24/06/2016
O exagerado e ilegal preço das custas judiciais no Brasil

O exagerado e ilegal preço das custas judiciais no Brasil

20/06/2016

Por Raul Haidar

Não exagera o povo quando afirma que pobre não tem direito a Justiça. De fato! Qualquer pessoa física ou jurídica que enfrentar uma discussão judicial para fazer valer algum direito, pode ver-se impedida de fazê-lo, caso não disponha de recursos financeiros para isso.

Essa é a regra, ante os valores das custas judiciais que devem ser antecipadas em determinados casos, especialmente nos litígios tributários que se processam no Judiciário estadual.

Tal problema atinge pessoas físicas e jurídicas. A solução é tratá-lo mediante a adoção de um teto máximo, capaz de cobrir os custos dos serviços judiciais a serem prestados.

A chamada “taxa judiciária” cobrada na distribuição de uma ação judicial qualquer (cobrança, despejo, embargo, ação de anulação de débito fiscal etc.) é um tributo.

O artigo 77 do Código Tributário Nacional afirma:

“Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição”.

O artigo 79 considera como serviços públicos utilizados efetivamente pelo contribuinte os que são usufruídos, específicos e divisíveis. Como a Justiça Estadual é atribuição dos Estados e do Distrito Federal, esses são os entes federativos que cobram essas taxas.

O Código Tributário Nacional no artigo 16 afirma que os impostos são cobrados sem que haja uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte. Justamente isso é que os difere das taxas, cujo fato gerador é exatamente a prestação dos serviços utilizados efetivamente pelo contribuinte e prestados pelo Poder Judiciário.

Acima disso, o artigo 5º da Constituição trata dos direitos e garantias fundamentais em 78 incisos, sendo que oito deles dividem-se em letras e o último em quatro parágrafos. A Carta Magna já sofreu 91 emendas, além de várias que ainda estão em tramitação.

Antes do texto constitucional existe o seu preâmbulo, com as diretrizes máximas de todo o esforço nacional para que possamos viver num estado democrático de direito. Dentre elas: “…o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem internacional, com a solução pacífica das controvérsias…”

Na Constituição de 1988 só em 31 de dezembro de 2004, com a Emenda Constitucional 45, é que surgiu a norma que melhor explicitou aqueles direitos e garantias.

O princípio da duração razoável do processo, por exemplo, permitiu que alguns problemas de retardamento exagerado de decisões fossem resolvidos. Em 5 de março de 2014 noticiamos caso de extinção de execução fiscal que estava sem andamento há 12 anos e em 14 de julho de 2015 processo administrativo parado por mais de um ano.

O inciso 78 do artigo 5º no § 2º diz que: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.”

Determinada empresa em São Paulo para defender-se em execução fiscal relativa a tributo estadual que não devia, mas fora lançado por evidente excesso de exação, teve que arcar cerca de R$ 200 mil a título de custas. Cobrou-se além do razoável por serviço que ainda seria prestado.

O valor das custas, caso não haja um limite proporcional ao valor dos serviços, não respeita o princípio constitucional da razoabilidade. Trata-se de cobrança indevida de tributo.

Em 2013, segundo estudo divulgado pelo Centro de Pesquisas sobre o Sistema de Justiça (CPJus) do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), o custo médio de um processo era de R$ 2.369,73. Na Justiça Estadual esse custo era de apenas R$ 1.795,71 e na Trabalhista, R$ 3.501,08.

Esse estudo está disponível na internet e foi objeto de matéria publicada no site Jota, assinada por Felipe Recondo.

Na Justiça Federal em São Paulo (TRF-3) o princípio da razoabilidade é aplicado. Existe um teto de menos de R$ 2 mil, compatível com os citados custos médios.

Os mecanismos processuais que permitem isenção ou mesmo pagamento posterior das custas são de dificílimo acesso. Com o advento do processo eletrônico isso se tornou quase impossível na prática.

Se as taxas judiciárias servem para pagar o custo do processo, claro está que cobranças exageradamente elevadas são a negação da Justiça.

Por outro lado, não é razoável que o Estado (nós, o povo) sejamos onerados com despesas que podem e devem ser reduzidas para tornar os orçamentos do Judiciário compatíveis com a nossa realidade.

Esse assunto parece que já preocupa pessoas com muito mais conhecimento do que este colunista. Já existe o caso de um juiz que não quer receber o aumento que lhe foi concedido. Neste último sábado, um ilustre ministro do Supremo Tribunal Federal criticou exageros em verbas adicionadas aos salários de juízes, em entrevista que teria dado num evento na Inglaterra.

Portanto, se magistrados da primeira até a mais alta instância reconhecem a existência de distorções e exageros nas despesas com o Judiciário, parece-nos que se aproxima o momento de eliminar o que foi chamado de “penduricalhos”.

Por certo o Conselho Nacional de Justiça, que tão bem vem desenvolvendo suas elevadas funções, saberá colocar tais ideias e desejos em condições de serem aperfeiçoadas e implementadas.

Com tais medidas, o mais respeitável de nossos Poderes poderá evitar desperdícios, reduzir custos e, com um adequado acompanhamento gerencial, viabilizar uma Justiça compatível com o preâmbulo da nossa Constituição.



Raul Haidar é jornalista e advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

ConJur

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