12/01/2011
Drible da Receita - Mudança no cálculo do preço de transferência é ilegal

Drible da ReceitaMudança no cálculo do preço de transferência é ilegalPor Alessandro CristoAo se posicionar, no fim do ano passado, pelo cálculo mais favorável ao fisco em relação ao preço de transferência, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, tribunal de assuntos tributários do Ministério da Fazenda, deixou poucas possibilidades às indústrias que importam insumos do exterior e que contestam a forma atual de apuração do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido. Agora, empresas que não aceitarem o cálculo determinado pela Instrução Normativa 243/2002 da Receita Federal, que gera tributação maior do que a da regra anterior, terão de esperar uma inversão do resultado na instância final do Conselho, ou recorrer ao Judiciário.

A expectativa na Justiça, no entanto, é mais animadora. Em agosto, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região, ao julgar o caso pela primeira vez, foi favorável aos contribuintes. Por maioria, uma das turmas da corte considerou que a mudança na apuração jamais poderia ter sido feita por meio de uma norma infralegal da própria Receita, mas somente pelo Legislativo. O acórdão, única decisão de segundo grau de que se tem conhecimento sobre o assunto, foi publicado em setembro.

Criada para impedir que as empresas diminuam o valor do IR e da CSLL a pagar por meio do envio de lucros a coligadas no exterior, a regra de apuração do preço de transferência pelo método "Preço de Revenda menos Lucro" passou a ter nova disciplina em 2002, com a IN 243. Antes, eram as Leis 9.430/1996 e 9.959/2000 que regiam os cálculos  e que, para indústrias que brigam na Justiça, ainda são a única forma legítima de apuração.

Na prática, o que a Receita fez com a edição da IN foi mudar critérios para a apuração da base de cálculo do imposto. Até 2002, a base tributável era a média aritmética dos valores da venda dos produtos ao consumidor, menos descontos oferecidos, impostos incidentes sobre as vendas, comissões pagas e uma margem de lucro de 60% nas revendas.

Com a IN 243, porém, não era mais a média aritmética das vendas ao consumidor que deveria ser levada em conta, mas sim a média presumida do valor de uma suposta venda dos insumos importados  que jamais seriam vendidos, mas sim usados na fabricação dos produtos. Segundo as empresas, o que aconteceu não foi uma mera mudança de método, mas uma forma de majoração do IR e da CSLL a pagar, por meio do aumento indireto da base de cálculo desses tributos.

Em dezembro, em julgamento decidido no voto de minerva do presidente da sessão, o Carf decidiu que o método da Receita está correto. A questão foi levada pela Semp Toshiba ao Conselho, e dividiu os votos em três para cada lado. A empresa ainda pode recorrer à Câmara Superior de Recursos Fiscais, instância final da corte administrativa.

No Judiciário, a situação pende para o lado dos contribuintes. Já existe decisão de mérito em segundo grau contra o método da Receita. Em agosto, a 3ª Turma do TRF-3 reverteu uma sentença contrária à Delphi Diesel Systems do Brasil Ltda, que produz autopeças no país com insumos importados. O Mandado de Segurança foi ajuizado pelo advogado Paulo Rogério Sehn, do escritório Trench, Rossi e Watanabe Advogados.

Designado como relator no lugar do desembargador federal Carlos Muta, o juiz federal convocado Roberto Jeuken rejeitou os argumentos da empresa. Para ele, a Instrução Normativa não criou nova regra que aumentou tributo, o que caberia apenas à lei fazer, mas sim dispôs sobre as "deduções permitidas na apuração do Lucro Real e da base dimensível da CSLL, as quais seriam de duvidosa natureza tributária". Ou seja, a Receita teria apenas, segundo o juiz, regulamentado o que a lei deixou em aberto.

