Justiça ameaça limitar poder do BC
O ESTADO DE S. PAULO - ECONOMIA
O trabalho do Banco Central de fiscalização de instituições financeiras e de seus dirigentes pode se transformar em mera auditoria contábil por causa de uma decisão tomada na última sexta-feira pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF). Por 3 votos a 2, os ministros da turma decidiriam que o BC só pode quebrar sigilo bancário com autorização judicial.
Não se deve confundir o poder de fiscalização atribuído ao Banco Central, com o poder de violar o sigilo bancário, que é norma de ordem pública, afirma o ministro-relator, Marco Aurélio de Mello. A decisão foi tomada durante o julgamento de um recurso apresentado pelo BC contra uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ,) que não autorizou a quebra do sigilo bancário do ex-dirigente do Banco Estadual do Mato Grosso (Bemat), José Longo de Araújo.
Os ministros Carlos Ayres Britto e Sepúlveda Pertence divergiram do voto do relator. Para Britto, a Constituição abre ao BC a possibilidade de saber a movimentação bancária dos dirigentes de bancos estatais e das instituições financeiras públicas e privadas. Receio que esta interpretação que foi dada empobreça a funcionalidade do artigo 192 da Constituição e reduza a força do Banco Central para sanear eticamente o setor, disse ao Estado. Na opinião de Britto, a discussão não envolve o cidadão comum, mas o agente público que atua no âmbito do sistema financeiro.
Embora o julgamento do colegiado do Supremo seja especificamente para o caso do Mato Grosso, ele abre uma jurisprudência (definição em lei) para outros casos e para a atuação futura da autoridade monetária. O Banco Central informou que, após a publicação da decisão no Diário de Justiça, deve recorrer para levar a discussão ao plenário do STF, que é composto por 11 ministros.
No recurso apresentado ao Supremo, o BC argumenta que ao não autorizar o acesso aos dados bancários, o STJ limitou o Banco Central na sua atuação legítima como órgão fiscalizador e defensor do sistema financeiro e da coletividade. Segundo a defesa da procuradoria da instituição, impedir as atividades fiscalizadoras do Banco Central em nome do sigilo bancário implica sobrepor o interesse privado ao público e acobertar práticas ilícitas.
Para o ministro Marco Aurélio, o Banco Central confunde o poder de fiscalização com a quebra de sigilo de dados. Citando o artigo 5º da Constituição Federal, ele afirma que a quebra só pode ocorrer com autorização judicial em casos de investigação criminal e instrução de processo penal. O sigilo bancário, na sua opinião, deve ser a regra para preservar a intimidade das pessoas.
Atualmente, o Banco Central, como órgão supervisor do sistema financeiro, tem acesso a informações sobre operações ativas e passivas das instituições financeiras públicas ou privadas.
Renata Veríssimo
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