Estados e empresas são contra edição de súmula
23 de maio de 2012
Nunca uma proposta de súmula vinculante mobilizou tanto a sociedade quanto o texto elaborado sobre guerra fiscal pelo ministro Gilmar Mendes. O Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu cerca de 80 manifestações de 12 Estados, entidades empresariais e de trabalhadores, além de empresas. A maioria dos Estados é contrária à aprovação do texto, que prescreve dentre outros pontos a inconstitucionalidade de qualquer isenção, incentivo ou redução de alíquota de ICMS não aprovada pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). As únicas exceções são os Estados de São Paulo e do Amazonas favorável, mas com ressalvas à proposta. Foi a maior mobilização desde que foi criada a súmula vinculante, em 20043, diz Ariane Costa Guimarães, do Mattos Filho Advogados, um dos escritórios de advocacia que apresentaram manifestações contrárias ao texto.
O temor em relação a uma súmula está na possibilidade de os Estados serem obrigados a cobrar dos contribuintes o imposto que deixou de ser recolhido em razão dos benefícios fiscais. Essa é também uma preocupação de empresas, como Ipiranga, Renault e Red Bull do Brasil, que encaminharam petições ao Supremo. Além de se manifestarem contra a proposta, em um momento em que se discute a forma de atuação do Confaz no Congresso e na própria Corte (leia matéria ao lado), pedem que, caso ocorra a aprovação, a norma seja modulada e atinja apenas incentivos que venham a ser concedidos após a sua publicação.
Em sua manifestação, a Renault, por exemplo, que está instalada no Estado do Paraná desde a década de 90, argumenta que a proposta não teria condições técnicas para ser aprovada e demonstra preocupação em relação aos benefícios obtidos por meio de leis nos anos de 1992 e 1996. A companhia argumenta que os incentivos do Estado não representam favor, nem são abusivos, mas sim instrumento para tornar possível a implantação do projeto industrial no Estado. Por meio de gráfico, a montadora demonstra a evolução positiva de arrecadação do ICMS no Estado, desde a instalação da unidade em São José dos Pinhais.
No documento, a montadora reforça a necessidade de o Supremo assegurar os benefícios concedidos antes da edição de possível súmula, em homenagem ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito. Já a Ipiranga afirma que a aprovação do texto sem modulação estimula que os Estados cobrem, de seus contribuintes, imposto que não era devido em função de suas próprias leis e cujo custo esses contribuintes não tiveram a oportunidade de repassar a seus consumidores. Acabaria punindo quem cumpre com suas obrigações, acrescenta o diretor jurídico da distribuidora, Guido Silveira.
Renault e Red Bull ainda mostram preocupação com os efeitos sociais da eventual retroatividade da súmula. A consequência seria a ampliação do desemprego. A empresa quando celebra um acordo acredita na lei aprovada na assembleia ou no decreto assinado pelo governador, diz o advogado Marcelo Malaquias, sócio do Pinheiro Neto Advogados, para quem a súmula seria precipitada em razão dos projetos de lei discutidos hoje no Congresso e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) sobre o Confaz que tramita no Supremo.
O procurador-Geral do Estado de São Paulo, Elival da Silva Ramos, defende, porém, a aprovação da súmula. Segundo ele, São Paulo é o maior prejudicado pela guerra fiscal. A proposta é uma tentativa de o Supremo reduzir a guerra fiscal entre os Estados. Ainda que o texto não seja aprovado [súmula], acredito que a concessão de liminares contra esses incentivos será muito mais rápida pelo Supremo e os Estados terão que mudar suas estratégias, afirma.
A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) também defende, em manifestação, a aprovação da súmula e pede que seja aperfeiçoada, com a inclusão da hipótese de concessão de incentivos financeiros. A entidade, porém, pede a modulação de seus efeitos, de modo a preservar a estabilidade das relações jurídicas entre o poder público e os contribuintes de boa-fé. Se for retroativa, será um desastre, diz o vice-presidente do Conselho Superior de Assuntos Jurídicos, Helcio Honda.
Goiás é um dos Estados que mais concedem incentivos. Há cerca de 25 em vigor. O número de postos de trabalho gerados também é um dos maiores. Apenas com o Produzir, programa de incentivo à indústria instituído em 2001, foram criados 863,6 mil empregos diretos e indiretos. Esse programa e outro, batizado de Fomentar são questionados por meio de ações ajuizadas pelo Estado de São Paulo.
Arthur Rosa, Bárbara Pombo e Zínia Baeta, Valor Econômico
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