O desembargador federal Márcio Moraes abriu divergência. "Os comandos trazidos pela IN 243/2002 não consistem em mera alteração da fórmula matemática para cálculo do preço parâmetro, resultando, sim, em majoração do IRPJ e da CSLL", disse ele em voto-vista. "A própria lei cuidou em fornecer todos os critérios necessários à operacionalização do método PRL, não carecendo a aplicabilidade de regulamentação alguma."

Em seu entendimento, a intenção do órgão foi mesmo a de usurpar a função do legislador, o que teria ficado comprovado sete anos depois. A IN 243, de acordo com Moraes, tem texto muito semelhante ao da Medida Provisória 478/2009, que deu nova redação à Lei 9.430/1996, mas acabou não sendo convertida em lei pelo Congresso. "Continua eloquente e significativa a abordagem, por Medida Provisória, do assunto em questão, sendo claro indicativo de que o tema muito além está do singelo poder regulamentar das instruções normativas", afirmou o desembargador. A MP perdeu seus efeitos em 1º de junho do ano passado.

Na ementa do julgado, a 3ª Turma resume como interpertou a iniciativa do fisco: "à guisa de complementar a disposição legal regente do assunto, sobrevieram instruções normativas da Secretaria da Receita Federal, incluindo a de número 243/2002, que extrapolou o poder regulamentar que lhe é imanente, daí se avistando ofensa ao princípio da reserva da lei formal".

Apesar da derrota no Carf, ainda há esperança de a questão ser resolvida a favor dos contribuintes na esfera administrativa, segundo a tributarista Mary Elbe Queiroz, presidente do Instituto Pernambucano de Estudos Tributários. "O Carf tem sido um órgão de bom senso e julgado com bastante razoabilidade", avalia. Resta apenas a Câmara Superior de Recursos Fiscais, última instância do colegiado, para uma possível apelação, que ainda depende da publicação do acórdão contrário à Semp Toshiba.

Para Mary Elbe, o fato de a última decisão ter sido tomada com base em voto de qualidade mostra que ainda não existe entendimento pacífico ainda no Conselho. "A questão é apenas reconhecer que a IN, que deveria se limitar a regulamentar a lei, o que ela fez até certo ponto, avançou sobre o princípio da legalidade e aumentou as bases de cálculo."

Já para o advogado Eduardo Kiralyhegy, do escritório Negreiro, Medeiros e Kiralyhegy Advogados, esse é justamente o calcanhar de aquiles do debate no Conselho. Em sua opinião, embora o órgão venha se tornando um campo de discussões técnicas profundas, o que permite maiores chances de vitória, há limitações quantos aos argumentos usados. "Questões que remetam à inconstitucionalidade de normas dificilmente são julgadas no mérito, já que existe uma barreira regimental", diz. "A última palavra vai ficar para o Judiciário." Mas na Justiça, segundo ele, a expectativa é boa. "A violação ao princípio constitucional da legalidade é patente, e esse é o argumento mais forte", afirma
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ACÓRDÃO

