Notícias > STF | Princípios | 13/10/2009
MINISTRO CELSO DE MELLO GARANTE A LEGISLATIVO MUNICIPAL PROPOSIÇÃO DE LEI TRIBUTÁRIA
A reserva de iniciativa assegurada ao chefe do Poder Executivo, com exclusividade, para propor projeto de lei envolvendo matéria tributária, que prevaleceu ao longo da Constituição de 1969, não mais se aplica. Com a Constituição de 1988, os membros do Poder Legislativo passaram a ter legitimidade para iniciar o processo de formação de leis em matéria tributária.
Com base nesta jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o ministro Celso de Mello deu provimento a Recurso Extraordinário (RE 328896) ajuizado pelo Ministério Público do Estado de São Paulo para julgar improcedente ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo prefeito do Município de Garça (SP).
O recurso extraordinário contestou decisão proferida pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, que apontou a competência exclusiva do prefeito para propor lei tributária sob o argumento de que entendimento em contrário afrontaria o princípio da separação dos Poderes. No STF, o Ministério Público estadual alegou que a decisão do TJ/SP teria transgredido dispositivos constitucionais (artigos 2º e 61).
Em sua decisão, o ministro afirma que o entendimento vem sendo observado em sucessivas decisões monocráticas e colegiadas no STF. A análise dos autos evidencia que o acórdão diverge da diretriz jurisprudencial que esta Suprema Corte firmou na matéria em referência. Com efeito, não mais assiste, ao chefe do Poder Executivo, a prerrogativa constitucional de fazer instaurar, com exclusividade, em matéria tributária, o concernente processo legislativo, afirmou.
O ministro explicou que, por se tratar de matéria de direito estrito, a iniciativa reservada não se presume nem comporta interpretação ampliativa, devendo derivar de norma constitucional explícita e inequívoca, já que implica limitação ao poder de instauração do processo legislativo. O ato de legislar sobre direito tributário, ainda que para conceder benefícios jurídicos de ordem fiscal, não se equipara especialmente para fins de instauração do respectivo processo legislativo ao ato de legislar sobre o orçamento do Estado, concluiu.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO 328.896 SÃO PAULO
RELATOR : MIN. CELSO DE MELLO
RECTE. : MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL
RECDO. : MUNICÍPIO DE GARÇA
ADV. : LUIZ CARLOS GOMES DE SÁ
EMENTA: PROCESSO LEGISLATIVO. MATÉRIA TRIBUTÁRIA. INEXISTÊNCIA DE RESERVA DE INICIATIVA. PREVALÊNCIA DA REGRA GERAL DA INICIATIVA CONCORRENTE QUANTO À INSTAURAÇÃO DO PROCESSO DE FORMAÇÃO DAS LEIS. LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DA INICIATIVA PARLAMENTAR. RE CONHECIDO E PROVIDO.
- Sob a égide da Constituição republicana de 1988, também o membro do Poder Legislativo dispõe de legitimidade ativa para iniciar o processo de formação das leis, quando se tratar de matéria de índole tributária, não mais subsistindo, em conseqüência, a restrição que prevaleceu ao longo da Carta Federal de 1969. Precedentes.
DECISÃO: O presente recurso extraordinário foi interposto contra decisão, que, proferida, em sede de fiscalização abstrata de constitucionalidade (CF, art. 125, § 2º), pelo Órgão Especial do E. Tribunal de Justiça local, acha-se consubstanciada em acórdão assim ementado (fls. 324):
Ação direta de inconstitucionalidade. Lei tributária benéfica. Iniciativa do projeto cabente, exclusivamente, ao Prefeito. Afronta ao princípio da separação dos Poderes. Ação procedente. (grifei)
A parte ora recorrente, ao deduzir o apelo extremo em questão, sustentou que o Tribunal a quo teria transgredido os preceitos inscritos nos arts. 2º e 61, § 1º, da Constituição da República.
A análise dos autos evidencia que o acórdão mencionado diverge da diretriz jurisprudencial que esta Suprema Corte firmou na matéria em referência.
Com efeito, não mais assiste, ao Chefe do Poder Executivo, a prerrogativa constitucional de fazer instaurar, com exclusividade, em matéria tributária, o concernente processo legislativo.
