22/01/2015
De novo, os velhos problemas do sistema tributário


De novo, os velhos problemas do sistema tributário

20 de janeiro de 2015

Tão familiares hoje, essas assertivas foram parte do diagnóstico feito há 50 anos pela comissão de especialistas que elaborou a emenda constitucional nº 18, de 1965, estruturando o sistema tributário ainda vigente no país.

Meio século depois, estão aí, recriados, os mesmos problemas que atormentavam os contribuintes naqueles tempos. No segundo mandato de Dilma Rousseff, recém-iniciado, as propostas de aumento dos impostos voltam a assombrar empresários e trabalhadores.

O livro com as conclusões da Comissão de Reforma Tributária – que funcionou entre 1963 e 1965 na Fundação Getúlio Vargas – estava esgotado e foi reeditado, em dezembro, pelo IBRE/FGV.

Organizado pelos economistas Fernando Rezende e José Roberto Afonso, o trabalho recebeu o título “50 anos da Reforma Tributária Nacional: origens e lições”.

O processo que culminou na reforma começou em 1963, antes do golpe militar, com a comissão que teve a ajuda de especialistas renomados, como o professor Carl Shoup, da Universidade Columbia, que também coordenou a revisão do código tributário japonês no pós-guerra.

O diagnóstico do modelo existente era categórico: tratava-se de um “não – sistema”. Havia mais tributos do que fatos geradores da arrecadação. Diferentes formatos jurídicos serviam para tributar um mesmo fato econômico, acarretando sobreposições de tributos idênticos. Era evidente a necessidade de deslocar o foco: organizar o sistema tributário em função das bases econômicas às quais cada tributo se associa, e não à sua natureza jurídica. Foi preciso abandonar o modelo de coexistência entre os regimes tributários autônomos – federal, estadual e municipal – e construir um sistema nacional.

A unificação marcou a repartição do poder de tributar. A delimitação foi clara: a parte relativa à produção era de direito da União (IPI) e à circulação de mercadorias, dos Estados (ICM). Aos municípios foi garantida participação na receita do imposto estadual (de 15%) e houve a adoção do Imposto Sobre Serviços. A tributação do valor adicionado foi um passo importante para superar a incidência em cascata que os impostos cumulativos geravam.

Eliminar a cumulatividade significa dar mais eficiência econômica aos tributos, na medida em que desonera exportações, investimentos e a produção em cadeias mais longas.

“O sistema tributário que emergiu da reforma foi de fundamental importância para alavancar o crescimento econômico e a industrialização do país”, salientam os autores.

Apesar de se atribuir um caráter centralizador à reforma de 1964, foi notável a execução de um moderno regime de transferência de receita entre os entes federados.

Nesse sentido, destaca-se a equalização fiscal e os fundos de participação – mantidos com 20% da receita do IPI e Imposto de Renda, sendo 60% entregues aos Estados e 20% aos municípios. Havia a preocupação de evitar que o imposto de exportação e o ICM funcionassem como armas de uma guerra tributária entre estados produtores e consumidores.

Tratou-se, portanto, de um novo modelo de federalismo fiscal, para remover os entraves às atividades interestaduais e intermunicipais.

Após a apuração das deficiências do sistema tributário então existente, o ministro da Fazenda, Octávio Gouvêa de Bulhões, detalhou os motivos da emenda constitucional nº 18, encaminhada à Presidência da República em novembro de 1965. Na exposição, ele destacou o entrave ao progresso desempenhado pela multiplicidade e a acumulação de incidências tributárias, que dificultavam e oneravam a produção.

Era urgente um reexame dos impostos, para implementar um sistema compatível com o progresso econômico do país.

O período era conturbado. Na economia, o país vivia uma desaceleração do crescimento, escalada da inflação e um quadro de crise fiscal, com desequilíbrios orçamentários, níveis elevados de endividamento público e ineficiência da gestão pública – que desembocou na lei 4.320/64, do Orçamento e Administração Pública.

A situação política era instável, coma renúncia de Jânio Quadros e a posse de João Goulart intercalada pelo parlamentarismo.

Se a atual conjuntura econômica e política é distinta da observada às vésperas do golpe militar, o mesmo não pode ser dito sobre as bases do debate tributário de 50 anos atrás em relação à agenda para o futuro. Para os autores, é preciso resgatar questões fundamentais, como a necessidade de reconstruir um sistema tributário nacional; executar a discriminação constitucional da tributação de rendas e formular um novo modelo de federalismo fiscal; reconhecer a limitação do texto constitucional.

José Roberto e Rezende sugerem, também, que se extraiam lições de equívocos cometidos na Constituição de 1988. “Com a redemocratização, tornou-se evidente a rejeição às políticas adotadas à época dos militares, desconhecendo- se alguns avanços institucionais aprovados no regime anterior”.

As mudanças pontuais feitas no Código Tributário Nacional desfiguraram o modelo oriundo da EC 18/65. As disputas federativas se intensificaram com a extinção dos impostos especiais e com o aumento do recurso às contribuições sociais – solução encontrada pela União para compensar as perdas de receita com a descentralização promovida pela Constituição de 88 – que também são responsáveis pela redução da eficiência econômica do sistema tributário. A busca incessante por novas receitas fez de impostos regulatórios fontes de arrecadação.

Da leitura da história da reforma de 65 fica a percepção de que passa da hora de o governo se empenhar para construir um novo sistema para o país.

A economia, a sociedade e o mundo mudaram muito e não faz sentido continuar cobrando impostos e contribuições de forma complexa, danosa à competitividade e socialmente regressiva.

A versão impressa do livro contém as conclusões da comissão.

Em meio digital, porém, o IBRE está disponibilizando em seu portal na internet o “fac símile” dos 21 volumes que compunham os anais da referida comissão.

Claudia Safatle
De Brasília
Valor Econômico

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