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I - dos descontos incondicionais concedidos;
II - dos impostos e contribuições incidentes sobre as vendas;
III - das comissões e corretagens pagas;
IV - de margem de lucro de:
a) vinte por cento, na hipótese de revenda de bens, serviços ou direitos;
b) sessenta por cento, na hipótese de bens, serviços ou direitos importados aplicados na produção.
§ 1º Os preços de revenda, a serem considerados, serão os praticados pela própria empresa importadora, em operações de venda
a varejo e no atacado, com compradores, pessoas físicas ou jurídicas, que não sejam a ela vinculados.
§ 2º Os preços médios de aquisição e revenda serão ponderados em função das quantidades negociadas.
§ 3º Na determinação da média ponderada dos preços, serão computados os valores e as quantidades relativos aos estoques
existentes no início do período de apuração.
§ 4º Para efeito desse método, a média aritmética ponderada do preço será determinada computando-se as operações de revenda
praticadas desde a data da aquisição até a data do encerramento do período de apuração.
§ 5º Se as operações consideradas para determinação do preço médio contiverem vendas à vista e a prazo, os preços relativos a
estas últimas deverão ser escoimados dos juros neles incluídos, calculados à taxa praticada pela própria empresa, quando
comprovada a sua aplicação em todas as vendas a prazo, durante o prazo concedido para o pagamento.
§ 6º Na hipótese do § 5º, não sendo comprovada a aplicação consistente de uma taxa, o ajuste será efetuado com base na taxa:
I - referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic), para títulos federais, proporcionalizada para o intervalo,
quando comprador e vendedor forem domiciliados no Brasil;
II - Libor, para depósitos em dólares americanos pelo prazo de seis meses, acrescida de três por cento anuais a título de spread,
proporcionalizada para o intervalo, quando uma das partes for domiciliada no exterior.
§ 7º Para efeito deste artigo, serão considerados como:
I - incondicionais, os descontos concedidos que não dependam de eventos futuros, ou seja, os que forem concedidos no ato de
cada revenda e constar da respectiva nota fiscal;
II - impostos, contribuições e outros encargos cobrados pelo Poder Público, incidentes sobre vendas, aqueles integrantes do preço,
tais como ICMS, ISS, PIS/Pasep e Cofins;
III - comissões e corretagens, os valores pagos e os que constituírem obrigação a pagar, a esse título, relativamente às vendas
dos bens, serviços ou direitos objeto de análise.
§ 8º A margem de lucro a que se refere a alínea "a" do inciso IV do caput será aplicada sobre o preço de revenda, constante da
nota fiscal, excluídos, exclusivamente, os descontos incondicionais concedidos.
§ 9º O método do Preço de Revenda menos Lucro mediante a utilização da margem de lucro de vinte por cento somente será
aplicado nas hipóteses em que, no País, não haja agregação de valor ao custo dos bens, serviços ou direitos importados,
configurando, assim, simples processo de revenda dos mesmos bens, serviços ou direitos importados.
§ 10. O método de que trata a alínea "b" do inciso IV do caput será utilizado na hipótese de bens, serviços ou direitos importados
aplicados à produção.
§ 11. Na hipótese do § 10, o preço parâmetro dos bens, serviços ou direitos importados será apurado excluindo-se o valor
agregado no País e a margem de lucro de sessenta por cento, conforme metodologia a seguir:
I - preço líquido de venda: a média aritmética ponderada dos preços de venda do bem produzido, diminuídos dos descontos
incondicionais concedidos, dos impostos e contribuições sobre as vendas e das comissões e corretagens pagas;
II - percentual de participação dos bens, serviços ou direitos importados no custo total do bem produzido: a relação percentual
entre o valor do bem, serviço ou direito importado e o custo total do bem produzido, calculada em conformidade com a planilha de
custos da empresa;
III - participação dos bens, serviços ou direitos importados no preço de venda do bem produzido: a aplicação do percentual de
