Nota Fiscal de produto agrícola é prova hábil para restituição do Funrural
26 de junho de 2012
A Turma Regional de Uniformização (TRU) dos Juizados Especiais Federais (JEFs) da 4ª Região decidiu, em julgamento realizado na última semana em Porto Alegre, que as notas fiscais de comercialização da produção agrícola são documentos hábeis a instruir a ação de repetição de indébito proposta pelo produtor rural, contribuinte do Funrural.
O autor ajuizou a ação após a 3ª Turma Recursal do Paraná ter mantido sentença que julgou extinto o processo sob o argumento de que não foram apresentadas guias de recolhimento do tributo, que, segundo a decisão, seriam indispensáveis como prova.
O contribuinte ajuizou então incidente de uniformização alegando que as 1ª e 2ª TRs do mesmo Estado, decidiam de forma diferente, com precedentes que dispensam a comprovação do pagamento indevido mediante guias de recolhimento do tributo, sendo possível a demonstração mediante notas fiscais de comercialização.
Após analisar o incidente de uniformização, a relatora do processo, juíza federal Ana Beatriz Vieira da Luz Palumbo, teve entendimento favorável ao autor. Segundo ela, a responsabilidade pelo recolhimento da contribuição para o Funrural é da empresa adquirente, consumidora ou consignatária na produção, situação conhecida como substituição tributária.
O produtor não possui guias de recolhimento de contribuição, tendo em vista que o repasse de valores ao fisco é efetuado por terceiro. Assim, pouco razoável exigir que o agricultor, a fim de ajuizar ação de repetição de indébito, diligencie junto a todos os adquirentes de seus produtos para verificar se houve o efetivo recolhimento dos tributos e de obter cópia das respectivas guias, argumentou a magistrada.
Dessa forma, a sentença foi anulada e deverá haver novo processamento de acordo com a decisão uniformizada pela TRU.
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INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO JEF Nº 5003048-44.2012.404.7005/PR
RELATOR : ANA BEATRIZ VIEIRA DA LUZ PALUMBO
RECORRENTE : MARINO BAZZOTTI
ADVOGADO : EDUARDO OLEINIK
: DORALICE FAGUNDES DOS SANTOS MARCHIORO
RECORRIDO : UNIÃO - FAZENDA NACIONAL
MPF : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
EMENTA
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO. TRIBUTÁRIO. FUNRURAL. NOTA FISCAL. DOCUMENTO HÁBIL PARA COMPROVAÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO.
1) As notas fiscais de comercialização da produção agrícola são documentos hábeis a instruir a ação de repetição do indébito proposta pelo produtor rural, contribuinte do FUNRURAL.
2) Pedido de uniformização conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional De Uniformização do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, CONHECER E DAR PROVIMENTO AO PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 21 de junho de 2012.
Ana Beatriz Vieira da Luz Palumbo
Relatora
INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO JEF Nº 5003048-44.2012.404.7005/PR
RELATOR : ANA BEATRIZ VIEIRA DA LUZ PALUMBO
RECORRENTE : MARINO BAZZOTTI
ADVOGADO : EDUARDO OLEINIK
: DORALICE FAGUNDES DOS SANTOS MARCHIORO
RECORRIDO : UNIÃO - FAZENDA NACIONAL
MPF : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RELATÓRIO
Trata-se de pedido de uniformização regional interposto pela parte autora, com base no art. 14, § 1º, da Lei nº 10.259/2001, contra acórdão proferido pela 3ª Turma Recursal do Paraná, alegando divergência de entendimento em relação às 1a e 2a Turmas Recursais do mesmo Estado.
Com a presente ação, o autor visava a restituição dos valores retidos a título de contribuição ao FUNRURAL incidente sobre a comercialização de produto agrícola.
O acórdão proferido pela 3a Turma Recursal do Paraná manteve integralmente sentença que julgou o feito extinto sem julgamento do mérito, ao argumento de que não foram apresentadas guias de recolhimento do tributo, as quais foram reputadas indispensáveis para o ajuizamento da demanda.