Esse entendimento - que encontra apoio na jurisprudência
que o Supremo Tribunal Federal firmou no tema ora em análise
(RTJ 133/1044 - RTJ 176/1066-1067) - consagra a orientação de que,
sob a égide da Constituição republicana de 1988, também o membro do
Poder Legislativo dispõe de legitimidade ativa para iniciar o
processo de formação das leis, quando se tratar de matéria de índole
tributária, não mais subsistindo, em conseqüência, a restrição que
prevaleceu ao longo da Carta Federal de 1969 (art. 57, I):
A Constituição Federal de 1988 não reproduziu em seu texto a norma contida no art. 57, I, da Carta Política de 1969, que atribuía, ao Chefe do Poder Executivo da União, a iniciativa de leis referentes a matéria financeira, o que impede, agora, vigente um novo ordenamento constitucional, a útil invocação da jurisprudência que se formou, anteriormente, no Supremo Tribunal Federal, no sentido de que tal constituía princípio de observância necessária, e de compulsória aplicação, pelas unidades federadas. (RTJ 133/1044, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)
- A Constituição de 1988 admite a iniciativa parlamentar na instauração do processo legislativo em tema de direito tributário.
- A iniciativa reservada, por constituir matéria de direito estrito, não se presume nem comporta interpretação ampliativa, na medida em que - por implicar limitação ao poder de instauração do processo legislativo - deve, necessariamente, derivar de norma constitucional explícita 5inequívoca.
O ato de legislar sobre direito tributário, ainda que para conceder benefícios jurídicos de ordem fiscal, não se equipara - especialmente para os fins de instauração do respectivo processo legislativo - ao ato de legislar sobre o orçamento do Estado. (RTJ 179/77, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)
Impende advertir, ainda, na linha do magistério jurisprudencial desta Suprema Corte (RTJ 176/1066-1067, v.g.), que se revela inaplicável, aos Estados-membros e aos Municípios, ante a sua evidente impertinência, a norma inscrita no art. 61, § 1º, II, b, da Constituição, pois a cláusula consubstanciada nesse preceito constitucional concerne, unicamente, às proposições legislativas que disponham sobre matéria tributária pertinente aos Territórios Federais.
Cumpre ressaltar, por necessário, que essa orientação vem sendo observada em sucessivas decisões monocráticas e colegiadas proferidas no âmbito desta Suprema Corte (ADI 2.392-MC/ES, Rel. Min. MOREIRA ALVES ADI 2.464-MC/AP, Rel. Min. ELLEN GRACIE ADI 3.205/MS, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - AI 431.044/SP, Rel. Min. GILMAR MENDES - RE 309.425-AgR/SP, Rel. Min. CARLOS VELLOSO RE 341.882/SP, Rel. Min. CARLOS VELLOSO RE 362.573-AgR/MG, Rel. Min. EROS GRAU).
Cabe registrar, finalmente, tratando-se da hipótese prevista no art. 125, § 2º, da Constituição da República, que o provimento e o improvimento de recursos extraordinários interpostos contra acórdãos proferidos por Tribunais de Justiça em sede de fiscalização normativa abstrata têm sido veiculados em decisões monocráticas emanadas dos Ministros Relatores da causa no Supremo Tribunal Federal, desde que, tal como sucede na espécie, o litígio constitucional já tenha sido definido pela jurisprudência prevalecente no âmbito deste Tribunal (RE 243.975/RS, Rel. Min. ELLEN GRACIE - RE 334.868-AgR/RJ, Rel. Min. CARLOS BRITTO RE 336.267/SP, Rel. Min. CARLOS BRITTO RE 353.350-AgR/ES, Rel. Min. CARLOS VELLOSO RE 369.425/RS, Rel. Min. MOREIRA ALVES RE 371.887/SP, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA RE 396.541/RS, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - RE 415.517/SP, Rel. Min. CEZAR PELUSO RE 421.271-AgR/RJ, Rel. Min. GILMAR MENDES RE 444.565/RS, Rel. Min. GILMAR MENDES - RE 461.217/SC, Rel. Min. EROS GRAU RE 501.913/MG, Rel. Min. MENEZES DIREITO RE 592.477/SP, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI RE 601.206/SP, Rel. Min. EROS GRAU AI 348.800/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO AI 258.067/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).
Sendo assim, e pelas razões expostas, conheço do presente recurso extraordinário, para dar-lhe provimento (CPC, art. 557, § 1º-A), em ordem a julgar improcedente a ação direta de RE 328.896 / SP inconstitucionalidade ajuizada pelo Prefeito do Município de Garça/SP.
Publique-se.
Brasília, 09 de outubro de 2009.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator >
|