participação do bem, serviço ou direito importado no custo total, apurado conforme o inciso II, sobre o preço líquido de venda
calculado de acordo com o inciso I;
IV - margem de lucro: a aplicação do percentual de sessenta por cento sobre a " participação do bem, serviço ou direito importado
no preço de venda do bem produzido", calculado de acordo com o inciso III;
V - preço parâmetro: a diferença entre o valor da "participação do bem, serviço ou direito importado no preço de venda do bem
produzido" , calculado conforme o inciso III, e a margem de lucro de sessenta por cento, calculada de acordo com o inciso IV.
(grifamos e realçamos)
Colho das informações prestadas pelo titular da DEINF, uma das autoridades impetradas (fls. 158/163):
"Essa sistemática de cálculo criada pela regulamentação administrativa supracitada dispunha em seu art. 12, parágrafo 11, inciso
II, da IN SRF 32/01, sobre a margem de 60% textualmente:
§ 11. Na hipótese do parágrafo anterior, o preço a ser utilizado como de comparação será a diferença entre o preço líquido de
venda e a margem de lucro de sessenta por cento, considerando-se para este fim:
I - preço líquido de venda: a média aritmética ponderada dos preços de venda do bem produzido, diminuídos dos descontos
incondicionais concedidos, dos impostos e contribuições sobre as vendas e das comissões e corretagens pagas;
.................................................
II - margem de lucro, o resultado da aplicação do percentual de sessenta por cento sobre a média aritmética dos preços de venda
do bem produzido, diminuídos dos descontos incondicionais concedidos, dos impostos e contribuições sobre as vendas, das
comissões e corretagens pagas e do valor agregado ao bem produzido no País."
É fundamental para o deslinde da questão perceber que a forma de cálculo pretendida pela impetrante, baseada na margem de
lucro de 60% sobre o valor do preço líquido de venda do produto fabricado, foi estabelecida administrativamente pela SRF e é
procedimento distinto do que foi determinado no texto da lei, ou seja, margem de 60% do preço líquido de revenda da
mercadoria ou insumo importado.
Posteriormente esta divergência entre o art. 18 da Lei nº 9.430/96 e o art. 12 da IN SRF 32/01 foi devidamente superada com a
promulgação da IN SRF 243/02, a qual apresentou a seguinte redação em seu art. 12:
"Art. 12. A determinação do custo de bens, serviços ou direitos, adquiridos no exterior, dedutível da determinação do lucro real e
da base de cálculo da CSLL, poderá, também, ser efetuada pelo método do Preço de Revenda menos Lucro (PRL), definido como
a média aritmética ponderada dos preços de revenda dos bens, serviços ou direitos, diminuídos:
I - dos descontos incondicionais concedidos;
II - dos impostos e contribuições incidentes sobre as vendas;
III - das comissões e corretagens pagas;
IV - de margem de lucro de:
a) vinte por cento, na hipótese de revenda de bens, serviços ou direitos;
b) sessenta por cento, na hipótese de bens, serviços ou direitos importados aplicados na produção.
§ 1º Os preços de revenda, a serem considerados, serão os praticados pela própria empresa importadora, em operações de venda
a varejo e no atacado, com compradores, pessoas físicas ou jurídicas, que não sejam a ela vinculados.
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§ 2º Os preços médios de aquisição e revenda serão ponderados em função das quantidades negociadas.
§ 3º Na determinação da média ponderada dos preços, serão computados os valores e as quantidades relativos aos estoques
existentes no início do período de apuração.
§ 4º Para efeito desse método, a média aritmética ponderada do preço será determinada computando-se as operações de revenda
praticadas desde a data da aquisição até a data do encerramento do período de apuração.
§ 5º Se as operações consideradas para determinação do preço médio contiverem vendas à vista e a prazo, os preços relativos a
estas últimas deverão ser escoimados dos juros neles incluídos, calculados à taxa praticada pela própria empresa, quando
comprovada a sua aplicação em todas as vendas a prazo, durante o prazo concedido para o pagamento.
§ 6º Na hipótese do § 5º, não sendo comprovada a aplicação consistente de uma taxa, o ajuste será efetuado com base na taxa:
I - referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic), para títulos federais, proporcionalizada para o intervalo,
quando comprador e vendedor forem domiciliados no Brasil;
II - Libor, para depósitos em dólares americanos pelo prazo de seis meses, acrescida de três por cento anuais a título de spread,
proporcionalizada para o intervalo, quando uma das partes for domiciliada no exterior.
§ 7º Para efeito deste artigo, serão considerados como:
I - incondicionais, os descontos concedidos que não dependam de eventos futuros, ou seja, os que forem concedidos no ato de
cada revenda e constar da respectiva nota fiscal;
II - impostos, contribuições e outros encargos cobrados pelo Poder Público, incidentes sobre vendas, aqueles integrantes do preço,
tais como ICMS, ISS, PIS/Pasep e Cofins;
III - comissões e corretagens, os valores pagos e os que constituírem obrigação a pagar, a esse título, relativamente às vendas
dos bens, serviços ou direitos objeto de análise.
§ 8º A margem de lucro a que se refere a alínea "a" do inciso IV do caput será aplicada sobre o preço de revenda, constante da
nota fiscal, excluídos, exclusivamente, os descontos incondicionais concedidos.
§ 9º O método do Preço de Revenda menos Lucro mediante a utilização da margem de lucro de vinte por cento somente será
aplicado nas hipóteses em que, no País, não haja agregação de valor ao custo dos bens, serviços ou direitos importados,
configurando, assim, simples processo de revenda dos mesmos bens, serviços ou direitos importados.
§ 10. O método de que trata a alínea "b" do inciso IV do caput será utilizado na hipótese de bens, serviços ou direitos
importados aplicados à produção.
§ 11. Na hipótese do § 10, o preço parâmetro dos bens, serviços ou direitos importados será apurado excluindo-se o valor
agregado no País e a margem de lucro de sessenta por cento, conforme metodologia a seguir:
I - preço líquido de venda: a média aritmética ponderada dos preços de venda do bem produzido, diminuídos dos descontos
incondicionais concedidos, dos impostos e contribuições sobre as vendas e das comissões e corretagens pagas;
II - percentual de participação dos bens, serviços ou direitos importados no custo total do bem produzido: a relação percentual
entre o valor do bem, serviço ou direito importado e o custo total do bem produzido, calculada em conformidade com a planilha de
custos da empresa;
III - participação dos bens, serviços ou direitos importados no preço de venda do bem produzido: a aplicação do percentual de
participação do bem, serviço ou direito importado no custo total, apurado conforme o inciso II, sobre o preço líquido de venda
calculado de acordo com o inciso I;
IV - margem de lucro: a aplicação do percentual de sessenta por cento sobre a "participação do bem, serviço ou direito importado
no preço de venda do bem produzido", calculado de acordo com o inciso III;
V - preço parâmetro: a diferença entre o valor da "participação do bem, serviço ou direito importado no preço de venda do bem
produzido", calculado conforme o inciso III, e a margem de lucro de sessenta por cento, calculada de acordo com o inciso IV."
Trata-se de uma sistemática de cálculo dos preços e margens fundamentada no valor de revenda dos bens importados, conforme
o exigido pela lei. Com o advento do art. 12 da IN 243/02, a regulamentação administrativa da SRF deixou de ir além do disposto
na lei, como cabe a uma boa norma secundária.
Enfim, trata-se de um retorno da regulamentação administrativa do PRL aos termos de sua matriz legal. Os cálculos apresentados
pelo contribuinte apenas demonstram a gravidade do entendimento anterior equivocado adotado no artigo 12 da IN SRF 32.
Também não é exato o pensamento da impetrante segundo o qual a IN 243/02 descura ao Princípio da Legalidade quando do
cálculo do IRPJ e da CSSL, pois se trata do correto cumprimento da legislação em vigor e não de majoração tributária.
Finalmente, quanto à questão da suposta não observância do princípio at arms lenght pela nossa legislação interna, temos que os
pontos em que a legislação brasileira diverge do Modelo de Convenção da OCDE não são de monta a caracterizar uma