Sobreveio então pedido de uniformização, no qual a parte autora sustenta que a 1a e a 2a Turmas Recursais do Paraná, em consonância com a jurisprudência do TRF4, possuem precedentes que dispensam a comprovação do pagamento indevido mediante guias de recolhimento do tributo, sendo possível a demonstração mediante apresentação das notas fiscais de comercialização.
A Presidência da 2a Turma Recursal do Paraná admitiu o incidente.
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo conhecimento e provimento do pedido de uniformização.
É o relatório.
VOTO
- Admissibilidade
Cumpre salientar que o pedido de uniformização foi interposto tempestivamente.
A divergência está demonstrada, tendo em vista que a 3a Turma Recursal do Paraná, no acórdão paradigma, decidiu que a guia de recolhimento é documento imprescindível para ajuizamento da ação de repetição de indébito, enquanto a 1a e 2a Turmas Recursais da mesma Seção Judiciária admitem a comprovação por intermédio de outros meios, em especial notas fiscais de comercialização de produtos agrícolas (201070550017405, 1a TR/PR, Rel. Juíza Márcia Vogel Vidal de Oliveira, D.J. 17.08.2011; 201070550017211, 2a TR/PR, Rel. Andréia Castro Dias, D.J. ).
A matéria está devidamente prequestionada.
Assim, o pedido de uniformização deve ser conhecido, nos termos do artigo 14, §1º, da Lei n. 10.259/2001.
- Mérito
Quanto ao mérito, assiste razão ao recorrente.
O sujeito passivo tributário da contribuição para o FUNRURAL (incidente sobre a comercialização de produto agrícola) é o produtor. Mas a responsabilidade pelo recolhimento é da empresa adquirente, consumidora ou consignatária da produção (art. 30, inc. III e IV da Lei 8212/91). Trata-se, portanto, do fenômeno da substituição tributária.
Disso se extrai que o sujeito passivo tributário (produtor) não possui guias de recolhimento da contribuição, tendo em vista que o repasse dos valores ao fisco é efetuado por terceiro. Assim, pouco razoável exigir que o agricultor, a fim de ajuizar ação de repetição de indébito, diligencie junto a todos os adquirentes de seus produtos para verificar se houve o efetivo recolhimento dos tributos e de obter a cópia das respectivas guias. A ele basta demonstrar a existência do fato gerador e o desconto feito pelo substituto tributário responsável pelo recolhimento. Assim vem decidindo o Tribunal Regional Federal da 4a Região:
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. FUNRURAL. OBRIGATORIEDADE DO RECOLHIMENTO À EMPRESA ADQUIRENTE DOS PRODUTOS. NOTA FISCAL. DOCUMENTO HÁBIL PARA COMPROVAÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. VALOR DA CAUSA. 1. A Lei nº 8.212/91 é clara ao atribuir a obrigatoriedade do recolhimento da contribuição previdenciária para o FUNRURAL à empresa adquirente dos produtos. 2. É inviável a determinação da juntada de guias de recolhimento, na medida em que a comprovação do desconto está posta na nota de venda e não nas guias recolhidas. Deste modo, as notas fiscais de comercialização da produção agrícola são documento hábil a instruir a repetição do indébito proposta pelo produtor rural, contribuinte do FUNRURAL. 3. O valor da causa é requisito essencial da petição inicial, tendo como critérios para sua atribuição aqueles indicados nos incisos do art. 259 do estatuto processual civil. Mesmo sendo o pedido da parte genérico, o valor da causa pode ser calculado sobre o montante aproximado que deixaria o agravante de recolher na hipótese de procedência total da ação. 4. Agravo de instrumento parcialmente provido. (TRF4, AG 5010230-81.2011.404.0000, Segunda Turma, Relator p/ Acórdão Otávio Roberto Pamplona, DJ 2/12/2011)
