30/04/2010
Governo desidrata as metas fiscais


Governo desidrata as metas fiscais

Claudia Safatle

Ao subtrair, do projeto de lei de diretrizes orçamentárias (LDO) para 2011, os limites para a dedução dos investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) da meta de superávit primário, pela primeira vez o governo deixou indefinida a meta fiscal para o próximo ano. A essa soma-se outra mudança, no texto do projeto de lei, que também representa maior flexibilidade na política do gasto público: a opção por estabelecer metas nominais. Ao suprimir o compromisso de produzir superávits como proporção do Produto Interno Bruto (PIB), qualquer crescimento econômico superior ao originalmente previsto no Orçamento poderá se converter em novas despesas.

Desde que começou a retirar o PAC das despesas primárias para efeito de apuração das contas do governo central, o projeto de LDO, elaborado pelo governo e enviado ao Congresso, definia, em valores nominais, quanto poderia ser abatido. Assim, na LDO de 2009 estava escrito que poderia ser deduzido da meta para o superávit consolidado do setor público, equivalente a 2,5% do PIB, até R$ 28,5 bilhões de despesas do PAC. Na de 2010, o valor fixado foi de R$ 22,5 bilhões.

Já o texto do projeto de lei para 2011 - que balizará o Orçamento do primeiro ano do novo governo - diz que a meta primária consolidada será de um superávit de R$ 125,5 bilhões, que poderá ser deduzido "até o montante do Programa de Aceleração do Crescimento-PAC". Se, por hipótese, o governo, no futuro, decidir dar um reajuste de 50% para os aposentados e colocar nessa medida o selo do PAC, o gasto resultante, conforme o texto da LDO, não seria tratado como despesa para efeito da meta fiscal.

Nos últimos anos, foram inúmeras as mudanças na apuração da performance fiscal do país, algumas explicáveis - como a exclusão da Petrobras - outras nem tanto. "Essa meta móvel só coroa um longo e diversificado processo em que foi minada a credibilidade dos indicadores fiscais tradicionais. Além da dívida líquida, também o cálculo do superávit primário foi depreciado", aponta o economista do BNDES José Roberto Afonso, especialista em política fiscal, que hoje trabalha com o senador Francisco Dornelles (PP-RJ).

Ele cita várias das mais recentes alterações, como o "abuso" dos "restos a pagar", que em 2009 somaram R$ 100,1 bilhões, ou 3,2% do PIB, deixando de ser uma conta residual para se configurar como um orçamento paralelo. Outro exemplo foi a "turbinada" nas receitas, no ano passado, com a conversão de depósitos judiciais em fonte de recursos líquidos e certos; ou ainda a conversão do lucro cambial de R$ 185 bilhões (contábil) do Banco Central, no fim de 2008, em superávit financeiro e a utilização desse superávit como fonte de receita para empréstimos bilionários do Tesouro Nacional ao BNDES.

Esses são fortes indícios de que as regras para se apurar receitas e despesas públicas estão mudando. E não está claro se são alterações em direção a um conceito aceitável de medição das contas ou se é apenas um jeito para o governo poder gastar mais. "Aparentemente se caminha para adotar o conceito de poupança pública como principal indicador de esforço fiscal e para suspender qualquer restrição orçamentária aos investimentos", suspeita Afonso. Outra hipótese seria o governo estar atrás da chamada "regra de ouro" da política fiscal: admitir o endividamento público, desde que limitado ao montante do investimento.

Mantega contorna crise com a Colômbia

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, teve uma longa conversa, na sexta feira, com seu colega da Colômbia, Oscar Ivan Zuluaga, e com o presidente do Banco Central daquele país, José Dario Uribe, para consertar o estrago recente nas relações entre os dois governos . O encontro ocorreu em Washington, durante a reunião anual do Fundo Monetário Internacional (FMI), quando Mantega tentou encerrar o incidente diplomático provocado pela decisão do representante do Brasil e de mais oito países latinos no fundo, Paulo Nogueira Batista Júnior, de demitir a diretora alterna (adjunta), María Inés Agudelo, indicada pelo governo colombiano.

Mantega pediu a Zuluaga que indicasse outro nome para o cargo, sugeriu que essa pessoa "venha com espírito desarmado" e garantiu que ela será recebida "de braços abertos" pelo representante do Brasil.

Por divergências com Agudelo, Nogueira Batista quebrou um acordo assinado nos anos 80 pelos ministros dos nove países que compõem a diretoria do Brasil, segundo o qual a diretoria-executiva é sempre do Brasil, a alterna é rotativa entre os demais países e não cabe ao diretor brasileiro fazer demissões nem vice-versa. Depois do incidente, o governo da Colômbia enviou carta ao FMI proibindo Nogueira Batista de representá-lo nas reuniões da instituição.

O único precedente dessa natureza que se tem notícia na história do FMI ocorreu quando da revolução dos aiatolás, no Irã, em 1979. Com a derrubada do regime, os aiatolás pediram ao FMI que demitisse o diretor-executivo indicado pelo governo do xá Reza Pavlevi. O fundo negou e alegou que o mandado teria que ser cumprido. O aiatolá Khomeini, então, desautorizou a representação, tal como fez agora o governo da Colômbia.

Fonte:
Valor Econômico

Associação Paulista de Estudos Tributários, 30/4/2010 16:02:14
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