inobservância do princípio dos preços independentes comparados. Aliás, pelo exame individualizado de cada um dos métodos de
determinação do preço parâmetro adotados pela legislação brasileira pode-se identificar o princípio dos preços independentes
comparados em todos eles. A margem de lucro preestabelecida existente em alguns dos métodos adotados no Brasil (PRL20%,
PRL60%, CPL, PVA, PVV e CAP) não prevalece nunca sobre as margens at arms lenght praticadas no mercado por força do
disposto no parágrafo 2º do artigo 21 da lei 9430/96. Existe sempre a prevalência da margem de mercado sobre as margens
preestabelecidas, desde que o contribuinte as comprove nos termos da lei.
Tanto o artigo 9º do Modelo de Convenção quanto a Lei 9430/96 só permitem a realização de ajustes de preço de transferência
quando exista um nexo de causalidade entre um preço de favor para a empresa vinculada imputável a relação de vinculação."
Observa-se, em resumo, desta exposição, que o objetivo da instrução normativa foi o de corrigir distorção da anterior,
na medida em que a legislação de regência determina seja expungido do preço do custo a ser invertido na apuração
do lucro real (IRPJ) e de dedução da base dimensível da CSSL, o valor agregado no País (Lei nº 9.430/96: art. 18, inc II,
alínea "d", item 1).
Daí o porque da divergência, de vez que a normativa anterior continha apenas dois incisos no seu art.12 § 11 (preço
líquido de venda, calculado a partir da média aritmética dos preços de venda ... e margem de lucro a resultar da
aplicação de 60% sobre sobre a média aritmética dos preços de venda, diminuídos ... e do valor agregado ao bem no
País) ao passo em que a atual normativa deixou de lançar referência a apuração de preço líquido de venda para adotar
o preço parâmetro dos bens, inserindo mais três incisos (percentual de participação dos bens ... no custo total do bem
produzido; participação dos bens ... no preço de venda do bem produzido; e preço parâmetro como sendo a diferença entre o
valor da 'participação do bem ...no preço de venda do bem produzido - inciso III - e a margem de lucro de sessenta por cento -
inciso IV).
Segundo se pode depreender do relato da mencionada autoridade impetrada a fórmula anterior não era suscetível de
expungir do valor final do custo a ser abatido, parcela de preço do produto final, que então não se destacava do
resultado propiciando dedução acima daquela permitida pelo legislador.
Ou seja, na fabricação do produto final, pode ocorrer a utilização itens importados e de bens nacionais, cada qual com
seu custo próprio. O preço final deste produto, contudo, não é composto apenas pela soma dos custos individuais
daqueles insumos, sendo incorporada a parcela atinente ao lucro empresarial, considerados os demais custos
incorridos na linha de produção, mão de obra, tributos, etc.
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É linguagem comezinha dos meios econômicos que a exportação de matéria prima deve ser preterida em favor dos
produtos finais com ela elaborados (suco de laranja ao invés da própria fruta, por exemplo), dado que aí agrega-se
valor no produto.
Isto ocorre de um modo geral na economia. Atingido o produto final (ou mesmo um semi-elaborado), agrega-se valor
ao mesmo. Pois bem, o produto final composto pelos itens importados, tem parcela de valor agregado, cujos efeitos o
legislador mandou expungir no caso de operações envolvendo empresas vinculadas.
E parcela deste valor agregado, segundo a autoridade impetrada, não era excluída do custo final a ser deduzido na
CSSL e no lucro real (IRPJ) pelo balizamento da INSRF 32.
Daí porque com a atual INSRF 243 buscou-se um aperfeiçoamento incluindo na metodologia do cálculo, etapas
destinadas a refletir com maior fidelidade, o resultado final daquele custo a ser abatido, o que se alcança mediante a
apuração percentual do item importado na composição inicial do custo do produto acabado (inciso II), o qual, aplicado
ao preço líquido de venda (inciso I - já existente na instrução anterior), permite chegar a sua participação percentual