TRIBUTÁRIO e PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. FUNRURAL. APRESENTAÇÃO DAS GUIAS DE RECOLHIMENTO À PREVIDÊNCIA SOCIAL. VALOR DA CAUSA. DESNECESSIDADE. NOTAS FISCAIS. DOCUMENTOS SUFICIENTES PARA INSTRUIR A AÇÃO. FASE DECLARATÓRIA. 1. O único documento à disposição do empregador rural, a comprovar o desconto do encargo na venda de produtos, é a nota fiscal. 2. As notas fiscais de comercialização da produção agrícola configuram-se como meio hábil a instruir a repetição do indébito. 3. Quando a fase é eminentemente declaratória do direito postulado, mostra-se despicienda a juntada de todas as contra-notas fiscais, bem como do memorial de cálculo para aferição do valor da causa, diligências que somente serão indispensáveis quando da fase de liquidação de sentença. (TRF4, AG 5002699-41.2011.404.0000, Segunda Turma, Relatora p/ Acórdão Carla Evelise Justino Hendges, D.E. 13/04/2011)
Desta feita, entendo que deve prevalecer o entendimento adotado pela 1a Turma Recursal do Paraná, o qual transcrevo a fim de integrar a fundamentação do presente julgado:
O juízo a quo entende que as ações em que se pleiteia a restituição do FUNRURAL devem ser instruídas com as guias do recolhimento. Isso porque, caso os valores não tenham sido transferidos à União, esta não terá legitimidade passiva para figurar no feito; nesse caso, o direito 'deve ser alegado em face daquele que descontou e não recolheu as contribuições.' A parte autora juntou somente notas fiscais.
Todavia, ainda que a União não tenha recebido os valores que as notas fiscais demonstram que o autor pagou a título de FUNRURAL, subsistirá a sua legitimidade para figurar no pólo passivo da demanda, pois foi o ente que instituiu o tributo, estabelecendo as regras para o seu pagamento, as quais, ao que parece, a parte autora cumpriu.
A relação tributária entre o produtor rural pessoa física e a União se encerra no momento da comercialização do produto. A partir daí, a relação passa a ser com o arrecadador, e qualquer irregularidade não diz respeito ao contribuinte em questão. Exigir deste que traga aos autos prova de que a contribuição foi efetivamente recolhida equivale a lhe impor um ônus de fiscalização que não encontra previsão no ordenamento jurídico.
Em suma, o contribuinte do FUNRURAL paga, ainda que indiretamente, à União, e na forma estabelecida por esta. Se o pagamento não era devido, cabe a ela a responsabilidade para restituí-lo. E se não recebeu do arrecadador o valor eventualmente restituído, é porque falhou no seu poder-dever de fiscalização e cobrança, o que não pode repercutir em desfavor do contribuinte que agiu em conformidade com o que a lei lhe impôs.
Assim, desnecessária a juntada das guias de recolhimento para o ajuizamento de ação de repetição de indébito de FUNRURAL. As notas fiscais são prova suficiente da existência da relação tributária que se pretende reconhecer como indevida e do eventual dever de restituição. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região também já decidiu nesse sentido (AI 5004564-36.2010.404.0000/PR - Rel. Des. Fed. Luciane Amaral Corrêa Münch - Julgado em 14/08/2010).
Afastada a inépcia da inicial, impõe-se a anulação da sentença e o retorno dos autos à Origem para que seja proferida nova decisão.
Tendo em vista que o feito foi extinto sem julgamento do mérito no juízo de origem, a sentença deve ser anulada para que haja regular processamento de acordo com a premissa ora fixada.
Ante o exposto, voto por CONHECER E DAR PROVIMENTO AO PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO, a fim de que seja uniformizado o entendimento de que as notas fiscais de comercialização da produção agrícola são documentos hábeis a instruir a ação de repetição do indébito proposta pelo produtor rural, contribuinte do FUNRURAL.
Ana Beatriz Vieira da Luz Palumbo
Relatora
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Documento eletrônico assinado por Ana Beatriz Vieira da Luz Palumbo, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 5059977v4 e, se solicitado, do código CRC 4994C74B.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Ana Beatriz Vieira da Luz Palumbo
Data e Hora: 19/06/2012 16:57
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