídica, que importe, do exterior, bens em quantidade tal que indique sejam mercadorias (destinadas, portanto, a comércio ou revenda), fato que, então, o caracterizará, na previsão constitucional, como contribuinte, ainda que não seja habitual, como é o caso dos que trazem mercadorias do Paraguai para venda direta ou por interpostas pessoas, mas que, em razão da clandestinidade da operação, terminam não as submetendo ao desembaraço aduaneiro, momento legalmente previsto para o pagamento do ICMS devido nas importações.
Assim, se o objetivo é, com essa nova regra constitucional, alcançar, indiscriminadamente, todas as internações de bens e mercadorias, tanto as efetuadas por contribuintes (comerciantes) como as efetuadas por não-contribuintes (não-comerciantes), sinceramente, a redação mostra-se inteiramente inadequada".
Em outras palavras, não se sujeita ao ICMS a importação de bens, para uso próprio, por empresa prestadora de serviços médicos, não comerciante, inclusive a partir da Emenda Constitucional nº 33, de 11/12//2001. Aplicação dos arts. 155, II, da Constituição Federal (que sujeita apenas a ¨mercadoria¨ ao ICMS, como tal entendido o bem móvel adquirido com o intuito de revenda habitual, mediante lucro), e do art. 110 do Código Tributário Nacional (que veda à lei instituidora do imposto alterar o sentido das palavras, institutos, conceitos, formas ou figuras do direito privado, utilizadas, pela lei constitucional, para definir ou limitar competências tributárias).
Por essas razões, nego provimento ao apelo do Estado e confirmo a sentença em reexame, ainda que não necessário.
É o voto.


Des. Adão Sergio do Nascimento Cassiano (REVISOR)
Eminente Presidente. Eminente Relator.
Em sede doutrinária sempre entendi (in Direito Tributário. Cassiano. Adão Sérgio do Nascimento et alii, Ed. Síntese, 2000, pp. 180/189) que a importação de bem do exterior sempre foi alcançada pelo ICMS, pois, entre outros argumentos, trata-se de "operação de circulação de mercadoria", fato gerador do tributo aludido, sendo que na importação, a operação apenas começa no exterior (saída da mercadoria do estabelecimento vendedor), mas termina no Brasil (entrada na disponibilidade jurídica do importador), e, as operações internas iniciam (saída do estabelecimento) e terminam (entrada no estabelecimento comprador) no território nacional. É apenas essa a diferença entre uma operação e outra: o local onde iniciam.
Assim, se a mesma empresa, a ora apelada, comprasse as mesmas mercadorias agora em discussão de um comerciante importador - que as tivesse importado para revender no mercado interno - pagaria o ICMS embutido no preço da compra, tanto o ICMS da importação como o ICMS da revenda no mercado interno, em face do conhecido fenômeno da repercussão nos impostos indiretos. Em tais circunstâncias, o que autoriza que se a empresa - consumidora e usuária final, não-contribuinte do imposto - importando diretamente os bens do exterior, não deva pagar o tributo, quando, se comprasse de revendedora no mercado interno teria que pagar? A resposta é que nada autoriza o entendimento de que não deva pagar porque não é contribuinte. E tal entendimento não está autorizado inclusive porque viola o princípio de não-discriminação em face da origem e do destino dos bens - no caso a origem, do estrangeiro - previsto no art. 152 da CF/88.
Entretanto, na situação concreta dos autos, e tendo em conta a reiterada jurisprudência do STF em sentido contrário ao meu entendimento sustentado em sede doutrinária, mudei a orientação nos julgamentos, passando então a entender na linha da jurisprudência consolidada na Corte Suprema que editou a Súmula nº 660 que assim preceitua: "ATÉ A VIGÊNCIA DA EMENDA CONSTITUCIONAL 33/2001, NÃO INCIDE ICMS NA IMPORTAÇÃO DE BENS POR PESSOA FÍSICA OU JURÍDICA QUE NÃO SEJA CONTRIBUINTE DO IMPOSTO."
Entretanto, mesmo após a Emenda 33/2001, ainda se há se conservar o entendimento do STF - no mínimo por coerência - de que a legislação anterior à aludida Emenda não autorizava a cobrança nas importações por pessoas físicas e por empresas não-contribuintes.
E tanto assim é que a Lei Complementar nº 87/1996 foi alterada pela Lei Complementar nº 114/2002, especificamente no inciso I do § 1º do art. 2º, que define o fato gerador na importação, e no art. 4º que define o contribuinte do imposto.
Assim, a Lei Complementar adaptou-se à nova realidade decorrente da Emenda nº 33/2001.
Ocorre, todavia, que não foi alterada a legislação do Rio Grande do Sul, por isso que não foi adaptada à nova realidade decorrente da referida Emenda Constitucional. E se antes da emenda com a legislação que havia não poderia ser cobrado o tributo nas importações, por que a legislação era inconstitucional, não há falar em repristinação da referida legislação para agora se autorizar a cobrança.
Então, com essas considerações, apenas por outros fundamentos, estou acompanhando o voto do eminente Relator.

Des. Arno Werlang (PRESIDENTE) - De acordo.

DES. ARNO WERLANG - Presidente - Apelação Reexame Necessário nº 70011092616, Comarca de Porto Alegre: "NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME."


Julgador(a) de 1º Grau: MURILO MAGALHAES CASTRO FILHO
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