no preço final do produto (inciso III). Em passo seguinte apura-se a margem de lucro (inciso IV) mediante aplicação
do percentual de 60% sobre a participação do bem ... importado no preço de venda do bem produzido - calculado nos
termos do inciso III a ser utilizado na apuração do preço parâmetro, a resultar da diferença entre o apurado nos
incisos III e IV.
Verifica-se ainda dos art's. 32 a 34 da IN-SRF-243, disposições voltadas a dar operacionalidade aos comandos
emergentes do art. 21 § 2º da Lei nº 9430/96, que também já estavam contemplados na Portaria MF-95 de
30.04.1997, arcabouço este que atentou para a necessidade de observância e cumprimento do Modelo de Convenção
da OCDE, em seu art. 9º, de sorte a compatibilizar-se com o princípio at arms lenght.
Acerca deste princípio e da adoção do método Preço de Revenda menos Lucro (PRL) pelo legislador, no tocante a
dedução de custos na apuração do lucro real (IRPJ) e da base dimensível da CSSL, cumpre destacar que a providência
é contemporânea a adoção do chamado Método de Equivalência Patrimonial, pela Medida Provisória nº 2.158-36 (art's
21 e. 74), já consagrado no tocante a apuração do lucro societário, desde a vigência da Lei 6.404/76, ao qual passou
então a ser conferido efeitos tributários, também na órbita destas exigências (IRPJ e CSSL).
Tivemos o ensejo de relatar tal inovação legislativa no voto proferido por ocasião do julgamento da AMS 291.885
(Proc. 2005.61.00.003525-6) em 11.12.2008 por esta Turma, consignando então que a exposição de motivos da
medida provisória citada, esclarecia que tais alterações legislativas tiveram o escopo de por termo a práticas de
planejamento tributário adotadas com vistas a evitar ou postergar a incidência do imposto de renda no País, mediante
operações artificiais ou desnecessárias. Concomitante a referida providência, seguiu-se também a LC. 104/2001,
introdutora de disposições nos art's. 43 a 45 do Código Tributário Nacional.
Este universo de considerações interliga-se com as inovações controvertidas nestes autos, na medida em que a
exposição de motivos do projeto que veio a transformar-se na Lei nº 9.430/96, consignava já em 1996 que as normas
contidas nos art's. 18 a 24 representam significativo avanço da legislação nacional face ao ingente processo de
globalização experimentado pelas economias contemporâneas, possibilitando o mecanismo ora em exame o controle
dos denominados 'preços de transferência' de forma a evitar a prática, lesiva aos interesses nacionais, de
transferência de recursos para o Exterior, mediante a manipulação dos preços pactuados nas importações ou
exportações de bens, serviços ou direitos, em operações com pessoas vinculadas, residentes ou domiciliadas no
exterior, conforme averba a inicial no terceiro parágrafo de fls. 05 destes autos.
Bem por isso, não se poderia dar prevalência aos argumentos tangidos em prol dos malefícios que a IN-SRF 243
estaria substanciando em desfavor da indústria nacional, na medida em que as atividades de transformação estariam
a receber tratamento desfavorável em relação aos importadores que se limitam a revenda dos itens importados sem
qualquer agregação de valor.
De fato, como visto o foco do legislador foi o de exatamente coibir abusos na chamada transferência de preços (para
o exterior) entre empresas nacionais ditas vinculadas as fornecedoras do exterior (não raras vezes, ostentando a
mesma denominação social), donde restar conciliada as alterações do referido normativo, vez que orientadas a busca
efetiva do custo a ser deduzido na base dimensível da CSSL, mediante neutralização dos efeitos que a mais valia
destes produtos finais, refletida na parcela composta pelos insumos importados e que até então não se
desagregavam do resultado final a ser deduzido, o que certamente contribuiu para aperfeiçoar o mecanismo fiscal
imposto pelo legislador com a edição da Lei nº 9.430/96.
Prosseguindo por esta senda, cabe rememorar o que se verificou na órbita do IPI onde o estudo mais acurado dos
métodos de abatimento existentes, sobretudo no continente europeu, propiciaram uma verdadeira abertura de
horizontes a culminar na estabilização do princípio constitucional da incumulatividade em seu verdadeiro patamar, pois
