19/02/2010
CARGA TRIBUTÁRIA VOLTA A SUBIR COM ALTA DO PIB PREVISTA PARA ESTE ANO

Notícias > A Gazeta | Carga | 18/02/2010
CARGA TRIBUTÁRIA VOLTA A SUBIR COM ALTA DO PIB PREVISTA PARA ESTE ANO
Analistas e empresários criticam apetite arrecadatório e veem contrapartida deficiente em serviços públicos

Marcelo Rehder

A ligeira queda da carga tributária prevista para 2009 deverá anteceder uma nova alta em 2010, preveem especialistas e empresários.

Para o consultor tributário Amir Khair, entre os fatores que contribuem para uma nova alta da carga de impostos, taxas e contribuições em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) está o fato de que a economia brasileira voltou a crescer, andando com as próprias pernas.

Tanto é que o governo federal decidiu manter o cronograma de retirada das desonerações concedidas a vários setores de atividade. O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) incidente sobre os eletrodomésticos da chamada linha branca (fogões e geladeiras), por exemplo, já voltou ao nível normal.

O consultor argumenta que a carga tributária é comandada basicamente por três fatores: o lucro das empresas, a massa salarial e a inadimplência.

"Quando a economia cresce mais do que 4% ao ano, o lucro das empresas e a massa salarial crescem acima do PIB. Consequentemente, a arrecadação também cresce mais que a economia como um todo", explica Khair.

Segundo ele, da mesma forma como nos períodos de crise a inadimplência costuma aumentar, na época de vagas gordas os contribuintes regularizam a situação e voltam a recolher em dia os tributos.

"O peso da carga tributária sobre a sociedade brasileira é absurdo", reclama o empresário Mário Bernardini, assessor econômico da presidência da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq).

Na avaliação dele, o apetite arrecadatório do governo parece não ter fim. "Nossa carga já uma das mais altas do planeta, da ordem de 36% do PIB, e o governo ainda toma mais 3% a 4% do PIB para tapar o déficit nominal. A consequência é termos uma carga tributária de primeiro mundo, para uma renda per capita de segundo mundo e serviços públicos de terceiro mundo", compara.

O advogado Waldir Luiz Braga, presidente do Instituto Brasileiro de Auditores Tributários, tem opinião parecida com a do empresário. "O que a gente recebe de volta faz com que a carga seja maior ainda", reforça Braga.

Ele argumenta que, em países como a Dinamarca e a Noruega, onde a carga tributária é tão pesada como brasileira, a sociedade recebe contrapartida do Estado em serviços básicos gratuitos de primeira qualidade, como educação, saúde e segurança.

"Aqui, além da altíssima carga tributária incidente sobre a folha de pagamentos, as empresas ainda se veem obrigadas, por exemplo, a pagar assistência médica para seus empregados", diz Braga.

O problema é que o governo não tem demonstrado interesse em reduzir a carga tributária, nota o tributarista Gilberto Luiz do Amaral, coordenador do Observatório de Governança Tributária, que reúne entidades empresariais e outros representantes da sociedade civil. "O próprio presidente Lula disse, há um mês, que o brasileiro não pode esperar redução da carga, pois é com altos impostos que o governo financia os serviços públicos e paga o Bolsa-Família."

"Sem revisão do sistema, a carga vai crescer indefinidamente"

Marcelo Rehder ENTREVISTA Gilberto Luiz do Amaral: tributarista

O tributarista Gilberto Luiz do Amaral, coordenador do Observatório de Governança Tributária, diz que não há motivos para comemorar a redução da carga tributária prevista para 2009. "A queda foi muito pequena diante da enormidade da crise e das desonerações promovidas pelo governo federal." Para ele, falta vontade política para reduzir de fato o peso dos tributos sobre a sociedade.

Depois de 5 anos em alta, há sinais de queda da carga tributária em 2009. É motivo para comemorar?

Não, a queda foi muito pequena diante da enormidade da crise econômica e até mesmo das desonerações tributárias. Isso demonstra que o sistema tributário brasileiro tem uma multi-incidência sobre os resultados econômicos - produção, consumo, trabalho e renda - de forma com que as estruturas governamentais nunca deixem de arrecadar volume substancial de recursos com tributos.

Como o sr. avalia as desonerações promovidas pelo governo federal?

Foram importantes principalmente para incentivar o consumo naquele momento da economia. Tiveram ainda aspecto pedagógico que demonstra ao conjunto da sociedade que a estrutura do sistema tributário brasileiro está calcada principalmente no consumo. Apesar de a tributação sobre o patrimônio e renda aparente não ser alta para o cidadão, a carga tributária escondida no preço final das mercadorias e serviços é fenomenal. Tanto que a desoneração de IPI sobre automóveis impulsionou a arrecadação do PIS-Cofins, ICMS e IPVA. Imagine se tivéssemos uma queda do IPI ou de PIS e Cofins para todos os setores.

Qual a tendência para este ano?

A carga vai crescer de maneira muito substancial. O fim das desonerações e a volta do crescimento econômico farão com que a arrecadação seja recorde novamente. Teremos um crescimento da carga este ano entre 1 e 1,5 ponto porcentual. Se não houver uma desoneração por completo ou uma revisão do sistema tributário, a carga brasileira vai crescer indefinidamente.

E o que é preciso fazer?

Até para desmistificar um pouco, não é preciso fazer reforma tributária. O próprio governo mostrou que pode reduzir ou alongar prazos de recolhimento de impostos sem fazer qualquer reforma. Basta vontade política. >



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