se tratava do mais obsoleto dos métodos praticados naquele continente. De sorte que o estudo acerca da matéria
inerente a transferência de preços, objeto de ingente literatura internacional e que, por evidente, consta no rol dos
estudos das ciências contábeis e ou econômicas de nossas universidades trará contributo para o enfrentamento destas
questões.
Breve consulta ao sítio da Google, na rede mundial de computadores, permitem o acesso a trabalhos desta natureza,
citando-se o Manual dos Preços de Transferência no Brasil, editado em comemoração aos dez anos de vigência da Lei
nº 9.430/96, pela editora MP , sob a coordenação de Alexandre Siciliano Borges e outros dois e mais dezoito
articulistas; trabalho intitulado Entendendo a Utilização do PRL no cálculo do Preço de Transferência na Importação, de
autoria de Luciana Gavazzi Barragan e Évelin Rodrigues Pereira, consignando-se no item 4 desta abordagem uma
comparação entre a Similaridade, que foi o método escolhido pelo legislador brasile iro (o que podemos confirmar no
âmbito do art. 28 dos normativos em vigor) e o Princípio da Neutralidade, também conhecido como Princípio do Preço
sem Interferência, pois toma como base a comparabilidade entre as transações e não a similaridade dos bens,
utilizado pela legislação brasile ira, aplicado pelos americanos desde 1929, quando o assunto começou a ser versado
naqueles quadrantes; e por fim a abordagem Preços de Transferência: Comentários à Lei nº 9.430/96, de autoria de
Vicento Rosseto, onde o autor consigna que aquela abordagem, nas plagas americanas, tinha por escopo provável
uma resposta às práticas empresariais que tivessem por objetivo a redução da renda tributável.
Lembra ainda o articulista da disseminação destas práticas em outros países industrializados, levando governos
europeus a adotarem medidas semelhantes. Entretanto o assunto somente despertou o interesse das autoridades
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fiscais no início da década (de 90, acreditamos, pois a publicação ocorreu no caderno de estudos da FIPECAFI de
janeiro/abril/1998, o que está consentâneao com a positivação das normas respectivas na Lei nº 9.430, que é de
1996), em decorrência da aceleração do processo de globalização da economia, em particular com a formação dos
blocos econômicos MCE, NAFTA, Mercosul e o término da Rodada Uruguai de negociações no âmbito do GATT,
registrando que a providência legislativa objetivara o futuro ingresso brasile iro na OECD, como evidencia a exposição
de motivos da Lei nº 9.430/96.
É importante registrar que o autor consigna uma certa flexibilidade quanto a observância do Princípio Arm's Lenght ,
inclusive porque a legislação passou a oferecer a possibilidade de celebração de Acordos de Preços Pré-estabelecidos,
evoluindo também para a alternativa dos denominados Profit Methods, contemplados pela OECD . Aqui o autor,
certamente, reportava-se ao âmbito da previsão contida no citado art. 21 § 2º da citada Lei nº 9.430/96, objeto
também da Portaria MF-95/97 e art's. 32 e seguintes da IN-SRF 243. Somando-se esta flexibilidade para acordos, à
utilização do método da similaridade, em oposição ao da neutralidade, não fisca dificil concluir que, a exemplo do IPI,
os efeitos registrados pelos contribuintes levariam mesmo a contestações como a adotada no bojo desta ação.
Contudo, não se avista, ao menos com a carga plena necessária a comprovação do direito líquido e certo, por meio de
documentos evidenciadores da ilegalidade proclamada, cometimentos de abusos na singela edição do normativo
combatido pela impetrante, certo que as planilhas por ela carreadas não ostentam esta condição, inclusive ante a
unilateralidade de que se revestem a demandar prova pericial inconcebível nesta seara mandamental.
Ademais a norma, ante seu caráter de generalidade, teria de prejudicar a todos e não somente a este ou aquele
contribuinte, pois a ciência humana ainda não conseguiu o divino dom de impor mandamentos que contemplem a
todos os interessados na matéria por eles, disciplinadas.
E
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